Quase todos conhecemos casos, ouvimos falar de situações ou vivenciámos episódios relativos à transformação do emprego, mas se o nosso objetivo for demonstrar tal fenómeno, então, o mais provável é que nos atasquemos em leituras, análises ou experiências potencialmente parcelares.

Para contornar tais dificuldades, valerá a pena complementar os casos, as situações ou os episódios conhecidos com outro tipo de dados e prestar alguma atenção às dinâmicas mais de índole demográfica e qualitativa, que tão bem incorporam e traduzem o sentido das transformações em curso. Refiro-me, por exemplo, à evolução da população ativa portuguesa no período 2005-2013 e às consequências desta evolução, como exercício integrante da tentativa de compreensão da transformação do emprego em Portugal.

Sabemos que a população ativa portuguesa em 2005 estimava-se em 5.544.900 indivíduos. Sabemos também que diminuiu para 5.388.200 em 2013, expressando deste modo uma variação negativa de 2,83%, ou seja, menos 156.700 indivíduos face ao início do período. A partir deste cenário sabemos apenas que a perda média de população ativa tem pouco de especial, visto que rondou os 12.000 indivíduos/ano entre 2005 e 2013. De facto, embora possível, esta leitura revela-se limitada, sobretudo se o intuito for articular – de modo linear – a evolução da população ativa com o aumento do desemprego ou da emigração, mas  é ainda mais limitada se ambicionar aceder a outros níveis de análise que envolvem a transformação do emprego no país.

Se concedermos primazia a uma abordagem refinada da população ativa, mais centrada na análise dos seus diferentes grupos etários, é possível ficarmos a saber da existência de outras manifestações, que o decréscimo de 2,83% no período (2005-2013) consegue ocultar. A este propósito tenhamos em consideração o seguinte: é verdade que entre 2005 e 2013 o país perdeu 156.700 ativos, mas no mesmo período perdeu também 429.100 ativos nos grupos etários sub-35 anos. Da população ativa total de 5.544.900 indivíduos em 2005, que englobava 2.049.100 com 34 ou menos anos, passamos em oito anos (2013) para uma população ativa com 34 ou menos anos de 1.620.000 indivíduos, num universo que passou a ser de 5.388.200. Por intermédio desta abordagem, localizamos e ficamos cientes da ocorrência de um “efeito de compensação”, que permitiu à erosão geracional não ter idêntico impacto na formação da população ativa total; e tal “efeito de compensação” tem um patrono, que é o comportamento registado nos grupos etários com 35 ou mais anos e com menos de 65 anos, que cresceram em 337.600 indivíduos no período 2005-2013. Fica-se a saber, assim, que apesar de a variação no período (2005-2013) ser ligeiramente negativa (-2,83%), na verdade, acaba por integrar um significado socioeconómico muito mais amplo: o país perdeu população ativa nos grupos etários mais novos e ganhou apenas nos grupos etários mais seniores.

É certo que teremos de considerar as transferências entre grupos etários na leitura que propomos para este “efeito de compensação”, mas parece-nos inegável a erosão geracional na população ativa portuguesa, com implicações várias, nomeadamente ao nível do emprego (presente e futuro), num país que atingiu em 2013 os valores mínimos da população ativa – desde 2005 – com menos de 25 anos (384.200 indivíduos) e com idades compreendidas entre os 25 e os 34 anos (1.235.800 indivíduos). É ainda conveniente não esquecer que em 2005 os mesmos grupos etários (>25 anos e 25-34 anos) cifravam-se em 564.200 e 1.484.900 indivíduos, respetivamente.

Dito isto, face às evidências e às dinâmicas demográficas em apreço na população ativa, só o tempo dirá qual é a amplitude total das transformações do emprego em Portugal, mas podemos dar por garantido que será sempre maior e mais complexa do que uma variação negativa de 2,83% na população ativa podia fazer-nos crer.

Professor da UMa e investigador do SOCIUS