Inovação em políticas de Saúde: a prescrição na enfermagem

O tempo despendido por médicos em procedimentos que não exigem as suas competências científicas deve ser reduzido.

A prescrição de exames e medicamentos tem avançado como uma atividade de modernização dos sistemas de saúde. Nestes contextos, por exemplo, na Escandinávia, Reino Unido, Canadá, EUA e, mais recentemente, em Espanha, a cooperação entre as profissões da saúde tem evoluído de forma construtiva e equilibrada no melhor interesse do doente e da eficiência das organizações de saúde. As demonstrações das mais-valias deste processo para a melhoria dos serviços e do processo de prestação de cuidados de saúde estão em fase de contínua gestação em revistas científicas de políticas e gestão em saúde.

Em 2004, de um estudo liderado pelo meu colega James Buchan surge uma sistematização de três tipos de prescrição por profissionais de enfermagem. Um primeiro, designado por “prescrição por protocolos”, ou normas de grupos de doentes, promove a prescrição por profissionais de enfermagem de acordo com protocolos pré-determinados. Este tipo de prescrição pode ser feita para um grupo particular de doentes, normalmente crónicos, ou em contextos específicos, como serviços de urgência ou domiciliários, para exames ou análises urgentes ou renovação de medicação conforme regime terapêutico definido pelo médico. Este tipo de prescrição promove a eficiência do trabalho da equipa de saúde, liberta o tempo do médico para tarefas mais exigentes e garante mais rapidez na resposta aos doentes. Tem sido o tipo mais adotado entre os sistemas de saúde mais avançados.

Os outros dois tipos de prescrição incluem a chamada “prescrição suplementar”, ou colaborativa, em que o profissional de enfermagem prescreve sob supervisão de um médico numa abordagem semiautónoma. Um terceiro tipo de prescrição, designada como "autónoma", refere-se à possibilidade de prescrição sem a supervisão de um médico. Em vários sistemas de saúde internacionais temos visto estas abordagens evoluírem em paralelo, ou, por vezes, em combinações diversas.

Já em 2007 um estudo do instituto Nivel na Holanda, dedicado à investigação em gestão em saúde, fez a revisão de 23 estudos anteriores que identificavam um conjunto de benefícios da prescrição por profissionais de enfermagem que têm sido estudados em mais detalhe desde então.

Desde 30 de dezembro de 2009 que os profissionais de enfermagem espanhóis estão legalmente habilitados a prescrever produtos de saúde, medicamentos não sujeitos a receita médica e medicamentos comparticipados que constem de protocolos de atuação terapêutica, ou seja, uma prescrição do primeiro tipo indicado acima. Para quando transpor para Portugal um modelo semelhante ao espanhol? Eis um novo tema para o debate nas políticas de Saúde em Portugal.

A perspetiva do doente deverá ser valorizada neste processo. A proximidade com os profissionais de enfermagem é, em geral, um fator estruturante dos sistemas de saúde e, em Portugal, essa é também uma dinâmica evidente. O alargamento da atividade de prescrição clínica tem o potencial de promover melhores tempos de resposta e a eficiência e eficácia das equipas de saúde e dos seus serviços.

Note-se, porém, que nos sistemas de saúde internacionais em que esta abordagem tem evoluído a prescrição não é para todos os licenciados em Enfermagem, mas apenas para os que profissionais de enfermagem mais experientes e que realizaram formação avançada específica, normalmente ao nível de especialista.

Um futuro governo em Portugal terá de definir a sua posição no âmbito da adoção de regulação europeia que recomenda, entre outras áreas de intervenção, que os enfermeiros especialistas em enfermagem de saúde materna e obstétrica na vigilância à gravidez normal possam prescrever exames e análises e que os enfermeiros especialistas em enfermagem de reabilitação possam prescrever as chamadas “ajudas técnicas” (cadeiras de rodas, andarilhos, canadianas).

O tempo despendido por médicos em procedimentos que não exigem as suas competências científicas deve ser reduzido. Esse é o princípio de gestão em saúde que tem justificado esta evolução.

Director do International Journal of Healthcare Management, RU

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