E nós?

Há uma estranha atmosfera na política que hoje se faz.

A UGT conseguiu juntar algumas centenas de pessoas à volta da Torre de Belém e a GGTP juntou um milhar ou dois na Alameda Afonso Henriques, o resto de Lisboa ou ficou em casa, ou foi para a praia: achava o 1.º de Maio um feriado como qualquer outro e o que verdadeiramente lhe apetecia era espairecer da crise. Os partidos, apesar do ralhete de Cavaco no dia 25, continuaram a debicar entre si sobre pormenores que neste naufrágio colectivo não interessam a ninguém. O que não os coíbe de lamentar num tom de sacristão servil o desinteresse dos portugueses pela vida pública; ou de fingirem uma indignação teatral para consumo de um putativo eleitorado que os despreza. Se julgam, e talvez julguem, que daqui a três semanas os votos sairão espontaneamente de um buraco, estão enganados.

Há uma estranha atmosfera na política que hoje se faz. No PS, apareceu uma confusa franja “revolucionária”, que Seguro não contraria, critica ou sequer limita. À primeira vista, a ideia é a de atrair a esquerda a um grande saco, que o PS levaria depois para o governo, oficial ou oficiosamente, para salvar a Pátria. Daí que a direcção socialista não possa abrir a boca sobre questões de substância, porque elas se arriscam a irritar uma das partes dessa “unidade” imaginária de que ambiciona ser o centro. Entretanto, o PC já declarou o PS “um risco para a democracia”. A extrema-esquerda não lhe tocará com um pau. E Soares quer levar o seu novo radicalismo para caminhos de ilegalidade e violência, que o eleitor médio da seita certamente não aceitaria. Sobra o quê? Uma trapalhada inútil.

Informado ao pormenor sobre os malefícios de Pedro Passos Coelho, de Paulo Portas, da sra. ministra das Finanças e de mais meia dúzia de “notabilidades” sem consequência, o cidadão comum não percebe os propósitos do Governo ou da oposição. As futilidades que os chefes trocam na rua, na televisão e no Parlamento não lhe servem de nada. Mas, pelo menos, Coelho e Companhia são obrigados a mostrar a sombra de uma lógica pela acção que tomam. Dispensado da acção, o PS acabou por se tornar um puro mistério. Em princípio, é sempre contra tudo o que vem do Governo: palavras, decretos, previsões, desculpas. Só que se guarda cuidadosamente de explicar a razão desses contaminados frutos. A origem chega para os condenar. E nós, ainda com um vestígio de racionalidade, que havemos de pensar?

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