Normalife é suspeita de burla a idosos atraídos para "rastreio nacional gratuito"

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Tratamentos propostos aos idosos chegam a custar 3000 euros DANIEL ROCHA

Maria João, de 81 anos, admite que foi "ao engano". Ligaram-lhe para casa, já de noite, a informá-la sobre um rastreio gratuito. Do lado de lá sabiam o seu nome e disseram pertencer à Organização Saúde para Todos. Falaram-lhe num rastreio aos ossos e à coluna dirigido a maiores de 65 anos. "Percebi que havia ali qualquer coisa de estranho, mas como era gratuito...". Decidiu ir e marcaram-lhe dia e hora na clínica Normalife, na Avenida da República, em Lisboa.

Quando lá chegou, "era tudo novo", conta Maria João, e estavam mais idosos à espera. Fizeram-lhe um "inquérito rigoroso", onde recolheram mais dados pessoais. Mediram-lhe a tensão, auscultaram-na. No final, disseram-lhe que tinha um princípio de osteoporose e que "convinha que fizesse um tratamento". Preço: 3000 euros. Recusou. "Não tenho dinheiro para isso". Propuseram-se reduzir o preço para metade. Nesta altura, alegou que tinha de discutir o assunto com o filho e que depois entraria em contacto.

Este é um dos muitos casos de práticas comerciais desleais de que a Associação de Defesa do Consumidor (Deco) tem registo. Só em 2011 a Deco recebeu 23 queixas contra a Normalife, todas relacionadas com as chamadas "vendas agressivas". A Deco sublinha que os consumidores com reclamações relativas a práticas comerciais frequentemente usam o nome do produto comprado para sustentar a queixa, podendo nem saber o nome da empresa, o que significa que "as reclamações sobre as vendas efectuadas pela Normalife podem ser superiores". O PÚBLICO contactou a Entidade Reguladora da Saúde (ERS), que não tem qualquer registo da Organização Saúde para Todos. Quanto à Normalife, está registada como uma empresa de comércio a retalho de produtos médicos e ortopédicos e não é regulada pela ERS. No entanto, no decurso de 2011 a reguladora recebeu duas denúncias relativas à sociedade Normalife, Unipessoal, Lda, indicando "prática irregular no exercício profissional". Em Junho, a ERS encaminhou o assunto para a Procuradoria-Geral da República, por "eventual prática dos crimes de usurpação de funções e de burla".

O responsável pela Normalife, Alfredo Silva, rejeita que as práticas da sua empresa sejam "desleais". A empresa abriu em Lisboa há cerca de dois anos e, segundo o responsável, é um "espaço de reabilitação". Lá trabalham quatro pessoas, entre as quais um fisioterapeuta e um auxiliar de enfermagem, que fazem rastreios osteoarticulares. "Se as pessoas sofrem de alguma patologia que podemos tratar, propomos um tratamento", explica. Alfredo Silva é também o responsável pela Organização Saúde para Todos, que "faz a ponte" com a Normalife. Os 12 funcionários da organização têm apenas uma função: ligar aos potenciais clientes e agendar o rastreio. "Contactamos as pessoas de Lisboa, Oeiras, Cascais e Algés através da lista telefónica", explica Alfredo Silva.

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