Suspensão da actividade do Lusocord abre polémica

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Recolha de cordão umbilical no Lusocord em Janeiro de 2010

Ex-directora alertou para a necessidade de cometer "irregularidades" para manter aberto banco de células estaminais

O presidente do Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST), Hélder Trindade, assegurou ontem, em declarações ao PÚBLICO, que "não existe a mais leve intenção de encerrar o Banco Público de Células Estaminais do Cordão Umbilical (Lusocord)". "Pelo contrário - foram detectadas irregularidades administrativas, financeiras e processuais e o nosso objectivo é, precisamente, garantir a qualidade e a eficiência do serviço", disse Hélder Trindade, que se escusou a comentar o facto de a ex-directora do banco ter apelado, repetidamente, à atribuição de um quadro de pessoal e de financiamento àquele serviço.

A notícia da suspensão da colheita de sangue do cordão umbilical (por um período de 60 a 90 dias) e da promoção das "inspecções necessárias ao completo esclarecimento" de situações irregulares "e apuramento de eventuais responsabilidades" foi divulgada na segunda-feira, em comunicado, pelo IPST. Apanhou de surpresa Helena Alves, directora do Centro de Histocompatibilidade do Norte e do Lusocord até ao dia 23 de Agosto, data em que ambas as estruturas passaram para a tutela daquele instituto.

"Não sei o que pensar - há um ano e meio que através dos mais diversos canais, incluindo a comunicação social, venho a alertar o Governo para a necessidade de assegurar a atribuição de financiamento e de recursos humanos ao Lusocord. Poderei ser acusada de quê? De ter mantido a funcionar um serviço valiosíssimo como este, quase sem meios?", questionou, quando contactada pelo PÚBLICO.

Hélder Trindade não quis comentar a alegada falta de resposta aos constantes apelos de Helena Alves, que, insiste, chamou "mil vezes a atenção para as "irregularidades" que tinham de ser cometidas para manter o banco a funcionar".

Desde que foi criado, em 2009, o Lusocord - que faz a preservação de células estaminais utilizadas no tratamento de muitas doenças do foro hematológico - recebeu apenas 500 mil euros. " A sua sobrevivência deve-se à rentabilização do financiamento atribuído ao Centro de Histocompatibilidade, no qual o banco está instalado, a muita poupança, e ao esforço e sacrifício pessoal de uma dúzia de funcionários contratados através de uma empresa de trabalho temporário", dizia em Junho de 2011 Helena Alves.

Durante os cerca de três anos de existência, o Lusocord recebeu e congelou cerca de oito mil amostras de sangue do cordão umbilical. Nenhuma delas foi, no entanto, libertada - segundo tem dito Helena Alves, "por falta de pessoal para completar as análises e a classificação genética daquelas unidades".

Ontem, Hélder Trindade, que sublinhou não querer fazer comentários, disse ser "um facto que foram feitas 28 mil colheitas de sangue do cordão umbilical e apenas foram preservadas oito mil amostras". Helena Alves refere que estes valores "correspondem à média dos bancos mundiais com critérios de qualidade mais apertados".

O deputado socialista, ex-secretário de Estado da Saúde e responsável pela criação do banco em 2009, Manuel Pizarro, veio prometer ontem, em declarações à Lusa, acompanhar a questão. "O que eu não gostava que acontecesse era o Estado ter andado meses a limitar as condições técnicas e financeiras do funcionamento do banco para agora culpar o banco pelas falhas que resultam dessas limitações que lhe foram impostas. Se não tinha pessoal administrativo, se não tinha técnicos superiores para a área dos concursos, não se podia esperar que todos esses procedimentos administrativos e concursais fossem feitos de acordo com o cumprimento de todas as regras", disse.

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