Uma reforma

Não há por aí político que não esteja potencialmente “no activo”: e que não jure a pés juntos que não está, ou pelo menos que finja que não está.

A RTP anunciou que “tendencialmente” vai deixar de pagar aos comentadores políticos “no activo” e que não os quer a fazer a sua propaganda sozinhos, sem comentário ou contradição. À superfície, isto parece uma boa coisa. Mas põe uma dificuldade impossível de resolver: o que é um político “no activo”?

Não há por aí político que não esteja potencialmente “no activo”: e que não jure a pés juntos que não está, ou pelo menos que finja que não está. Uma definição legal excluiria membros do governo, da Assembleia da República e da direcção dos partidos. Infelizmente, qualquer militante em qualquer altura pode sair do proverbial armário e declarar ambições que ninguém antes lhe suspeitava. A história de Marinho e Pinto e de Henrique Neto ilustra bem este caso de megalomania mansa, muito comum em Portugal.

Pior ainda são os que balançam entre o pobre destino de pastorear a Pátria e uma vida de trabalho útil. Para não ir mais longe, basta lembrar Rui Rio, que vem e vai uma dezena de vezes por semana, sem nunca dizer sim e sem nunca dizer não. Marcelo Rebelo de Sousa também visivelmente flutua entre Belém e o pacato destino de comentador. Quando lhe dá forte a fantasia de Belém não pára de se torcer para não irritar ninguém; num ou noutro intervalo lúcido lá vai mostrando um arzinho da sua graça. Marques Mendes gostava obviamente de voltar para ministro. E o trio da “Quadratura do Círculo” já produziu António Costa e não se sabe com quantos mais messias nos tenciona um dia surpreender. Mesmo Pacheco Pereira circula por águas bem turvas e nada o impede de ressuscitar.

Claro que a RTP, mais pobre e com menos margem de manobra, não paga com certeza os salários da SIC e da TVI. De qualquer maneira, uma exposição regular numa das três grandes cadeias (se evidentemente essa exposição for um sucesso) empurra um aspirante político para o centro da cena. Sem ela, o neófito vulgar passa anos na 8.ª página de um jornal obscuro, na escorregadia escada de um partido ou no sufoco de um gabinete de um ministro. Não é uma carreira apetitosa. E, por isso, muita gente se arrisca na televisão, sem uma ideia na cabeça e sem o vestígio de um propósito. Talvez pegue. E às vezes de facto pega. As novas regras da RTP têm um certo mérito. Com duas condições; se os “políticos” rodarem depressa; e se os críticos da casa se revelarem, para pasmo geral, o exacto contrário do que neste momento são.

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