Uma promessa eleitoral a crédito

O Governo vai fazer uma complexa engenharia financeira para resolver um problema político.

Quando os centristas defenderam que o Governo deveria aproveitar o Orçamento do Estado para “dar um sinal” aos portugueses, ninguém pensou que a solução encontrada pelo CDS-PP e PSD para reduzir os impostos seria literalmente um sinal. A solução gizada pelo Governo para a sobretaxa não entra na categoria da descida de impostos, mas também não pode ser catalogada de promessa eleitoral. É uma medida híbrida, que fica a meio caminho entre a demagogia, a engenharia financeira e a inteligência política.

A solução, ao que parece, é fazer depender a descida da sobretaxa de 3,5% do IRS do aumento das receitas fiscais conseguido em 2015, quer através do crescimento da economia, quer através do combate à fraude fiscal. Numa coisa Paulo Portas e Passos Coelho terão chegado a acordo: não há dinheiro para descer os impostos. Caso contrário, teriam acordado baixar a sobretaxa já em 2015.

Quem não tem dinheiro vive de crédito. E o que o Governo se propõe a fazer é um crédito fiscal, em que passa aos portugueses um cheque, cuja cobertura só será possível aferir em 2016. Há quem diga que a medida não é eleitoralista, “uma vez que os reflexos em sede de IRS apenas se vão obter em 2016”. E há quem pense precisamente o contrário: a medida é eleitoralista, “uma vez que os reflexos em sede de IRS apenas se vão obter em 2016” – ou seja, será o próximo Governo a pagar a promessa deste Governo. E num ano em que o governo, qualquer que ele seja, estará obrigado pelo Tribunal Constitucional a repor a totalidade dos cortes salariais na função pública.

A engenharia financeira também permite a Passos Coelho manter a coligação a funcionar até à próxima minicrise. Paulo Portas cumpre a sua promessa de moderação fiscal (mesmo que seja a crédito) e Passos mantém as contas públicas em ordem para chegar aos 2,5% de défice (mesmo que a isso não seja obrigado).

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