Um Presidente com pequenos poderes
Cavaco Silva perde poderes de dissolução da Assembleia da República dentro de dez meses.
Aníbal Cavaco Silva será, em 2015, um Presidente da República com poderes diminuídos. Com as eleições legislativas previstas para o início do Outono e o final do seu mandato como Chefe de Estado a 9 de Março de 2016, Cavaco Silva só poderá dissolver a Assembleia da República até precisamente 9 de Outubro. Nos seis meses seguintes estará constrangido pela Constituição da República Portuguesa.
De acordo com a lei fundamental, o Parlamento não pode ser dissolvido nos seis meses posteriores à sua eleição, no último semestre do mandato do Presidente da República e durante a vigência do estado de sítio ou do estado de emergência. A possibilidade de utilização da chamada “bomba atómica” política tem, por isso, uma duração limitada, que termina a 9 de Outubro, se se olhar apenas para o mandato presidencial.
Mas é preciso também considerar que nas duas ou três semanas anteriores poderão ocorrer as eleições legislativas – que a lei estipula que se devem realizar entre 14 de Setembro e 14 de Outubro.
Porém, não é de esperar que seja agora, três anos e meio depois da tomada de posse do Governo PSD/CDS, que o chefe de Estado use o poder da dissolução da Assembleia da República. Só o fará, se acontecer algo de absolutamente extraordinário – Cavaco não o fez nem quando o actual Governo atravessou a crise extrema de Julho de 2013.
É também com os olhos postos neste calendário que é preciso ver a situação política na Madeira. Com a esperada demissão de Alberto João Jardim no próximo dia 12, o processo implica a audição, pelo representante da República, do novo líder do PSD – para saber se está disponível para formar Governo (o que Miguel Albuquerque já negou) – e dos restantes partidos, mas depois, também, a convocação do Conselho de Estado com cerca de 15 dias de antecedência. Um calendário que atira a dissolução, pelo Presidente da República, da Assembleia madeirense para daqui a mês e meio a dois meses. E as novas eleições regionais lá para o início de Abril.
Tal como vem sendo hábito, Cavaco Silva voltou a falar na necessidade de diálogo e compromisso, uma das filosofias preferidas dos Presidentes, que são, afinal, uma figura mediadora das instituições democráticas. Com o apelo falhado do último 10 de Junho, quando o Presidente pediu aos partidos que se entendessem até ao Orçamento do Estado, dificilmente lhe sobram mais formas de fazer a mesma exigência durante os últimos dois grandes discursos do seu mandato – no 25 de Abril e no 10 de Junho.
Depois do seu papel na tentativa de resolução da crise de Julho de 2013, o ano de 2014 de Cavaco Silva foi dominado pela interrogação sobre a convocação antecipada ou não de eleições, pelos seus recados sobre a necessidade do esforço nacional para que o país saísse do programa da troika com sucesso em Maio e também para o desenvolvimento pós-troika. Mas também pelos seus pedidos de contenção às vozes críticas – um recado para a oposição -, e pelo apoio ao Governo, considerando, mesmo depois da derrota nas eleições europeias, que a equipa de Pedro Passos Coelho continuava a ter toda a legitimidade para governar.
A situação no BES, que dominou a actualidade no Verão, foi um dos raros pontos de desentendimento com o Governo. Três semanas depois de Cavaco Silva de vir a público defender a idoneidade do banco e afirmar a confiança na instituição – como aliás fizera também o primeiro-ministro -, as contas do banco colapsavam. O Presidente desculpou-se depois dizendo que só sabia o que o Governo lhe contara, deixando no ar que lhe poderiam ter mentido. Passos havia de retorquir: se o Presidente não sabia era porque não perguntara.
Atritos ou apoios à parte, a próxima mensagem de Ano Novo, a três semanas das eleições presidenciais, e com Cavaco Silva já a arrumar a sua herança de dez anos no Palácio de Belém, será a de balanço do mandato e de despedida.