“Somos, no quadro europeu, uma referência de estabilidade”

O PS não será prejudicado pela coligação com o BE e o PCP, acredita Eduardo Cabrita. O ministro-adjunto considera mesmo que os entendimentos à esquerda contribuirão “para a afirmação do PS”.

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Eduardo Cabrita Daniel Rocha

Adjunto de António Costa, Eduardo Cabrita é seu amigo próximo desde os bancos da faculdade. Agora no Governo e integrando o núcleo duro que coordena politicamente o executivo contribui para a gestão quotidiana de crises. E assume o discurso oficial sobre a eficácia da acção governativa apoiada pela maioria parlamentar de esquerda que integra PS, BE, PCP e PEV. Eduardo Cabrita acredita que se vivem novos tempos e que o Governo tem condições para cumprir o mandato.

Como é ser ministro-adjunto de António Costa?
É renovar uma experiência de trabalho em proximidade que, aliás, já tinha tido, quer no Ministério da Justiça, quer como o ministro de Estado e Administração Interna. No centro do Governo, neste momento, é fundamentalmente partilhar o acompanhamento da execução do programa do Governo. Há que dar atenção ao impacto social das decisões governativas. Depois de quatro anos marcados pela ruptura social e até pelo confronto do Estado de direito, a normalidade democrática que Portugal adquiriu é em si uma mais-valia. Nós, hoje, somos no quadro europeu uma referência de estabilidade no meio de uma Europa em muitos locais em risco de desagregação.

Como vê o fim do arco de governação?
Os portugueses são iguais e os deputados são iguais. Esse conceito [do arco da governação] assentava numa visão xenófoba da política, segundo a qual uns eram mais iguais do que outros, alguns tinham apenas o direito de protestarem. Essa transformação, que julgo é irreversível – não necessariamente a solução, mas a existência de uma plenitude de responsabilidade –, corresponde a um sinal de maturidade. Nunca mais nenhuma força política vai poder eximir-se de ter de contribuir para a construção de soluções governativas ou legislativas e, por consequência, assumir a responsabilidade da construção dessas soluções. O arco da governação era a negação do arco constitucional. A Constituição da República assenta nessa voz de todos.

Quanto tempo dura o Governo?
Este Governo tem um mandato que vai até ao final do Verão de 2019.

Vai chegar ao fim?
Eu não sou dado à especulação. Sou um homem de Direito, que fez matemática para entrar para Direito. Portanto, gosto do rigor quer na palavra, quer nas contas. Manifestamente, ao fim de seis meses, os portugueses vivem uma sensação de estabilidade e de confiança no futuro que não tinham na noite das eleições.

O PS não irá sair prejudicado desta experiência?
O que é fundamental é aquilo que se consiga construir para o país. Mas acho que o PS historicamente tem estado associado aos momentos marcantes da democracia. Foi assim em 1975-76, com a consolidação do modelo constitucional. Foi assim na adesão à União Europeia, tem sido assim na afirmação do Estado Social de Direito, da escola para todos ao Serviço Nacional de Saúde, às conquistas civilizacionais com o casamento entre pessoas do mesmo sexo e com o quebrar das últimas fronteiras da liberdade em torno de tabus obsoletos. O PS tem estado associado a essas marcas irreversíveis. A plena maturidade da democracia portuguesa, no sentido em que os votos e os deputados são todos iguais em direitos e responsabilidades, é algo que também contribuirá para a afirmação do PS como partido estruturante da democracia portuguesa.

Não há o risco de o BE engolir eleitoralmente o PS?
Não governamos com base naquilo que é o calculismo eleitoral. Aquilo que nós temos hoje é uma solução governativa que correspondeu à vontade dos portugueses de uma mudança profunda e foi isso que esteve em causa a 4 de Outubro. O PS tem a responsabilidade de liderar essa transformação e essa mudança. Os portugueses avaliarão no final.

O primeiro-ministro não está demasiado optimista? O défice duplicou em relação há um ano.
Tivemos quatro anos de fracasso, marcados  além da ruptura social e do conflito com o Estado de Direito por oito orçamentos rectificativos e por uma fragilização do sistema financeiro e a criação de rupturas que importa sarar na sociedade. Pela primeira vez, desde o início da crise financeira, temos a confiança das instituições europeias em que Portugal ficará claramente abaixo dos 3 % de défice. Aquilo que os dados de quatro meses evidenciam é um défice primário abaixo do anteriormente verificado e é uma evolução, quer da receita quer da despesa pública, compatível com os objectivos orçamentais.

Não valoriza estes números?
Eu valorizo-os com prudência. Estamos a falar de quatro meses de execução, sendo que apenas em Abril plenamente esteve em vigor o Orçamento do Estado para 2016. Aquilo que Portugal conquistou foi um crédito de confiança que o anterior Governo nunca tinha tido, nunca anteriormente as instituições europeias haviam admitido que Portugal tivesse um défice abaixo de 3%. Todas as instituições internacionais confiam que Portugal passará essa barreira mítica dos 3% de défice público. E é esse o capital de responsabilidade em que o Governo português está investido, com base num cocktail de medidas que é diferenciado das que existiam. Temos é de acompanhar a sua execução.

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