Sócrates chama a si processo do encerramento das urgências

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Sócrates reuniu ontem com o ministro da Saúde Pedro Cunha/PÚBLICO

O primeiro-ministro, José Sócrates, decidiu chamar a si a condução política do processo de encerramento dos serviços de urgência, tentando extinguir o rastilho que o ministro da Saúde, Correia de Campos, ateou quando, esta semana, acusou os autarcas de estarem a contribuir para a fúria das populações.

Ontem, Sócrates esteve reunido, durante toda a manhã, com Correia de Campos, acertando uma estratégia que tem um objectivo óbvio: pacificação. À tarde, o ministro reuniu-se com os presidentes das administrações regionais de saúde.

Hoje, em Lisboa, alguns dos presidentes de câmara dos 15 concelhos incluídos no estudo técnico que prevê o encerramento de serviços de urgência deverão assinar protocolos de cooperação com o Ministério da Saúde. Nestes é definida (caso a caso) a rede de assistência de saúde pública e são estabelecidas contrapartidas.

Estas novas regras, que resultam de um despacho pessoal do ministro da Saúde, podem passar pelo reforço de alguns meios técnicos e de apoio ao transporte de doentes, alargamento de horários nos serviços de atendimento permanente (SAP) e a eventual manutenção do actual número de médicos. Tudo para contrariar a ideia de que as populações podem perder serviços ou condições de assistência neste processo de reestruturação.

À hora do fecho desta edição, não era ainda conhecido o número exacto de municípios que estavam dispostos a comprometer-se com um protocolo, sendo seguro, no entanto, que a taskforce que Sócrates organizou para responder à crise se empenhava em captar para esta solução o maior número possível de autarcas, não apenas do PS mas também do PSD.

Ao que o PÚBLICO apurou, ao fim da tarde de ontem, as câmaras de Fafe e Santo Tirso, ambas de maioria socialista, teriam já aceite os termos do protocolo, mas havia outras, como Peso da Régua, liderada pelo social-democrata Nuno Gonçalves, que adiavam uma posição para a próxima segunda-feira. Discordando da reestruturação revelada pelo Governo, o presidente da Câmara da Régua disse ao PÚBLICO que será apresentada uma contraproposta, depois de ser sufragada em reunião do executivo.

“A proposta do ministério é uma forma de mascarar o encerramento do serviço de urgência”, justifi cou o autarca, rejeitando a possibilidade de a urgência hospitalar vir a funcionar com médicos de família dos centros de saúde, entre as 9h00 e as 24h00.

Mais reservado se mostrou Beraldino Pinto, o social-democrata que preside à Câmara de Macedo de Cavaleiros. Contestando o relatório técnico, o autarca garante que está aberto a conversações com o Ministério da Saúde e não fala das eventuais contrapartidas que Correia de Campos lhe terá apresentado. Sinal vermelho em S. Bento Com o país na rua a protestar contra o encerramento de urgências e a controversa prestação de Correia de Campos nas televisões, logo após as manifestações de Valença e de Chaves, quando acusou os autarcas de estarem a contribuir para o alarme popular, o sinal vermelho acendeu-se em S. Bento.

Preocupado com a amplifiação dos protestos no país, Sócrates viu aberta mais uma frente de contestação no Parlamento.

Anteontem, PCP e PSD consideraram “inaceitáveis” as “ameaças” feitas pelo ministro da Saúde e os sociais-democratas acusavam mesmo Correia de Campos de “promiscuidade” partidária por ter recebido o presidente da Câmara da Régua, acompanhado por um deputado socialista. E ontem o BE zurzia no plano, denunciando que este “aumenta as difi culdades de acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde e diminui a qualidade do atendimento prestado às populações”.

Com o perigo real de a situação ficar fora de controlo, Sócrates decidiu agir. Consciente de que o ataque político no Parlamento iria inevitavelmente recair sobre as mexidas na saúde, o primeiro- ministro joga na antecipação. Na próxima semana, haverá o habitual debate mensal com o Governo na AR e Sócrates quer desarmar ofensivas.

O PSD já anunciou que a saúde será o tema forte da sua agenda política nos próximos tempos e aproveitará a presença do chefe do Governo para tentar fazer vingar os seus argumentos de que as políticas seguidas pelo Executivo socialista excluem os mais pobres. Nos restantes partidos da oposição, a contestação está também à espreita.

Os protocolos que hoje deverão ser assinados são apenas uma parte da estratégia que visa provar que, ao contrário do que a oposição diz, a reestruturação dos serviços de urgência servirá para o reforço das condições de socorro e emergência às populações.

Resta saber como é que Correia de Campos sobreviverá a mais esta barragem política, quando já há no PS quem reclame a sua substituição.

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