Seguro alerta para a sustentabilidade do stock da dívida

“O país está mais endividado, tem mais desemprego, tem mais pobreza, está mais desigual e voltou a ser um país de emigração", acusou o secretário-geral do PS.

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António José Seguro declarou este domingo que a decisão de o Governo optar por saída limpa do programa de assistência financeira, “deve-se essencialmente a taxas de juro baixas nos mercados financeiros, que não têm a ver com os indicadores fundamentais no nosso país”.

Numa reacção à declaração de Pedro Passos Coelho comunicada ao país ao início da noite deste domingo, o secretário-geral do PS disse que há três razões fundamentais para a saída limpa, citando em primeiro lugar, o “papel activo do Banco Central Europeu – comos sempre o PS defendeu”. “A segunda razão tem a ver com o excedente de liquidez dos investidores e a terceira deve-se ao facto de o Governo ter criado uma almofada de 15 mil milhões de euros pela qual os portugueses pagam cerca de 430 milhões de euros de impostos”.

O líder do PS, que sempre foi a favor de uma saída do resgate financeiro, alertou que “a questão da sustentabilidade do stock da divida e do serviço da divida é um problema que continua a estar no centro das preocupações de qualquer politica”.

Seguro considerou que o anúncio de uma saída limpa não deixa de ser “uma situação estranha”. E explicou que “na mesma semana em que o Governo dispensa ajuda para regressar aos mercados financeiros, os portugueses ficaram a saber que o IVA vai aumentar, que todos os trabalhadores vão pagar mais TSU, que os cortes nas reformas e nas pensões passaram a definitivos, e que vai haver mais despedimentos na função pública”.

Para o dirigente socialista, “o país regressa aos mercados, mas os portugueses têm que suportar mais sacrifícios e isso só acontece porque o programa falhou nos seus objectivos fundamentais”. O secretário-geral do PS referiu depois que “o país está mais endividado, tem mais desemprego, tem mais pobreza está mais desigual e voltou a ser uma país de emigração. Os portugueses estão a pagar caros estes resultados nos impostos, nos salários, nas pensões, no acesso à saúde e no desemprego”.

“Os portugueses estão piores do que há três anos. O programa acaba, mas a austeridades e os sacrifícios continuam”, declarou. “ Ao contrário da auto-satisfação do primeiro-ministro, os tempos exigem muta prudência e os portugueses muito respeito”, disse ainda Seguro, lembrando que os tempos são de campanha eleitoral, mas “nenhum Governo tem o direito de iludir dificuldades e com isso enganar os portugueses”, conclui o secretário-geral socialista.

CD: esta solução só serve a banca e grandes grupos
Para o cabeça de lista da CDU ao Parlamento Europeu, João Ferreira,  “só “por hipocrisia se pode pretender apresentar a saída [de Portugal da troika] como limpa”. "É de uma grande hipocrisia e cinismo que o primeiro-ministro venha apresentar esta saída como limpa. Não há saída alguma do garrote de exploração e empobrecimento lançado pelo Governo ao país", disse João Ferreira, o primeiro a pronunciar-se sobre o anúncio do primeiro-ministro.

O eurodeputado comunista acusou o Governo de “desprezar os trabalhadores e o povo português” “e de “fazer a promoção dos interesses dos especuladores do grande capital transnacional e do directório de potências da União Europeia a sua única principal missão”.

“Não se pode falar de uma saída limpa quando há um rasto de destruição deixado por esta agressão, que se traduz num retrocesso social sem precedentes, em níveis dramáticos de desemprego e em pobreza, de destruição e de alienação da capacidade produtiva nacional, num declínio económico sem precedentes e no agravamento brutal de uma divida”, apontou.

Num tom muito crítico, João Ferreira declarou ainda que “saída limpa só serve certamente para os interesses desses grupos económicos e dos banqueiros que beneficiaram e querem continuar a beneficiar destas opções”. Avisando que “nos próximos anos vão prosseguir as politicas de roubos dos salários e reformas, a liquidação de direitos e de serviços públicos, a redução do poder de compra do povo a par do favorecimento e apoio aos interesses da banca”, João Ferreira disse, por fim,  que “não se pode falar de saída limpa uma vez que o Documento de Estratégia Orçamental, anunciado há dias, comprova o aumento do IVA e da TSU.[Taxa Social Única] em contraste com a redução do IRC”.

Bloco critica o "foguetório"
No mesmo registo, Marisa Matias, cabeça de lista do Bloco de Esquerda às europeias, referiu que os únicos a ter uma "saída limpa" foram os mercados financeiros e os milionários e criticou o "foguetório" do Governo. "Amanhã os portugueses estarão exactamente como hoje. Limpos verdadeiramente saem os mercados financeiros que provocaram a crise, limpos saem os milionários que nunca ganharam tanto comos nos últimos três anos. Isso é a saída limpa", disse a eurodeputada.

A candidata do BE afirmou que "o Governo celebra-se a si próprio" e faz "um foguetório" com o anúncio de que o programa de resgate financeiro vai terminar sem recurso a programa cautelar."Assistimos a um foguetório, é uma mentira, nem recuperamos soberania nem estamos melhor. Podemos estar melhor no futuro, mas isso depende de um corte radical com estas políticas", defendeu Marisa Matias.

Quanto à existência de reservas financeiras para um ano, anunciada pelo primeiro-ministro, a  eurodeputada frisou que o país está a pagá-la, "todos os dias em juros". E deixa uma inquietação: "Poderá acontecer em Portugal o mesmo que aconteceu à Irlanda". "Teve uma saída limpa, nem um mês depois tinha a comissão europeia com uma comissão de fiscalização para pôr o governo na ordem e dizer o que tinham de fazer", advertiu.

Ao mesmo tempo que apontou que há mais 500 mil desempregados, um milhão de pessoas na pobreza e que os portugueses têm de abandonar o país em resultado de três anos de austeridade, Marisa Matias desafiou os portugueses a fazerem a avaliação "que interessa e saber se o país está melhor ou não" com a política da austeridade e a "desobedecer a estas instituições europeias que estão a devastar económica e socialmente" o país.

CGTP antevê mais austeridade
Por seu lado, o secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos, acusou  o Governo de fazer “propaganda” ao anunciar que Portugal vai sair do actual resgate financeiro sem recorrer a qualquer programa cautelar. “A saída limpa agora anunciada não passa de uma manobra de propaganda do Governo dado que, na prática, vamos ficar nos braços dos mercados e dependentes das condições de imposição dos respectivos juros que nos queiram aplicar”, considerou esta noite Arménio Carlos.

Segundo Arménio Carlos, e tendo em conta as medidas que constam no Documento de Estratégia Orçamental (DEO) conhecidas na quarta-feira, “temos pela frente dias de mais austeridade e dias de mais empobrecimento para o país”, pelo menos, até 2018. “Neste momento, nós não estamos numa situação melhor, mas numa situação em que este Governo está apostado, juntamente com a ‘troika’, em manter Portugal colonizado nos próximos anos. Portanto, a saída limpa pode ter sido positiva para os mercados, mas é extremamente penalizadora para os trabalhadores e para o país”, frisou Arménio Carlos em declarações à Lusa.

UGT fala em "mistificação"
Também o secretário-geral adjunto da UGT, Nobre dos Santos, considerou  que a saída do actual programa de resgate financeiro sem recorrer a qualquer programa cautelar é “uma mistificação”. “A saída sem programa cautelar é uma mistificação, porque se criou uma almofada financeira pelos impostos exigidos aos portugueses, almofada essa que custa muitos milhões de euros [aos portugueses] para que esta possa existir”, disse Nobre dos Santos  à Lusa.

“Nunca podemos dizer que estamos melhor, que ficámos melhor, nem que recuperámos agora a independência nacional, porque esta não existe. De seis em seis meses vamos ter as avaliações da ‘troika’”, sublinhou Nobre dos Santos.  “As próximas eleições darão um sinal claro do descontentamento dos portugueses e é fundamental que as pessoas participem no acto eleitoral e que o Governo entenda que esse será uma cartão amarelo [ao Governo] ”, disse.

Taxas de juro preocupam CCP
A Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) afirmou esta noite esperar que a saída do resgate financeiro sem programa cautelar assegure “melhores níveis de financiamento e taxas de juro mais baixas” para as empresas. "A CCP espera que a decisão do Governo, consubstanciando-se numa saída sem o apoio de um programa cautelar, a chamada saída limpa, tenha tido por base as razões estrictamente objectivas, decorrentes da perspectiva de evolução dos mercados", refere a secretária-geral da confederação, Ana Vieira, em comunicado.

"Nessa medida, o que se espera é que esta opção seja aquela que melhor assegure as condições de competitividade da economia, em concreto melhores níveis de financiamento e taxas de juro mais baixas às empresas, em particular às micro e PME [pequenas e médias empresas]", adianta. Ana Vieira salientou que, "se no novo quadro de acesso ao financiamento não se criarem condições para as empresas investirem, o país não consegue garantir níveis de crescimento sustentados, condição essencial para a consolidação orçamental".

A secretária-geral da confederação lembrou que a "questão essencial" para a CCP são os "resultados concretos" e que é isso que "interessa às empresas".

CAP pede continuidade das reformas
Já o presidente da CAP – Agricultores de Portugal afirmou esta noite que a decisão de dispensar um programa cautelar “não é a que mais convém a Portugal”, apelando a que se dê continuidade às “reformas estruturais que estão por fazer”.

“Vamos sair da maneira que mais convém à União Europeia, não da maneira que mais convém a Portugal. Nada de novo”, afirmou em declarações à agência Lusa João Machado, presidente da CAP. Para João Machado, o importante é que a saída do Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF) sem programa cautelar “não venha desobrigar o Governo – ou quem estiver no Governo depois de 2015 – a continuar nas reformas que têm vindo a ser anunciadas e que ainda não estão feitas”.

Sublinhando que dar continuidade a essas reformas é “essencial para que [o país] não volte à recessão e para criar emprego”, João Machado disse que “é preciso continuar com as reformas estruturais”, até porque “poucas estão feitas” e destacou como exemplos as reformas administrativa e autárquica.

“Há ainda um longo trabalho pela frente, que não pode ser abandonado neste período eleitoral. Isso não seria aceitável. Nós temos muito medo e os portugueses têm má memória do que são as promessas dos partidos políticos. Gostaria muito de ver que, nas [eleições] europeias e depois nas legislativas, havia contenção e verdade na boca dos políticos”, apelou. com Lusa

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