Seguro avança para clarificação rápida contra "o cinismo político"

Com possibilidade de congresso entre Abril e Julho, as hostes agitam-se perante a indefinição de António Costa. Um apoiante da direcção diz que a antecipação é para "pôr fim à intriga".

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Vasco Célio

Começou o jogo que levará à clarificação na liderança do Partido Socialista. Antes de voltar a sair para o terreno - ontem no Algarve e Almeirim, hoje nos Açores -, António José Seguro fez saber que haverá eleições directas em breve e congresso logo a seguir. É isso que significa a marcação da Comissão Nacional do partido para 10 de Fevereiro, rigorosamente marcada para daqui a 15 dias, o prazo mínimo exigido pelos estatutos para que aquele órgão possa reunir-se. E é aquele o fórum que tem a competência para marcar o congresso electivo, no âmbito do qual decorrem as eleições directas.

A velocidade da reacção da direcção socialista surpreendeu a oposição interna, que não esperava tanta rapidez de quem há alguns dias perguntava "qual é a pressa". Mas revela que Seguro entende que a situação se tornou insustentável e sente necessidade de o partido tomar uma decisão clarificadora quanto à liderança. "Atearam um incêndio no PS, agora temos de o apagar", comenta ao PÚBLICO um dirigente. O calendário que o líder irá propor à comissão política de terça-feira e à Comissão Nacional ainda não é claro, mas tudo indica que será entre Abril e Julho.

Esta aceleração de calendários internos aconteceu na mesma noite em que António Costa subia ao púlpito no Congresso do PS-Açores como convidado de honra, para um discurso aguardado com muita expectativa, mas que frustrou aqueles que esperavam ouvi-lo dizer se vai ou não disputar as próximas directas. Como num jogo de sombras, nem Seguro sabia o que Costa ia dizer nem este o que a direcção se preparava para fazer.

Certo é que ambos optaram por, em público, resistir a comentar a polémica interna e a falar para o país e contra o Governo, como sempre fazem os líderes da oposição.

Mas a guerra está declarada nas hostes dos dois lados. O deputado Ricardo Rodrigues, muito próximo de Carlos César, quebrou o silêncio que se instalou no congresso açoriano sobre a disputa iminente e passou ao ataque a Seguro. Ao PÚBLICO, lamentou "o ziguezaguear da direcção do PS que há uns dias não tinha pressa" e mostrou receio de que os portugueses possam não entender "o desvio do que deve ser o horizonte principal do PS enquanto partido responsável e de alternativa ao actual Governo". "O objectivo imediato do PS deve ser vencer as eleições autárquicas, não estou convencido de que os portugueses, neste momento, diferenciem o que são eleições autárquicas daquilo que é a discussão da liderança do PS. E se isso interferir, não devemos fazer um congresso antecipado", defendeu. 

Frete, cinismo e cabala
A resposta veio dura e directa. "É tempo de se abandonar o cinismo político dentro do PS", afirmou António Gameiro, presidente da distrital de Santarém, em declarações ao PÚBLICO. "Não há ziguezague nenhuma. Há uma campanha orquestrada contra o secretário-geral. Várias figuras do PS vieram a público afirmar que seria bom um congresso tão cedo quanto possível, têm de ter a coragem de assumir isso", acrescentou.

Gameiro repudiou as críticas internas a Seguro, considerando que os mesmos que as fazem "prejudicam o PS, fazem um frete ao Governo e só trabalham nos corredores do Parlamento em vez de estarem empenhados no trabalho autárquico que é necessário fazer". E foi ainda mais longe, ao afirmar que "estão ao serviço de uma cabala" e que o estado actual do país exige "pôr fim à intriga política".

Também Álvaro Beleza saiu em defesa do secretário-geral. "Às vezes, na vida política, as pessoas precisavam de ter outra serenidade e outra calma e, porventura, mais lealdade na vida política, mais cavalheirismo", disse o dirigente à margem de um fórum sobre saúde, no Porto.

"O tempo certo para Costa"
Com António Costa em silêncio sobre a possível candidatura à liderança, apoiantes do presidente da Câmara de Lisboa estão já no terreno a tentar recrutar o apoio de militantes, porque consideram que este é o momento do ex-ministro de José Sócrates enfrentar António José Seguro. "António Costa estava no Parlamento Europeu quando foi convidado para integrar o Governo e veio; depois, o então primeiro-ministro, José Sócrates, disse-lhe que tinha de ser candidato a Lisboa, em condições muito difíceis, e ele abandonou o Governo e foi e ganhou a câmara; agora é a hora de avançar", disse um deputado ao PÚBLICO. Factos que mostram também como Costa tem facilidade em abandonar um mandato quando outro desafio o chama.

Aqueles que clamam pela entrada de Costa na corrida à liderança estão também preocupados com o calendário político para os próximos quatro anos. A questão é que, depois do congresso que pretendem que se realize antes das eleições autárquicas deste ano, um novo conclave socialista só poderá ocorrer passado quatro anos, de acordo com os novos estatutos do partido. Quer isto dizer que, se António Costa não decidir ir a jogo agora, dificilmente poderá avançar antes das próximas eleições legislativas. Os que defendem que esta é a "oportunidade de Costa" escudam-se nas declarações que o autarca fez sobre a convocação do congresso: "Qualquer que seja a data, tenho a certeza que estarei nesse congresso", afirmou. E sublinhou que convocação do congresso cabe ao líder do partido "em função daquilo que se pretende que seja esse congresso: se é para preparar a resposta do PS a uma crise política que se julgue iminente; se é para preparar as eleições autárquicas; ou se é para preparar eleições legislativas daqui a dois anos e meio".

Os adversários da actual liderança consideram que Seguro "tinha tudo preparado para convocar um congresso logo que António Costa anunciasse a sua recandidatura à Câmara de Lisboa [5 de Fevereiro], para disputar sozinho a liderança do PS". E garantem que o alerta surgiu depois das declarações do secretário-geral do PS proferidas no encerramento das Jornadas Parlamentares em Viseu, onde Seguro anunciou que ia antecipar os calendários do partido. Depois Pedro Silva Pereira, ex-ministro de Sócrates, defendia, em declarações à Rádio Renascença, a convocação de um congresso electivo "tão breve quanto possível", para se poder proteger a estabilidade política e "construir uma alternativa credível". com Leonete Botelho

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