Seguir em frente

O PS assume-se como um partido com políticas de esquerda, sem malabarismos do passado, retomando um lugar ideologicamente seu.

Gosto destes tempos que vivemos. Confesso. Um tempo político novo. Apesar dos disparates que se ouviram de bocas desesperadas sobre “ilegitimidade” ou de tratar-se de um “golpe”, o que se está a viver é o normal funcionamento da democracia e a definição política das forças partidárias do País. E nunca foi tão clara a distinção entre direita e esquerda. Porque é importante definir para tornar claro, porque o pior que pode haver é já não se saber o que é o quê. O acordo à esquerda tão desejado e sempre inviabilizado tem um significado histórico, mas acima de tudo político, pelas transformações que pode despoletar na sociedade portuguesa. Os partidos à esquerda são muito territoriais e sempre defenderam o seu metro quadrado, mais receosos uns dos outros do que propriamente dos partidos da direita. Esta sempre foi muito mais pragmática e objetiva nos seus intentos de poder, casando mesmo não existindo amor. Sempre foram diligentes em casamentos de conveniência.

Agora nada será como dantes e o PS assume-se como um partido com políticas de esquerda, sem malabarismos do passado, retomando um lugar ideologicamente seu. O que mudou?  Resultados eleitorais que não deram maioria absoluta ao PSD/CDS e a necessidade de rejeitar a continuação das mesmas políticas, tão criticadas nos últimos quatro anos. Mas tal só é possível porque existe uma alternativa positiva, consubstanciada em acordos que permitem a constituição de um outro governo. 

Ganha a democracia, num sistema democrático que se mantém coeso passados 40 anos. Atingiu-se sem complexos a maturidade.  E sem dramas e fantasmas que alguns quiseram criar. A viabilização de um governo PS, faz-se pela vontade política do BE, PCP e PEV, sem ninguém violar a sua matriz e os seus princípios, com tranquilidade e moderação, dentro dos compromissos europeus que o País tem. Não há nenhum nervosismo dos mercados ou qualquer urticária de instâncias internacionais.

Muito se falou em crise política. Mas pergunto, qual crise? A única crise que existiu foi a criada pelo Presidente da República. Não era possível dissolver o Parlamento; não era possível Pedro Passos Coelho fazer a “batota” de alterar as regras durante o jogo para anular o “golo sofrido”, revendo a constituição porque lhe dava jeito; não era sequer possível a hipótese de um governo de iniciativa presidencial ou de gestão que não tendo a maioria de apoio parlamentar seria um nado-morto.

A única solução para não termos um país adiado era a indigitação de António Costa. Qualquer outra decisão cairia no imediato, paralisaria o País e poria o povo em estado de sítio.

A única coisa que se pedia era que o Presidente da República não ficasse refém do PSD/CDS, até porque mesmo em final de mandato é o Presidente de todos os Portugueses, que respeitasse a vontade popular e deixasse a democracia funcionar. Que não complicasse o que era simples, porque um Presidente não pode ser o foco da instabilidade.

Tive a oportunidade de estar com Presidente da República no Funchal, na sua recente deslocação à Madeira. Foi muito bem recebido, pois nós madeirenses fazemos da hospitalidade a nossa maneira de ser. Mas não deixei de me indignar que naquele contexto político o Presidente não tenha alterado a sua agenda para se concentrar na resolução do impasse político em que estávamos. Menos compreensível é quando ainda recentemente faltou à comemoração da Implantação da República, com a justificação de ter de se concentrar na reflexão sobre as decisões que teria de tomar após as eleições realizadas a 4 de outubro.

Esta pausa que manteve um país em suspenso criou momentos de instabilidade, crispação e radicalismos. Mas, felizmente, o Presidente, tomou a decisão mais acertada e decidiu o inevitável. Já era tempo, tanto mais que precisamos com urgência do futuro porque o passado não pode tornar-se presente.

Presidente da Câmara Municipal do Funchal

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