PS não virou à esquerda e PSD está a fazer uma oposição "muito firme", diz Santos Silva

O ministro dos Negócios Estrangeiros fez um balanço do país. Em entrevista ao jornal i, elogiou todas as forças parlamentares, incluindo a oposição.

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O ministro dos Negócios Estrangeiros lembra que para alterar as regras é preciso cumprir as actuais Enric Vives-Rubio/Arquivo

Um ano depois de ter assumido a pasta do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva reflecte sobre estes meses, com o apoio do Bloco de Esquerda e do PCP ao PS, e elogia a oposição do PSD. Numa entrevista ao jornal i, o ministro falou do Iraque e disse que a melhor maneira de defender a alteração das regras na União Europeia é cumprindo as actuais. Assinala que "todos os debates em curso têm a participação portuguesa activa" e que o Governo está confiante de que não haverá suspensão de fundos. Recusa-se a dar lições de moral publicamente, nomeadamente no caso de Durão Barroso.

Para Santos Silva, o PS não virou à esquerda e o Governo não tem razão para se queixar “de nenhuma das forças parlamentares”. “Não só o PCP, o Bloco e o PEV têm sido lealíssimos no cumprimento do acordo como o PSD e o CDS têm feito uma oposição igualmente construtiva, firme, como deve ser”. O ministro nega que a oposição do PSD esteja “fraquíssima” e considera-a “muito firme, muito coerente, muito clara”.

O governante não quer reduzir a política externa à diplomacia económica, nem acredita que a promoção das exportações portuguesas passe por muitas feiras. “Exige um trabalho mais de formiguinha, mais quotidiano, mais constante”.

“Tínhamos razão quando dizíamos que era possível outro caminho para a consolidação das contas públicas e para o crescimento económico”, responde o ministro quando questionado sobre o balanço que faz deste último ano político. “Alternativa a quê? À filosofia austeritária a toda a brida”, acrescenta.

Ainda assim, reconhece que a austeridade não terminou. “As coisas são graduais”, argumenta. “As restrições orçamentais não acabam de um momento para o outro. Para acabarem é preciso crescer mais do que o que a economia portuguesa está a crescer”, analisa o ministro dos Negócios Estrangeiros. Logo a seguir, Santos Silva garante que “a economia está a recuperar”, “o país está a crescer” e “as perspectivas do mercado do emprego são mais animadoras”.

No entanto, existem condições e limites. E chegam de Bruxelas. “O ponto decisivo aqui é o seguinte: as regras europeias colocam limites. Temos dois limites fundamentais. O primeiro tem a ver com o facto de o serviço da dívida, isto é, o que pagamos em juros, ser uma punição brutal sobre a nossa riqueza. Pagamos cerca de 5% do nosso PIB em juros. Isso é um limite muito forte”, nota.

Sobre a União Europeia nota um segundo limite de influência, em particular na zona euro, devido a “uma visão económica ortodoxa que só olha para as dimensões financeiras e monetárias e coloca travões ao investimento público”. A UE precisa de mudar as suas regras, mas Portugal só o conseguirá cumprindo as actuais, avalia. A suspensão de fundos não é uma preocupação, uma vez que o Governo está “confiante”.

“Não somos pelo Sul contra o Norte. Essas divisões prejudicam a Europa”, assevera. “Temos uma lógica de falarmos com todos.”

Santos Silva sublinha: “Os nossos concidadãos querem segurança, liberdade, prosperidade. Não faz sentido concentrarmos as discussões nas milésimas de cálculos do défice do produto, devemos concentrar a atenção nas grandes respostas às migrações, ao desemprego, em particular o desemprego juvenil, a ascensão dos nacionalismos e populismos de vária ordem, a luta contra o terrorismo e a garantia de segurança às populações. Não há solução para nenhum destes problemas fora do projecto europeu”.

Não comenta a ida de Durão Barroso para a Goldman Sachs, dizendo que já tem 60 anos e que aprendeu a “não ser émulo de Catão”, afastando assim “dar publicamente lições de moral”, ressalvando que, para si, prevê regressar ao que já fazia depois da vida política: ser professor na Universidade do Porto. Defende por isso “um programa de revisitação sistemática dos direitos, deveres e privilégios, de revisitação da despesa pública” que aplicado à UE “daria bons resultados”.

“É preciso ter bom-senso e sentido da medida que, segundo os gregos antigos, era a melhor virtude política”, e por isso não diz não conversar com a mulher – professora universitária e responsável por um mestrado de português como língua estrangeira – sobre o Instituto Camões, que tutela e que é responsável pelo apoio financeiros de instituições que asseguram a formação de professores de português como língua estrangeira.

Governo irá até onde a lei internacional deixar

Santos Silva fala ainda sobre a questão relacionada com os filhos do embaixador do Iraque em Lisboa, acusados de agredir violentamente um jovem em Ponte de Sôr. “Dos três mecanismos que a lei internacional prevê, só o levantamento da imunidade diplomática garante que os factos são apurados pelo sistema judicial português. Os outros dois mecanismos são o processo ser transmitido ao Iraque e ser responsabilidade do Iraque a condução do inquérito e o julgamento. Esse mecanismo é possível desde que o Iraque o solicite”, explica.

“O terceiro mecanismo é a declaração do senhor embaixador como persona non grata. Esse seria um mecanismo de resposta se não houvesse colaboração das autoridades iraquianas. Dito isto, é evidente que o primeiro mecanismo é o preferível. É para favorecer esse mecanismo que o Ministério dos Negócios Estrangeiros trabalha”, acrescenta.

O ministro defende que irá até “ao limite do que a lei internacional permite fazer” e que por isso “todos os mecanismos” previstos e permitidos na lei internacional serão usados por Portugal. Não obstante, a hipótese de declarar o embaixador do Iraque uma persona non grata “não é um bom raciocínio” do ponto de vista diplomático, nota. Santos Silva lembra que o governo iraquiano está a colaborar e caberá agora ao Ministério Público fazer as “diligências que entender”. Se a resposta não for satisfatória, diz, “temos que comunicar ao Iraque que esta disponibilidade só não chega”.

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