RTP pretende dispensar mais de metade dos trabalhadores dos Açores e Madeira

Governos das duas regiões recusam proposta do ministro Poiares Maduro que mantém apenas a informação. Já há empresas privadas interessadas na produção de conteúdos.

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No Parlamento, Maduro prometeu "plena autonomia editorial da informação Rui Gaudêncio

Mais de metade dos actuais 247 trabalhadores dos centros da RTP nos Açores e na Madeira poderão ser dispensados pela empresa, de acordo com a proposta de reestruturação desenhada pela empresa e entregue pelo ministro Poiares Maduro aos governos regionais.

O projecto, rejeitado pelos executivos das duas regiões que preparam alternativas, mantém sob a tutela da RTP apenas os jornalistas e outros trabalhadores afectos à informação da rádio e televisão, 70 nos Açores e 48 na Madeira, únicos efectivos a que ficariam reduzidos os dois centros, neste momento com um total de 134 e 113 trabalhadores, respectivamente.

Para uma Empresa Regional de Serviços Audiovisuais (ERSA), a constituir, seriam transferidos todos os trabalhadores das áreas de produção, manutenção e operações (64 nos Açores e 65 na Madeira). Esta empresa seria contratada pela RTP para “fornecer serviços de produção técnica e executiva de programas e informação, além de suporte técnico e operação de televisão, rádio e online”.

Neste cenário em que a ERSA “viria assumir responsabilidades na produção, manutenção e nas operações”, a administração da RTP admite “a hipótese de transferir para esta empresa a propriedade e gestão dos edifícios, das instalações e estúdios de rádio e televisão, centrais técnicas de televisão e rádio e continuidade do centro regional, exceptuando a rede de emissores e os arquivos que continuariam na posse da RTP”.

Nos Açores, a Câmara do Comércio e Indústria de Ponta Delgada (CCIPD) manifestou-se interessada na abertura à iniciativa privada a produção de conteúdos. E considerou esta reestruturação da RTP “um momento propício para se concretizar a perspectiva privada no desenvolvimento de actividades que cabem perfeitamente no âmbito das possibilidades da provisão privada, sem prejuízo dos objectivos de serviço público serem assegurados por quem de direito”.

Na Madeira, a DJCB, Produção de Conteúdos, é apontada como principal interessada no novo negócio da RTP. A empresa tem como sócio-gerente José Câmara, gerente executivo do Diário de Notícias funchalense, e recebeu recentemente um financiamento do governo regional, no valor de dois milhões de euros, no âmbito do QREN, para o projecto ‘Criação de unidade de produção e edição de filmes, vídeos e programas de televisão”.

Parlamento dos Açores debate alternativa
O presidente do governo açoriano, Vasco Cordeiro, anunciou esta terça-feira que vai apresentar uma proposta alternativa ao programa de reestruturação para a RTP/Açores, a ser elaborada com a participação do parlamento. “O desafio do serviço público rádio e televisão nos Açores não é apenas saber se a empresa A fica dez trabalhadores e a empresa B fica com 30”, acrescentando que os desafios da televisão regional “não se compadecem com exercícios de engenharia financeira ou administrativa”.

Um dos pontos que Vasco Cordeiro pretende garantir é que o centro de decisão da RTP/Açores fique no arquipélago. Actualmente, a televisão apenas conta com autonomia editorial, mas o executivo regional defende que a televisão e rádio pública também devem garantir uma autonomia financeira.

A subcomissão de trabalhadores da RTP-A também recusou o modelo defendido pelo ministro num documento de duas páginas e meia de que a subcomissão madeirense não teve ainda conhecimento. A proposta, recebida na segunda-feira pelo presidente do governo madeirense deverá ser por este debatida e rejeitada esta quinta-feira na reunião de conselho.

Ouvido na comissão parlamentar de Ética, há duas semanas, o ministro adjunto e do Desenvolvimento Regional, Poiares Maduro, defendeu o modelo que "pretende juntar as sinergias da RTP com as de uma nova empresa audiovisual, a criar em cada região autónoma" da Madeira e Açores. O modelo, disse na Assembleia da República, deve assegurar "plena autonomia editorial da informação que continuará a ser exclusivamente produzida pelos centros regionais propriedade da RTP".

Com o PS e o PCP a acusar o modelo de "desresponsabilização", Poiares Maduro sustenta que a "nova empresa regional vai poder captar capital novo, vai poder candidatar-se a fundos europeus", trabalhar para "novos actores" que não apenas para a RTP, mantendo que "a nova RTP continuará a assegurar a produção de informação".

Apenas restringida ao sector de informação, a concessionária do serviço público de rádio e televisão verá drasticamente reduzidos os custos operacionais dos centros insulares. Em 2013 os encargos com pessoal atingiram 4,4 milhões, quase metade dos custos directos (8,5 milhões) da RTP-Madeira. No Açores, os 134 trabalhadores dispersos por três delegações custam 5,2 milhões, mais de metade do orçamento de 9,7 milhões.

O financiamento dos centros regionais é exclusivamente público. A RTP recebe de indemnização compensatória seis milhões pela Madeira e 6,9 pelos Açores, além da contribuição audiovisual nos valores de, respectivamente, 2,2 e 2,5 milhões.

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