Quem se meter com o Seguro, leva!

Os regressos de Miguel Relvas e Jorge Coelho também fazem parte do início da pré-campanha para as presidenciais

Há uma semana, Marcelo Rebelo de Sousa decidiu marcar presença no congresso do PSD, depois de ter assumido para si próprio o estatuto de catavento político, apontado na moção de Passos Coelho ao dito conclave como o pecado mortal de todo o pretendente a candidato presidencial do centro-direita. Disse Marcelo que ia tranquilo a guiar na segunda circular mas o afecto atraiu-o para os 40 anos de um partido que é seu filho dilecto. Como se uma mudança súbita do vento o tivesse desviado.

Única certeza: desde a rodagem de Cavaco ao congresso da Figueira da Foz à viagem de Marcelo até ao Coliseu, nota-se uma tendência nos candidatos a homens providenciais do PSD para gastarem menos combustível. Já não vivem acima das suas possibilidades. Isso é bom.

Mas o que levou então Marcelo ao Coliseu, onde misturou com grande talento as suas facetas de político e comentador político, como se estivesse a ensaiar a persona de candidato presidencial? Fundamentalmente, Pedro Santana Lopes. Desde 1995, os congressos do PSD (e dos outros partidos) são litanias monocórdicas nas quais existe um prémio para o discurso dissonante, que permite ao respectivo autor marcar terreno para memórias futuras.

Se Marcelo não tivesse aparecido, os media teriam comentado muito mais o discurso de Santana Lopes, que foi completamente ofuscado. Sinal particular: o último parágrafo do comentário de Marcelo na TVI foi dedicado a zurzir em Santana.

Quanto ao resto, o comentador que não é candidato assinou o momento do congresso, divertindo Passos, a direcção do partido e os ex-líderes presentes. Ficou demonstrado que os comentadores (todos os comentadores), mesmo criticando, pertencem à tribo e fizeram a vénia ao chefe da tribo. Cada um à sua maneira. Marcelo com muito mais brilho do que os outros.

No jogo de aparecer e não aparecer que é o das presidenciais, Marcelo foi marcar espaço para impedir Santana de fazer o mesmo. Apenas para manter o jogo em aberto e condicionar os candidatos que ainda não apareceram e o aparelho partidário.

Mas o congresso acabaria por ficar marcado pelo misterioso regresso de Miguel Relvas, ele próprio um fantasma político. A prova: o facto de ter liderado uma lista para o conselho nacional do partido sem pôr os pés no Coliseu. Se Marcelo foi para não desaparecer, Relvas não foi para poder aparecer.

Esta lógica de vasos comunicantes estendeu-se para lá do Coliseu. Tal como a pressão de Paulo Rangel levou Seguro a antecipar o anúncio de Assis, o ausente mas presente Miguel Relvas precedeu em alguns dias o anúncio de que Jorge Coelho ia ajudar o líder socialista. Há neste paralelismo mais do que uma história de homens do aparelho mobilizados em véspera de um ciclo eleitoral complexo.

Para Relvas ser chamado, Passos deixou claro que quem, dentro do PSD, se meter com o seu amigo de sempre, leva. Do mesmo modo, a presença de Jorge Coelho tem uma nuance em relação ao passado: a missão do antigo ministro de Guterres já nem é dizer que quem se mete com o PS, leva. É dizer que quem, dentro do PS, se meter com o líder… já sabe: leva.

Mas o apoio que quer um quer outro trazem aos respectivos líderes pode ir mais longe do que as legislativas. Porque tanto um como outro poderão estar a apostar em que esses líderes, um pouco mais à frente, venham a apoiar Durão Barroso e António Guterres como candidatos presidenciais do centro-direita e do centro-esquerda.

Seguro, em particular, tem muito a ganhar com a nova aquisição, dada a forma como tem sido atacado dentro do partido. Já Passos foi entronizado há uma semana, mas não se libertou do fantasma de um desaire nas europeias.

Há muita matéria para Marcelo ir comentando. Num país onde a política muda tanto ao sabor do vento, o catavento é o mais bem colocado para a compreender.

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