Quando se quer fugir da palavra “mentira”

“Indiciariamente inverdadeiros” foi a expressão usada pelo deputado socialista José Magalhães face aos depoimentos de Paulo Portas e Durão Barroso à comissão de inquérito à compra de equipamentos militares. Abreviando: submarinos.

“Inverdadeiro” não consta nos dicionários. “Inverdade”, sim. E quer dizer o que toda a gente sabe mas não quer dizer: “mentira”. Mais: “falsidade”, “carácter do que não é verdade”, “embuste”. Um dicionário de 1981 regista esta observação para “inverdade”: “Trata-se de neologismo que só se justifica pelo facto de com ele se desbrutalizar a palavra ‘mentira’.” Fica então a saber-se que há pelo menos 33 anos se anda a fugir desta palavra. Ou a desbrutalizá-la...

Sendo o prefixo “in” um elemento designativo de negação, o que é inverdadeiro não é verdadeiro (até La Palisse o saberia). Como o adjectivo “verdadeiro” significa que é “conforme à verdade”, “exacto”, “real”, a negação deste será o que toda a gente sabe mas não quer dizer. E vem mesmo a calhar a frase escolhida para ilustrar estas explicações: “O debate foi uma verdadeira farsa.”

“Indiciariamente” está registado e significa “relativo a indício”, “sinal”, “vestígio”. Juridicamente, “princípio de prova”.

Como os políticos portugueses têm uma imaginação vocabular invulgar (da “incorrecção factual” de Rui Machete ao “inconseguimento” de Assunção Esteves), dá-se aqui uma ajuda com sinónimos de “mentira”, muitos de origem brasileira: peta, patranha, lampana, lorota, potoca, maxambeta e mariquinha.

No Rio de Janeiro, “mentirinha” é um “biscoito redondinho e achatado, feito de massa de pão-de-ló”. Bom para degustar enquanto insistem em contar-nos histórias da carochinha.     

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