PS acusa Governo de fazer Orçamento de “fim de ciclo”

Orçamento do Estado para 2015 aprovado pela maioria com votos contra de deputados do PSD/Madeira.

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Daniel Rocha

A proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2015, aprovada esta terça-feira, em votação final global, é para o líder da bancada do PS um Orçamento “de fim de ciclo, elaborado por um Governo esgotado com uma estratégia derrotada”. No último OE da legislatura e o primeiro pós troika, a ministra das Finanças fez um discurso em que falou de um novo ciclo, mas com muitas cautelas sobre o futuro.

A proposta de OE foi aprovada só com os votos a favor das bancadas da maioria PSD/CDS, os votos contra das restantes bancadas, e de quatro deputados do PSD-Madeira (Guilherme Silva, Hugo Velosa, Correia de Jesus e Francisco Gomes), uma abstenção do centrista Rui Barreto, eleito pela Madeira. As organizações dos Trabalhadores Sociais-Democratas e Democratas-Cristãos anunciaram uma declaração de voto.

As Grandes Opções do Plano foram aprovadas apenas com os votos a favor das bancadas da maioria. No final das votações, as bancadas da maioria aplaudiram, como tem sido habitual nesta legislatura.

Depois de pôr em causa as previsões macro-económicas, o líder parlamentar do PS, Ferro Rodrigues, criticou um orçamento “elaborado por um governo esgotado e com uma estratégia derrotada”, cuja “única táctica passa por comprar tempo até às eleições, esperando que o aumento dos impostos e a luta contra a evasão fiscal continuem a aumentar a receita pública”. Neste ponto, criticou ainda o Governo por “não saber o que fazer da famosa Reforma do Estado”.

Respondendo às críticas, Ferro Rodrigues garantiu que as propostas do PS – chumbadas pela maioria – “cumprem o princípio da neutralidade orçamental”. E explicou como: porque previam o fim da redução da taxa de IRC “fora das condições acordadas há um ano, medida que vale cerca de 250 milhões de euros”, e porque as propostas apresentadas “aumentariam o rendimento das famílias, ajudando a estabilizar a procura interna”. 

Ferro enumerou as propostas recusadas pela maioria: a prorrogação por seis meses do subsídio social de desemprego, a reposição dos passes escolares, a alteração da cláusula de salvaguarda do IMI e o fim da isenção de 50% para os fundos imobiliários, e a redução do IVA na restauração e a reposição dos complementos de pensão.

Mantendo a estratégia seguida durante todo o debate em torno do OE, o líder parlamentar do PS voltou a pôr em causa o cenário macro-económico apontado pelo Governo, uma “fantasia que demorou poucos dias a ser desmascarada” pelas instituições internacionais, e a lembrar “o aumento expressivo da pobreza com “2,8 milhões de pessoas em risco de pobreza ou exclusão social”.

O "novo ciclo" do Governo
Logo de seguida, o líder da bancada do PSD, Luís Montenegro, contestou aquele argumento do PS de se interrogar sobre as previsões macro-económicas, apontando para as da troika como as mais acertadas. “O PS é o mais troikista dos partidos hoje em Portugal”, afirmou Montenegro.

Se o PS fala em fim de ciclo, o Governo contrapõe com o “início de um novo ciclo”. O encerramento do debate ficou a cargo de Maria Luís Albuquerque que começou por sublinhar que, com este Orçamento (e um défice de 2,7%), Portugal sairá do procedimento por défice excessivo.

“O Orçamento marca o início de um novo ciclo e deve lançar o debate sobre perspectivas de futuro, já sem programa mas com importantes desafios”, afirmou a ministra das Finanças. Que elencou a “reversão das medidas de carácter transitório” como a reposição dos cortes, das pensões, para concluir que “as famílias deverão registar aumento de poder de compra em 2015”. 

Mesmo num novo ciclo, a ministra advertiu que “ajustamento tem de prosseguir” e que “este caminho não está isento de custos nem de riscos”, mas que se “reveste de esperança”. Esta advertência para o futuro reflecte uma lição do passado, em que Maria Luís Albuquerque considera não ter sido feita uma “actuação preventiva” para evitar uma “disciplina externa e imposta”.

"Quem governa melhor?", pergunta Montenegro
Os ataques mais directos ao PS ficaram por conta das bancadas da maioria. Desta vez, o líder da bancada do PSD não nomeou José Sócrates, ao contrário do último debate na generalidade em que acusou o ex-primeiro-ministro de ser “o verdadeiro líder do PS”. Mas as referências estão lá.

"No final deste debate, coloca-se ao país uma pergunta simples, singela, mas cheia de conteúdo político: Portugal está ou não a ser mais bem governado hoje do que foi pelos governos anteriores do PS? Este Governo, esta maioria, o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho e a sua equipa estão ou não a tratar com mais competência, com mais rigor, do interesse das pessoas, do futuro de Portugal, do que fizeram os governos do PS do anterior primeiro-ministro e das suas equipas?”, questionou Luís Montenegro.

Também o CDS visou os socialistas por não apresentarem propostas que compensem financeiramente as medidas avançadas pela bancada liderada por Ferro Rodrigues. “Das três dezenas de propostas que apresentou, não há não há uma única que não aumente a despesa sem que o PS diga onde vai compensar”, apontou Nuno Magalhães, líder da bancada centrista.

“Parece que o PS só sabe conjugar os verbos isentar, terminar, finalizar ou repor. À pergunta como se paga, como se compensa este aumento de despesa (…) do PS só temos duas respostas. Ou uma crença no crescimento económico, ou uma suposta ‘leitura inteligente dos Tratados’ [com vista à alteração das metas orçamentais] que, não só não depende de si, como ninguém conhece ou acredita”, afirmou.

Num discurso em que enalteceu os números do crescimento económico, das exportações, do investimento (apesar do desemprego ter ainda um contexto difícil), o líder da bancada centrista sublinhou a marca política das opções do OE: “Uma opção pelas famílias”. Lembrou o quociente familiar no IRS, a “opção pela classe média, que “protege as pensões abaixo dos 4600 euros”, e o início da reposição dos salários da Função Pública.

Apelidando o OE como sendo de “esperança”, Nuno Magalhães concluiu: “Temos um orçamento que é melhor para as famílias, para as empresas e para os contribuintes, sem pôr em causa o caminho percorrido e os esforços realizados”.

"Nem com lupa" há diferenças no OE, diz esquerda
Para as bancadas à esquerda do PS, no primeiro orçamento depois da saída da troika, não se vislumbram as diferenças face aos últimos três anos. “Nem como uma lupa”, ironizou Catarina Martins, deputada do Bloco de Esquerda.

“O Orçamento para 2015 segue à risca o guião dos últimos anos. Mais impostos para todos os cidadãos e nova borla fiscal para os lucros das grandes empresas. A mesma aversão ao investimento, a continuidade dos brutais cortes nos serviços públicos, o enfraquecimento dos direitos de quem trabalha, os salários que não são devolvidos”, exemplificou.

“Não há nada neste orçamento que comprove ou sequer indicie o fim da crise. Tudo o que de pior nos chegou em nome da troika, e que não foi impedido pela luta dos portugueses ou por decisões do Tribunal Constitucional, por cá permanece”, acrescentou o deputado do PCP, António Filipe.

José Luís Ferreira, deputado de Os Verdes, acusou o Governo de propor “um orçamento que, sem troika, prolonga o túnel da austeridade e mantém o relógio a andar para trás nos sacrifícios impostos aos portugueses” e criticou as opções “que penalizam quem trabalha, os pensionistas e quem não consegue arranjar trabalho”.

“A troika foi embora, mas o Governo ficou com as políticas”, rematou.

A “agenda do avesso” do bloco central
No debate que encerrou a discussão do OE para 2015, Verdes e Bloco recuperaram um dos temas que marcou o debate na especialidade: as subvenções vitalícias dos antigos políticos.Uma proposta dos deputados Couto dos Santos, do PSD, e José Lello, do PS, previa a revogação do artigo da Lei do OE que fazia depender as subvenções dos rendimentos dos seus beneficiários. Em vez disso, as subvenções ficariam sujeitas a uma contribuição de 15%. A proposta gerou mal-estar dentro dos partidos que a propuseram e polémica na oposição, acabando por ser retirada.

 José Luís Ferreira lamentou que as propostas do seu partido tenham sido todas recusadas pela maioria. “Curiosamente, os partidos da maioria apenas mostraram abertura para duas propostas com os partidos da oposição, sendo uma delas com o PS para fazer regressar as subvenções vitalícias para os cargos políticos que em boa hora acabou por ser retirada”, destacou.

Catarina Martins, do BE – o partido que no debate na especialidade alertou para a proposta –denunciou “as prioridades e agendas do avesso dos partidos do bloco central”. “Se o Bloco de Esquerda não tivesse denunciado a vergonha, PS e PSD teriam passado a reposição das subvenções entre os pingos da chuva no mesmo momento em que mantinham os cortes nas pensões de quem trabalhou e descontou toda uma vida”, destacou.

 

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