Presidentes de junta com três mandatos podem candidatar-se se freguesia tiver sido agregada

Tribunal Constitucional decide que lei de limitação de mandatos não se aplica nos casos em que houve agregação de freguesias.

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Acórdão do TC foi conhecido quinta-feira à noite Enric Vives-Rubio

Um presidente de junta que tenha cumprido três ou mais mandatos seguidos pode recandidatar-se caso a freguesia que liderava tenha sido agregada a outras. É este o entendimento do Tribunal Constitucional, que se pronunciou sobre uma reclamação do PS à candidatura de Henrique Antunes (CDU) à Assembleia de Freguesia de Peniche.

“Dúvidas não há de que uma freguesia criada na sequência da fusão de freguesias empreendida pela Lei n.º22/2012 é uma nova autarquia local, constituindo uma realidade jurídica e materialmente distinta das freguesias extintas em consequência dessa união de freguesias”, diz o acórdão 494/2013, publicado neste sábado no site do Tribunal Constitucional.

“Ao ser criada uma nova freguesia, por agregação de outras anteriormente existentes, assiste-se à perda de individualidade jurídica de cada uma das unidades agregadas e ao nascimento de uma outra entidade autónoma, dotada de personalidade jurídica, centro de imputação de direitos e deveres”, acrescenta o mesmo acórdão.

“Conclui-se, consequentemente, que a limitação à renovação de mandato não se aplica ao presidente de junta de uma freguesia constituída por agregação, que tenha cumprido três mandatos consecutivos numa das freguesias agregadas”, diz a decisão dos juízes.

O caso do candidato da CDU à junta de freguesia de Peniche – que poderá ser extrapolado para as centenas de processos similares – foi apreciado por sete juízes do Tribunal Constitucional. A decisão foi tomada na sexta-feira com cinco votos a favor (Catarina Sarmento e Castro, Maria José Rangel de Mesquita, João Cura Mariano, Pedro Machete e Maria Lúcia Amaral) e dois contra (Maria João Antunes e Maria de Fátima Mata-Mouros, ambas emitindo uma declaração de voto).

Depois de terem dado luz verde às listas dos presidentes de câmara com três mandatos seguidos que estão a candidatar-se a outros municípios (como é o caso de Luís Filipe Menezes ou Fernando Seara), os juízes do TC voltam a ter uma interpretação menos restritiva da lei de limitação de mandatos.

Só que desta vez a decisão pode ser considerada mais surpreendente. O constitucionalista Jorge Miranda tinha argumentado nesta semana que havendo uma coincidência de parte do território e da população entre a freguesia que desaparece e a nova freguesia não faria sentido aceitar candidaturas de presidentes que tenham cumprido três mandatos. "Parece-me óbvio que não pode haver candidaturas [de autarcas com três mandatos consecutivos] que abranjam a freguesia anterior”, disse à Lusa o constitucionalista, argumentando que isso “no fundo é candidatar-se à mesma circunscrição territorial”.

Só que o TC não pensa assim. “Poder-se-ia pensar, nesta situação de parcial sobreposição territorial e populacional, que pudessem aqui valer as ponderações que levaram o legislador a consagrar as inelegibilidades” na lei de limitação de mandatos, lê-se no novo acórdão. “A verdade, porém, é que para os efeitos considerados na Lei n.º 46/2005, as situações resultantes de agregação de freguesias são tão diversas entre si – nomeadamente porque a sobreposição parcial da nova freguesia e da freguesia agregada em que o presidente da junta exerceu os mandatos consecutivos é muito variável – que não se pode ter como segura a vontade do legislador de abranger todas estas situações”.

Esta incerteza – “agravada pela circunstância de a reorganização administrativa das freguesias ser um facto novo, não previsto em 2005, e de o legislador nada ter referido a este propósito nas leis que operacionalizaram a mencionada reorganização” – levam o Tribunal Constitucional a ter uma posição cautelosa. “Nestes casos, não poderá deixar de se considerar que não caberá ao intérprete substituir-se ao legislador na clarificação da incerteza sobre a amplitude das inelegibilidades”.

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