Coligação procura apoio dos parceiros sociais para ganhar peso junto de Cavaco

Paulo Portas liderou equipa PSD-CDS que começou ronda de negociações com patrões. À saída do encontro com a CIP avisou que governo com PCP e BE "não fará bem à estabilidade e criação de emprego".

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Coligação reuniu-se com João Machado da CAP (na foto) e umas horas antes com a CIP. Rui Gaudêncio

A coligação PSD-CDS está a agir em duas frentes: uma é a procura de apoio público dos parceiros sociais – que pode jogar a seu favor junto de Cavaco Silva na decisão de dar posse a um governo de direita  – e a outra é passar ao ataque ao PS.

À saída de uma reunião com a Confederação da Indústria Portuguesa (CIP), o líder do CDS-PP, Paulo Portas, foi directo ao alvo e acusou o secretário-geral do PS de “sequestrar os votos dos portugueses” e de tentar “quebrar” regras democráticas.

“Porventura o doutor António Costa não tem a noção do sentimento que está a gerar na sociedade portuguesa. Não são apenas os 2,1 milhões de portugueses que votaram na coligação que pensam que há uma operação em curso para sequestrar o seu voto –  o voto que deram à coligação para governar –, mas também muitos que não votaram na coligação que são democratas e que não querem a ruptura com regras que permitem a convivência democrática entre todos”, afirmou.

Portas defendeu que Pedro Passos Coelho deve ser indigitado primeiro-ministro pelo Presidente da República, cumprindo as suas competências constitucionais. E considerou estar “em curso uma tentativa de alterar esse princípio de bom senso”, que é o de “quem ganha as eleições governa”.

Lembrando que a coligação Portugal à Frente “soube ganhar com humildade”, Portas referiu que os dois partidos souberam “aproximar-se do PS, que perdeu, mas que é o único que tem um projecto do arco europeu”. E apontou: “O PS não soube perder com princípio de dignidade que é respeitar a vontade dos eleitores.”

Dado o recado directamente ao líder do PS, Paulo Portas passou a criticar o acordo frágil com o BE e PCP – não o disse, mas referia-se a um entendimento apenas para o primeiro Orçamento do Estado –, bem como as consequências dessa aliança mais à esquerda.

“Alguém acha que é de bom senso pôr a governabilidade do país nas mãos do BE ou PCP no momento em que mais precisamos de confiança para a recuperação económica e criação de  emprego?”, questionou. Lembrou que a solução de governabilidade ficaria “nas mãos de acordos precários com o BE e o PCP” e que isso não fará certamente bem à estabilidade, à criação de emprego que decorre do investimento”.

Apesar do tom duro, o líder do CDS não deu por adquirido que as negociações com o PS estejam fechadas, nem alinhou pela ideia de que Passos Coelho o tivesse feito, mas lembrou que António Costa ainda não entregou qualquer contraproposta ao documento apresentado na terça-feira pela coligação. Uma posição que está em contraste com as negociações do PS à esquerda, “onde tudo parece correr bem”.

Este tem sido um dos pontos da argumentação da coligação: é que António Costa exige muitos dados financeiros para se sentar à mesa das negociações, mas ao PCP e ao Bloco não solicita os impactos financeiros das medidas propostas.

Concertação social como trunfo
À porta das instalações da CIP – onde a coligação iniciou um conjunto de audiências junto dos parceiros sociais e que irão continuar na próxima semana – o líder do CDS-PP lembrou o que pode ser visto como um trunfo aos olhos de Belém: a capacidade para fazer acordos de concertação social.

“Não me canso de elogiar a importância que teve para Portugal e na criação de condições para atrair investimento o acordo social feito entre empregadores e trabalhadores durante o período de recessão”, disse, numa alusão ao acordo de 2012 em que só a CGTP ficou de fora. Portas acrescentou um elogio ao entendimento a que o PSD e o CDS chegaram com o PS sobre a descida do IRC – na altura em que António José Seguro liderava os socialistas – e que permitiu “dizer aos investidores que Portugal era um país competitivo”.

Ao lado do vice-presidente do PSD, Marco António Costa, Paulo Portas não escondeu ao que vinha: “Estes dois exemplos que vos dei dão-nos a medida da vantagem em chegar a compromissos e acordos desde que haja boa-fé para chegar a acordo.”

Empresários pedem estabilidade
Se a coligação procura ter os parceiros sociais ao seu lado em vésperas de formar governo, o líder da CIP, António Saraiva, deu um sinal positivo aos dois partidos da direita. Num discurso muito próximo da mensagem de Portas, António Saraiva pediu “estabilidade governativa, fiscal e laboral” ao novo governo e afastou os partidos que não se revêem no projecto europeu, ou seja, PCP e BE.

“Os portugueses votaram num projecto de Estado-membro da União Europeia em determinados pressupostos e numa garantia de estabilidade que, em nossa opinião, é mais garantida com uma constituição de governo do que com projecções matemáticas que, por mais legítimas que sejam, não creio que seja esse o caminho que os portugueses no dia 4 de Outubro quiseram validar”, disse.

António Saraiva lembrou que os resultados eleitorais das legislativas deram 70% de expressão ao “projecto de estar na Europa e de respeitar os tratados”. “Qualquer outra maioria que se possa formar não tem sustentabilidade futura”, reforçou. Esta posição da CIP já tinha ficado clara na quarta-feira, depois de uma reunião na Concertação Social com o primeiro-ministro para preparar a reunião do Conselho Europeu.

Após o encontro e em declarações ao PÚBLICO, o presidente da CIP adiantou que a reunião serviu para a coligação explicar “o que pensa fazer com os parceiros sociais, se formar governo,” e para colocar “algumas sugestões em cima da mesa”.

Questionado sobre se foi abordado um eventual acordo de concertação alargado, António Saraiva respondeu que “o futuro governo, seja ele qual for, terá de ouvir os parceiros sociais, que representam a economia” do país.

Também nesta sexta-feira, Paulo Portas e Marco António Costa rse euniram com a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP). No final do encontro, o presidente João Machado alertou a coligação para as consequências do atraso na formação de um novo governo na aprovação do Orçamento do Estado e na comparticipação nacional dos fundos comunitários para a agricultura.

O presidente da CAP manifestou também "apreensão" com a formação de um governo esquerda integrado pelo PCP, recusando uma "nova reforma agrária".

"Nós sabemos muito bem o que o PCP sempre defendeu. Estamos a assinalar o 25 de Novembro de há 40 anos, que foi exactamente a colectivização das explorações agrícolas. Não defendemos uma nova reforma agrária e um retrocesso neste processo e o que nos parece é que o PCP a ter influência nessa matéria iria ter essa tendência, portanto, vemos com alguma apreensão", defendeu João Machado, em declarações à Lusa.

As restantes confederações patronais não têm ainda reuniões agendadas, ao que o PÚBLICO apurou. Questionado, o presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, João Vieira Lopes, garantiu que “até ao momento não existe qualquer reunião agendada”.

As centrais sindicais, CGTP e UGT, também não tinham sido formalmente contactadas pela coligação para encontros semelhantes.

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