Passos tornou-se um alvo ou é apenas teoria da conspiração?

PSD faz passar a ideia de que Passos está a ser atacado por interesses poderosos.

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Passos Coelho Daniel Rocha

Passos Coelho tem tentado fazer passar a ideia de que se tornou um alvo por ter mexido com interesses poderosos. Com duas frases enigmáticas proferidas na passada sexta-feira, deu esse tom.

Forçado a dar explicações sobre o caso Tecnoforma no debate quinzenal da semana passada no Parlamento, o primeiro-ministro afirmou ter tomado sempre decisões de acordo com a sua consciência, “mesmo que isso possa desagradar a algumas pessoas com alguma influência”.

Nessa noite, na reunião do Conselho Nacional do PSD, Passos referiu-se a um “mensageiro” que lhe terá dito que o Governo não iria durar muito porque mexeu com uma determinada pessoa influente, que no entanto não identificou. Na reunião, que decorreu à porta fechada, o líder dos sociais-democratas não se quis alongar sobre o caso. Dentro da sala, as intervenções dos conselheiros foram no sentido de lhe expressar solidariedade, mas à margem da reunião ninguém nega que o caso atingiu o primeiro-ministro naquilo que era considerado um dos seus pontos fortes: a seriedade e a honestidade.

Passos Coelho tornou-se um alvo ou está em construção uma teoria da cabala? Várias fontes ouvidas pelo PÚBLICO afirmam que o primeiro-ministro tem recebido avisos por, alegadamente, se ter tornado o alvo de interesses poderosos que, nos últimos tempos, perderam influência na sociedade portuguesa. Estas mensagens terão chegado a Passos através de contactos pessoais na semana em que o caso Tecnoforma esteve ao rubro.

Os avisos, acrescentam as mesmas fontes, não atingirão apenas o primeiro ministro, mas também "outros políticos".

De acordo com esta espécie de teoria da conspiração, o primeiro sinal seria a denúncia anónima enviada ao Ministério Público, em que se garantia que Passos Coelho recebeu cerca de 150 mil euros quando era deputado em exclusividade nos anos 90, por presidir ao Conselho Português para a Cooperação (CPPC), uma ONG do grupo Tecnoforma. O primeiro-ministro negou ter recebido uma remuneração fixa por presidir à ONG, mas admitiu ter sido reembolsado em despesas de representação, embora sem avançar os valores em que foi ressarcido.

Certo é que o caso Tecnoforma começou a ser investigado – e noticiado pelo PÚBLICO desde há dois anos, e já na altura o primeiro-ministro se recusou a responder à pergunta sobre os pagamentos que terá recebido.

Apesar de o secretário-geral do PS António José Seguro ter pedido, no debate quinzenal, que o primeiro-ministro levantasse o sigilo bancário para se verificar que pagamentos recebeu, os sociais-democratas não apontam uma origem partidária, nem do PS, para a denúncia anónima.

Esta foi enviada em Junho deste ano ao Ministério Público, assinada apenas com o nome “Vasco”, e referia que, entre 1997 e 2001, Passos Coelho “foi efectivamente pago”, para presidir ao CPPC  “para conseguir projectos de formação profissional”. Durante três anos e enquanto era deputado em exclusividade o então deputado “recebeu mensalmente mil contos (cerca de 5 mil euros)”, dizia a carta anónima.

A denúncia foi noticiada pela revista Sábado na edição de 18 de Setembro. Logo no dia seguinte, Passos Coelho, confrontado pelos jornalistas sobre o assunto, disse não se lembrar se tinha recebido ou não. Estas declarações foram depois apontadas como um erro, tendo em conta os elevados valores em causa. O primeiro-ministro indicou que deveria ser o Parlamento a esclarecer a sua situação enquanto deputado.

Mas o que o PÚBLICO apurou, entre contradições da secretaria-geral da Assembleia da República, é que Passos Coelho declarou ter exercido o mandato em exclusividade, entre 1995 e 1999, no final da legislatura quando pediu um subsídio de reintegração.

Só quatro dias depois das primeiras declarações sobre o caso, o primeiro-ministro voltaria a falar do assunto, numa conferência de imprensa ao lado do Presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz. E falou, não para dar explicações, mas para anunciar que pediria à Procuradoria-Geral da República para averiguar se tinha cometido algum ilícito. Uma iniciativa que, para alguns sociais-democratas, foi um segundo erro. Depressa se percebeu que a PGR não iria investigar nada, já que o eventual crime fiscal prescreveu.

As explicações só seriam dadas na sexta-feira, no Parlamento. Na equipa de Passos Coelho argumenta-se que só as podia dar depois de conhecer os contornos da denúncia. E isso só aconteceu na quinta-feira à noite, quando a PGR lhe enviou o despacho de arquivamento do inquérito relativo à denúncia, que tinha sido instaurado na véspera. 

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