Passos Coelho não cedeu aos apelos dos municípios

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O uso do condicional não escapou a Pedro Passos Coelho no discurso de encerramento Paulo Pimenta

O XIX Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), que reuniu em Coimbra mais de 600 autarcas, não terminou em festa. O primeiro-ministro, o último a discursar, “não fechou a porta à futura cooperação”, como resumiria mais tarde o presidente da associação, Fernando Ruas, mas deixou claro que não irá recuar nos cortes das transferências para os municípios. O mais positivo acabou por ser o silêncio em relação à redução dos municípios e a clarificação do que o Governo pretende com a redução de freguesias.

Não foi um congresso vibrante. Durante a maior parte da tarde foram mais as cadeias vazias do que as ocupadas e chegou a ouvir-se um apelo, feito ao microfone, para que os congressistas não abandonassem o local. Enquanto uns fumavam à porta do pavilhão e outros passeavam no vizinho centro comercial, alguns autarcas faziam discursos muito semelhantes nas reivindicações.

Sem divergências significativas resultantes das diferenças partidárias, todos insistiram na alegada incapacidade dos municípios para fazerem frente “a ainda mais cortes directos nos fundos para as autarquias”. O cumprimento, agora, do memorando da troika, calculam, resultaria numa perda de mil e duzentos milhões de euros de receitas entre 2010 2013. Isso “colocaria os municípios em situação dramática, disse o social-democrata Fernando Ruas, e “torná-los-ia incapazes de garantir o apoio social que hoje prestam”, reforçou o socialista Mário de Almeida, presidente do conselho geral da ANMP.

O uso do condicional não escapou a Pedro Passos Coelho, o último, dos três, a discursar na sessão de encerramento. E fez questão de o corrigir, numa fuga ao texto que levou já escrito para o congresso. Num aparte suscitado pelas intervenções anteriores, como frisou, o primeiro-ministro sublinhou que “todo o país entende como vital o bom desempenho nacional”. “Se queremos ter condições de financiamento para a nossa economia e para regressar aos mercados teremos de ser absolutamente cumpridores daquilo que foi estabelecido como compromisso”, frisou.

Foi neste contexto que disse que “quem começa o mandato a colocar no condicional aquilo que deve fazer começa mal”. Disse ainda, perante uma plateia absolutamente silenciosa, que o Governo tem de deixar claro desde já que vai “honrar os compromissos”.

Depois, por meias palavras, suavizou o discurso. “Não devemos acentuar o que poderemos melhorar e modelar no futuro, mas manifestar a nossa inteira vontade cumprir aquilo que foi acordado”. Não acrescentou o ‘mas’, ainda assim ele ficou subentendido: “muitas das políticas que temos de desenvolver para atingir os objectivos estabelecidos no memorando carecem ainda de um exercício de elaboração e de concretização e quero desde já assegurar que o Governo terá a maior abertura e diálogo com a sociedade portuguesa”, disse. Pela primeira e única vez ao longo de toda a intervenção, recebeu uma salva de palmas, tímida.

Os autarcas não deram sinais de alívio quando Pedro Passos Coelho omitiu a contestadíssima redução de concelhos do país, ao garantir que cumprirá a prometida reorganização do mapa administrativo, “na senda da optimização e da racionalização do número de órgãos autárquicos de acordo com o princípio de ‘geometria variável’”. Ou quando voltou ao improviso para clarificar que a redução de freguesias não se fará nas zonas do interior, já desertificadas.

A promessa de uma nova Lei das Finanças Locais também não provocou reacções – talvez por não ter ficado claro qual o modelo a adoptar. E também não houve festejos quando Passos Coelho disse que se “procurará regularizar as situações de dívida a cargo da Administração Central” em relação aos municípios; ou quando insistiu que, no processo de renegociação do processo de reprogramação dos programas operacionais do Quadro de Referência Nacional (QREN), se empenhará em garantir uma maior fluidez e celeridade nas transferências de meios e na aplicação destas verbas em eixos caros à administração local.

O fim da intervenção não proporcionou razões para o entusiasmo dos autarcas. Pedro Passos Coelho insistiu na necessidade de avaliar a situação do sector empresarial municipal, em relação à sua utilidade pública, e com vista à racionalização da despesa.

Antes, já o ministro-Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, se tinha referido às empresas municipais, ao negar razão aos municípios que se queixam de não terem mais por onde cortar: “Ainda há muitas gorduras para perder”, disse, em declarações aos jornalistas.

O hino de Portugal, cantado assim que Passos Coelho se calou, fechou o congresso e os autarcas abandonaram rapidamente a sala. Fernando Ruas, apanhado pelos jornalistas, mostrou dificuldade em classificar o discurso daquele que também é líder do seu partido. Acabou por sublinhar que ele não fechava as portas à cooperação e por se mostrar conformado: “Antes isto do que ouvir grandes promessas que depois nunca se concretizam”, atirou, explicitando que se referia à postura do anterior ex-primeiro-ministro, José Sócrates.

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