Partidos da esquerda avisaram-se "informalmente" sobre os seus primeiros diplomas

Aborto, feriados, adopção homossexual, 35 horas e complementos de pensão são as matérias que PS, BE e PCP recuperam para debate.

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Miguel Manso

Com a entrega, esta quarta-feira, dos quatro primeiros projectos de lei do PCP nesta legislatura, assistiu-se no Parlamento a mais um capítulo do ambiente de “consonância” à esquerda.

BE, PS e PCP entregaram, entre quarta e sexta-feira da semana passada, 10 propostas para serem debatidas na Assembleia da República. Têm em comum os temas e até o articulado em alguns dos diplomas. A revogação da última revisão à lei do aborto é proposta pelos três partidos. O fim da impossibilidade de adopção por homossexuais é avançado pelo PS e BE. A reposição dos feriados é defendida pelo PCP e PS. E mesmo nos casos em que apenas um dos partidos foi entregou uma iniciativa, é sobre um assunto pacífico entre os três.

Ao que PÚBLICO apurou, a esquerda concertou entre si essas tomadas de posição. Ou seja, conforme reconheceu um elemento da recém-eleita direcção da bancada socialista, “deu-se conhecimento informal” da entrega das iniciativas. Um dirigente do BE confirmou que “informalmente” se fez saber aos outros partidos o que iriam fazer.

O líder parlamentar do BE comentou essa sintonia nas iniciativas. “Ainda bem que há consonância. Só reforça o espírito construtivo que existe entre os partidos”, disse ao PÚBLICO Pedro Filipe Soares. Mas o bloquista frisou que essa “consonância”  se limitou mesmo a esses contactos de corredor parlamentar: “Formalmente, não demos conhecimento. Não tínhamos que dar, nem tínhamos que receber.”

Por seu turno, o vice-presidente da bancada do PS, que preparou a entrega dos diplomas socialistas, destacou que as propostas em si não eram geradoras de surpresa entre as bancadas da esquerda. “No debate em que a direita fez alterar a lei da IVG (Interrupção Voluntária da Gravidez), o PS anunciou que esta seria a sua primeira iniciativa. E julgo que os outros partidos fizeram algo de semelhante”, disse Pedro Delgado Alves.

O melhor exemplo da sintonia encontra-se nos diplomas relativos à IVG. Para lá da exposição de motivos, todos propõem o mesmo, ou seja, a revogação das leis 134 e 136 de 2015.

Também no articulado das propostas do PS e BE sobre a adopção por casais do mesmo sexo se encontram repetições. Ambos os partidos propõem as alterações necessárias a permitir a adopção por pessoas que vivam em união de facto, independentemente do sexo.

No caso da reposição dos feriados retirados pelo Governo de Passos Coelho, no entanto, o coro à esquerda desafina. Enquanto o PCP defende a reposição dos quatro feriados, o PS propõe apenas dois, a saber os feriados civis (5 de Outubro e 10 de Junho). A justificação para tal é a necessidade de “se seguir os canais diplomáticos” junto da Santa Sé. “Como consta da Concordata, a AR não pode mexer neles sem a prévia intervenção do Governo”, explica Pedro Delgado Alves antes de reiterar que o objectivo final é a recuperação dos quatro feriados.

Por isso mesmo, João Oliveira, líder parlamentar do PCP, desvaloriza o aparente desacerto. “Isso não constitui problema.”

Outra matéria ainda sem acerto garantido é a procriação medicamente assistida. Tanto o PS como o BE defendem o alargamento desse processo médico. Mas em Fevereiro deste ano, o PCP votou contra (ao contrário dos Verdes) com o argumento de que essa alteração teria de ser antecedida pelo debate sobre adopção por casais do mesmo sexo.

Acordo nas 35 horas e nos complementos de pensão
Quanto às outras duas propostas comunistas, há indicações de que a matéria é passível de acordo. Sobre a reposição das 35 horas de trabalho semanais, Pedro Delgado Alves recordou a oposição do PS à alteração realizada pela coligação na anterior legislatura. E sobre a reposição dos complementos de pensão nas empresas do Estado, o mesmo socialista recordou o apoio de deputados do PS no pedido de fiscalização constitucional feito na altura da aprovação deste corte.

De qualquer forma, a esquerda tem ainda tempo para preparar estes debates, que não foram sequer agendados na conferência de líderes realizada ontem. A prioridade mantém-se na discussão do programa de Governo da coligação, conforme se percebeu na declaração do recém-eleito líder parlamentar do PS.

Carlos César apontou para o próximo dia 10 de Novembro como a data para revelar aos portugueses o acordo entre os partidos da esquerda. A divulgação “ficará associada ao momento em que for discutido o programa de Governo [da coligação]”, disse o socialista após a sua eleição como líder parlamentar do PS. Uma vez que a conferência de líderes agendou esse debate para os dias 9 e 10 de Novembro, esse será o momento a que César se referiu. A nova liderança da bancada parlamentar socialista foi eleita com mais de 83 % dos votos dos 85 deputados que participaram. A lista encabeçada por Carlos César recebeu 71 votos a favor, 5 contra e 9 votos em branco.

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