“Presidente da República não deve intrometer-se com o Governo”

Em entrevista à SIC, Maria de Belém defende que dissolução da Assembleia só deve existir em casos graves ou reiterados de violação da Constituição e do Tratado da União Europeia.

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Miguel Manso

Estabilidade foi a mensagem que Maria de Belém quis transmitir na sua entrevista como candidata presidencial à SIC. Estabilidade política e pessoal, referiu também, numa assumida farpa ao seu principal rival na corrida a Belém, Marcelo Rebelo de Sousa.

O candidato apoiado pela direita foi o seu principal alvo, enquanto colocava Sampaio da Nóvoa num reduto mais extremo: “Eu sou de centro-esquerda, sou social-democrática, sou do socialismo que criou o Estado social”, enquanto Sampaio da Nóvoa fica “mais à esquerda”, até por ter “o apoio formal do Livre e do MRPP”, afirmou.

Para Maria de Belém, Marcelo Rebelo de Sousa “passa a vida a fazer de contas que é o que não é: faz de conta que não é político quando é, faz de conta que não é próximo de Cavaco Silva quando o apoiou nas duas candidaturas presidenciais e até foi seu conselheiro de Estado, mostrando agora alguma ingratidão para com ele”, ilustrou a antiga presidente do PS.

E acrescentou: “É por natureza uma pessoa extremamente reactiva”, o que considerou “mau para a função presidencial”, que diz “precisar de um moderador, um árbitro”, e não alguém que, “quando tudo está bem, gosta muito de criar factos políticos”. Belém insistiu na tecla: “Ele próprio disse que vai acompanhar tudo e mais alguma coisa, e portanto, quem acompanha intervém”.

Mais à frente, continuou pela mesma linha: “O Presidente da República não deve ser intrometido com o Governo”. Agora já respondia a perguntas sobre como irá desempenhar o cargo presidencial e o seu entendimento do poder de dissolução. Maria de Belém esclareceu que, no seu entender, este poder só deve ser usado em caso de “incumprimento do Tratado da União Europeia, que tem respaldo constitucional” e do “incumprimento grave ou reiterado da Constituição”.

Afastou, portanto, o cenário de dissolução por outros motivos de natureza política e foi clara ao defender que “o normal é que o Governo dure uma legislatura”. “O país só ganha em ter estabilidade, não apenas do ponto de vista político, mas por questões económicas”. “É muito importante a estabilidade”, insistiu, mas mais uma vez para lançar uma farpa ao professor de Direito: “Não estarei nunca a interferir, ao contrário de outras pessoas”.

Mas ainda não era tudo. No estúdio televisivo, Maria de Belém começara por dizer que não tinha gostado de ver a entrevista a Marcelo Rebelo de Sousa a ser gravada na Faculdade de Direito de Lisboa, onde é professor: “Somos todos candidatos”, “não devemos usar as instituições”. E quando questionada sobre se era ou não vantajoso ser constitucionalista na corrida ao cargo, afirmou que não: “O Presidente da República não ter de ser constitucionalista, senão deixa de ser árbitro e passa a ser parte”. Além de que, afirmou, “quem é o fiscalizador da constitucionalidade é o Tribunal Constitucional, e não o Presidente da República”.

Apesar deste ter sido o tema dominante da conversa, também houve tempo para a ex-presidente do PS falar das relações com o partido e com o seu líder. “As relações com António Costa estão boas, não podiam ser más”, disse a candidata, que acha bem que o PS não apoie nenhum candidato e “perfeitamente natural” que o actual primeiro-ministro não participe nas suas acções de campanha. Mas já é peremptória ao afirmar que, numa segunda volta, conta com “a recomendação do PS” no voto em si.

Questionada sobre se contaria com a presença do ex-líder socialista António José Seguro na sua campanha, Belém respondeu: “Não falei com ele nem pensei nisso [em convidá-lo]. E afastou a acusação de estar a dividir o eleitorado socialista com a sua candidatura, apresentada meses depois da de Sampaio da Nóvoa: “Considerei que havia espaço não coberto, o centro-esquerda”, até porque “pode haver maior captação de votos, pois cobrimos áreas políticas diferentes”.

Duas facções dentro do PS? “Não são facções”, respondeu: “Nós temos opiniões e percursos políticos diferentes. Sampaio da Nóvoa é independente, eu sou militante do PS desde 1976, desempenhei muitos cardos mas fui sempre independente em termos de opinião, de decisão, de seguir a minha consciência”.

No final, Maria de Belém ainda teve de justificar o seu posicionamento de género. Questionada sobre se ser mulher é uma vantagem ou desvantagem, afirmou que nem uma coisa nem outra, mas reconheceu que “ainda há muitos preconceitos machistas” e diz saber bem o que é preciso fazer para que as mulheres tenham um tratamento igual aos homens. “Sou feminista na defesa da mesma dignidade entre os homens e mulheres”.

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