O Bloco sempre foi muito claro

Por duas vezes, em dias seguidos, o Bloco de Esquerda votou ao lado da direita em matéria de reforço da transparência dos gestores da Caixa. Pelo meio, algumas conversas de corredor não mudaram nada.

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Mariana Mortágua defende posição do Bloco em matéria de Estatuto do Gestor Público Enric Vives-Rubio

Não foi a primeira coligação negativa (a esquerda a unir-se à direita para desequilibrar as contas no Parlamento), mas não deixou de ser uma grande surpresa. O Bloco de Esquerda, partido que apoia a solução governativa protagonizada por António Costa, aprovou com o PSD e o CDS uma alteração ao Orçamento do Estado para 2017 que elimina a excepção criada pelo Governo para retirar os administradores da CGD do âmbito do Estatuto do Gestor Público (EGP). “O Bloco sempre foi muito claro”, diz Mariana Mortágua ao PÚBLICO, demonstrando que este assunto é uma espécie de linha vermelha para os bloquistas.

Uma vez aprovado este diploma, a equipa de António Domingues agora demissionária, assim como a que lhe vier a suceder, fica obrigada a cumprir os deveres de transparência e responsabilidade de todos “os membros do órgão de administração de instituições de crédito integradas no setor empresarial do Estado”, sendo-lhe nomeadamente “aplicáveis as regras e deveres constantes da (…) Lei n.º 4/83” (a que determina quem deve depositar as declarações de rendimentos e património no Tribunal Constitucional).

O Bloco votou ao lado da direita no dia 25, nas votações que decorreram em sede de comissão, e voltou a fazê-lo no dia 26, em plenário, depois de o PS ter avocado essa votação (o que implicou repeti-la no hemiciclo).

O que levou o PS a querer repetir as votações? A deputada Mariana Mortágua não responde a essa questão, repetindo apenas que “o Bloco de Esquerda sempre foi muito claro sobre as questões da transparência”. E que não é a parceria que tem com o Governo que vai pôr em causa a “natureza” do BE ou levar o partido a mudar o sentido das suas convicções. “Há um acordo que diz respeito ao Orçamento do Estado e que não nos impede de termos as nossas posições”, disse ao PÚBLICO.

Naquelas menos de 24 horas que separaram as votações houve, entre as duas forças políticas, conversas informais nos corredores do Parlamento, mas não no sentido de pressionar o Bloco a mudar o sentido do seu voto. “O PS manifestou as suas preocupações quanto a esta medida e nós as nossas. O BE foi claro. São posições divergentes. Não houve mais do que isso”, afirmou Mariana Mortágua.

Entre os bloquistas não há a ideia de que a avocação pedida pelo PS se baseasse na expectativa de que o BE mudasse de ideias, mas antes por ser uma matéria de grande importância que mereceria um debate com mais visibilidade, nomeadamente às explicações do próprio PS.

João Galamba, que ontem dirigiu a conferência de imprensa do PS sobre o assunto, não fez qualquer referência pública à posição do Bloco. Em menos de cinco minutos, Galamba limitou-se a atirar a responsabilidade pela actual situação da Caixa Geral de Depósitos para cima da direita. "Espero que PSD e CDS não causem mais problemas", disse, depois de acusar as duas forças políticas de "guerrilha partidária" com o único objectivo de impedir a recapitalização da CGD.

O deputado assumiu, no entanto, que nem tudo correu bem no processo da Caixa Geral de Depósitos. “O grupo parlamentar do PS gostaria que alguns aspectos tivessem corrido melhor”, reconheceu, sublinhando a importância do processo de recapitalização. 

Questionado sobre se não houve falhas em torno da transparência, João Galamba reafirmou que o PS “sempre disse” que a parte legal estava na lei. Os jornalistas tentaram questionar o deputado sobre a posição do BE, que se aliou ao PSD e ao CDS para aprovar a obrigação de entregar as declarações de rendimentos, mas não conseguiram obter uma resposta. João Galamba acabou por sair da sala de conferências de imprensa quando os jornalistas ainda faziam perguntas. 

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