Governo aprova proposta orçamental
A redução da sobretaxa do IRS pairou durante todo o dia em cima da mesa do Conselho de Ministros. Ao fim de mais de 18 horas de reunião, as propostas de Orçamento de Estado e das Grandes Opções do Plano foram aprovadas de madrugada, mas ainda não se conhecem as principais alterações.
Os Orçamentos do Estado do actual Governo são sinónimo de uma maior tensão na coligação PSD/CDS. Desta vez, há ainda outros ingredientes a alimentar as expectativas: É o primeiro Orçamento sem a troika e o último antes das próximas legislativas. E é um Orçamento que enfrenta uma nova liderança do PS ainda em estado de graça.
Este sábado, as tensões fizeram-se notar sobretudo no relógio: o Conselho de Ministros reuniu-se às 9 horas da manhã e 13 horas depois, cerca das 22 horas, o Governo fez a segunda pausa do dia para refeições, terminando o encontra já de madrugada (o comunicado sobre a reunião foi divulgado por volta das 04h00). De mesa em mesa, a redução da sobretaxa do IRS, pedida com insistência pelo CDS, deve ter sido o prato forte.
Mas a pressão do CDS no sentido do alívio fiscal começou a fazer sentir-se já há algumas semanas. O vice-primeiro-ministro Paulo Portas insistiu na “moderação fiscal” e exigiu chegar a um compromisso no seio do Governo. Noutro tom, o primeiro-ministro e a ministra das Finanças mostravam-se reticentes a comprometer-se com uma baixa de impostos. Apesar de ambos reconhecerem a carga fiscal elevada. Passos Coelho dizia mesmo que não iria ceder a eleitoralismos, o que deixava sociais-democratas e centristas arrepiados.
A imagem de haver um Governo e dois discursos começou a marcar a agenda mediática. E esta semana, Passos Coelho acabou por ter de garantir que não havia nenhum “risco de ruptura” nem “crise” na coligação. O primeiro-ministro justificou a sua prudência em assumir uma baixa de impostos com os chumbos do Tribunal Constitucional. No pós-troika, Passos não quer correr riscos orçamentais. E as contas têm de bater certo para que o défice se fixe em 2,5% em 2015.
Ao mesmo tempo que a coligação PSD/CDS falava a duas vozes, a comissão de reforma do IRS avançava com propostas de alteração coincidentes com as que são defendidas pelo CDS. Mas não é certo que as propostas sejam implementadas tal e qual o grupo de trabalho liderado pelo fiscalistas Rui Duarte Morais.
Entre as propostas está a introdução de um quociente familiar, que para o cálculo do rendimento colectável passa a incluir os filhos e os ascendentes sem recursos que vivam na mesma casa. A par desta proposta, que representa potencialmente uma desagravamento do IRS, o grupo de trabalho propõe a introdução de um sistema de deduções fixas à colecta para as despesas de educação, saúde, habitação e para as deduções pessoalizantes.
Neste modelo, as deduções não variam em função do gasto efectivamente realizado (como acontece actualmente, até determinado tecto de dedução), passando a ser iguais por cada sujeito passivo, dependente e ascendente. O valor será definido pelo Governo e aqui, caso as deduções fixas avancem, o limite será definido em função da perda de receita fiscal que o executivo quiser compensar, por causa da introdução do quociente familiar.
A comissão de reforma fez três propostas para fixar as deduções fixas. No melhor cenário para o bolso das famílias (em que o Estado não compensa qualquer perda de receita, uma hipótese que dificilmente será adoptada), cada sujeito passivo fica com uma dedução de 330,95 euros, enquanto nos dependentes esse valor é de 321,95 euros e nos ascendentes fica-se pelos 294,25 euros.
A proposta da comissão de reforma do IRS sugere ainda a eliminação gradual e faseada da sobretaxa do IRS, em função da margem orçamental que o executivo encontre para tal. Uma recomendação que já constava do relatório preliminar, de Julho, e que foi reforçada no relatório final de Setembro, tendo em conta os dados mais recentes da execução orçamental e as recomendações do Eurogrupo.
Paulo Portas concretizou a sua proposta já para 2015: reduzir imponto percentual (para os 2,5%) ao mesmo tempo que se avançaria já com medidas da fiscalidade verde. A solução – se vier a ser conseguida – já deixa satisfeitos os centristas. É que já há outras boas notícias para dar aos portugueses em ano de eleições: Aumento do salário mínimo, actualização das pensões mínimas e reposição dos cortes de salários na função pública.
A proposta de Portas sobre a sobretaxa extraordinária baseia-se nas recomendações da comissão de reforma do IRS. O impacto da aplicação das taxas sobre a poluição ambiental está estimado em 160 milhões de euros, enquanto cada ponto percentual na sobretaxa do IRS equivale a 220 milhões de euros. Não é só uma questão de fazer contas. No Governo, há quem argumente que uma coisa não se pode trocar pela outra. A receita fiscal do IRS – que os centristas insistem em sublinhar que está acima do previsto – dá mais garantias de entrada de dinheiro para os cofres do Estado. Já a receita da fiscalidade verde incide sobre o consumo, o que a torna mais incerta.
Tornar o IRS mais amigo das famílias e da classe média tem marcado o discurso do CDS. Ainda na véspera do Conselho de Ministros, o ministro Pedro Mota Soares antecipou o quadro da reforma do IRS, dizendo que “deverá ficar mais simples, valorizar mais o trabalho, privilegiar a família e a dimensão familiar”
O comunicado oficial, divulgado no final do encontro, refrere apenas que "o Conselho de Ministros aprovou a proposta de lei do Orçamento do Estado para 2015". E ainda que "foram também aprovadas as Grandes Opções do Plano para 2015, após a devida consideração sobre as observações constantes do parecer do Conselho Económico e Social".
Notícia actualizada às 8 horas, com comunicado do Conselho de Ministros.