Manuel Rodrigues, o guionista do Orçamento

É discreto, mas é uma das pessoas que o primeiro-ministro ouve sobre Finanças Públicas e foi o autor do guião do Orçamento do Estado que o PSD usou para um road show aos militantes. Manuel Rodrigues, 34 anos, é o secretário de Estado das Finanças e um dos mais jovens membros do Governo.

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José manuel Rodrigues, segundo a partir da esquerda, na tomada de posse da passada semana Enric Vives-Rubio

Na universidade, Manuel Rodrigues já era aplicado. “Ajudava os outros, ensinava e emprestava os apontamentos porque ia às aulas todas”, conta Miguel Pinto Luz, actual presidente da distrital de Lisboa do PSD, amigo do agora secretário de Estado das Finanças.Manuel Rodrigues entrou na JSD de Cascais – de onde é natural - por volta dos 18 anos na mesma altura que Miguel Pinto Luz. Fizeram o percurso político lado a lado, estudaram ambos no Instituto Superior Técnico, tornaram-se companheiros. “Sempre foi um aluno brilhante”, descreve Pinto Luz. O currículo não deixa margem para dúvidas e catapultou-o para o topo do PSD.

É licenciado em Engenharia Civil, mas toda a formação posterior incide na área económico-financeira. É doutorado pela Cranfield University School of Management, é mestre em Gestão de Empresas pelo IESE - Business School da Universidade de Navarra, Espanha, uma escola da Opus Dei, onde deu aulas. Lecionou Finanças na congénere portuguesa – a AESE, também pertencente à instituição da Igreja Católica.

Nas últimas semanas, têm surgido notícias na Visão que dão conta de que o seu chefe de gabinete e o seu adjunto são antigos alunos da mesma instituição e com ligações a uma empresa angolana de um filho do Presidente José Eduardo dos Santos.

No seu currículo académico não falta um MBA nos Estados Unidos e uma pós-graduação em fiscalidade pelo ISCTE. No percurso profissional foi director-geral da Naves, uma sociedade de capital de risco, e consultor na área de estratégia nos escritórios de Madrid na Boston Consulting Group, entre outras empresas. É católico, casado (não tem filhos) e não tem hobbys conhecidos. A não ser correr ao fim de semana ou quando pode. São as inconfidências de alguns amigos, já que Manuel Rodrigues não quis de si próprio ao PÚBLICO.

Quando Passos Coelho chega à liderança do PSD, em Março de 2010, a nova equipa precisava uma pessoa que soubesse de finanças públicas. Manuel Rodrigues foi identificado como um jovem com potencial nessa área. Quem o recomendou ao então líder em ascensão do PSD, Passos Coelho, foi Carlos Carreiras, presidente da Câmara de Cascais. “O Manuel Rodrigues faz parte de um grupo de jovens que tem uma consciência cívica bem apurada acompanhada de uma componente técnica”, diz Carreiras, actual vice-presidente do PSD.

O domínio da área das Finanças permite tornar-se vice-presidente do partido, por escolha pessoal de Passos Coelho. Ganha maior visibilidade quando em Outubro de 2010, integra, juntamente com o agora comissário europeu Carlos Moedas, a equipa liderada pelo ex-ministro das Finanças Eduardo Catroga para negociar com o PS a proposta de Orçamento de Estado para 2011. Seria o último do governo sem maioria de José Sócrates e do ministro Teixeira dos Santos. 

Eduardo Catroga, que imortalizou com uma foto no seu telemóvel o acordo alcançado, ficou bem impressionado: “Inteligência e capacidade de trabalho. Não me surpreendeu que fosse mais tarde chamado para o Governo”.

Ainda antes de integrar o Executivo de Passos Coelho, o que só viria a acontecer em Outubro de 2012, Manuel Rodrigues ainda haveria de integrar a equipa que preparou o programa eleitoral de 2011 e a que negociou com o CDS o programa de Governo, já depois das eleições legislativas.Nessas negociações, haveria de se cruzar de novo com Eduardo Catroga. O ex-ministro de Cavaco Silva apreciou o estilo: “É um homem de economia real, com sensibilidade política e social. É uma pessoa minuciosa, que gosta do detalhe. Não é um técnico de ideias gerais”.

A economia real terá sido apreendida na colaboração na empresa do pai, do ramo imobiliário. Outra pessoa da sua geração, o deputado do PSD Ricardo Leite, também de Cascais, assegura que a personalidade de Manuel Rodrigues reflecte a fiabilidade das suas análises financeiras: “É uma pessoa altamente racional e ponderada”.

A intensidade com que estuda os dossiers é reconhecida por todos. Já o mesmo não se pode dizer da sensibilidade política. “Faltava-lhe perceber que, às vezes, as medidas não são só técnicas, são políticas. Ele queria perceber até ao fim a bondade da medida e não percebia o valor político”, relata uma fonte que participou numa das rondas negociais.

Carlos Carreiras discorda. “Falta-lhe política? Se olhar para o universo político, falta-lhe a componente técnica. Ele tem a capacidade. Porventura, os soundbytes são coisa do passado. Não é um político dos tempos antigos mas será um político dos tempos modernos”, aponta o autarca de Cascais. Certo é que o primeiro-ministro “ouve-o”.

E publicamente, pelo menos numa das sessões do PSD sobre o Orçamento, Passos Coelho qualificou a apresentação como “belíssima”. Desde os tempos da jota nunca se candidatou a presidente de uma secção, de uma concelhia ou distrital, excepção feita a um lugar não elegível para vereador na Câmara de Cascais.

A política executiva acabaria por experimentar como governante. E herdou logo um dos dossiers sensíveis do Governo – o das privatizações. Foi pelas suas mãos que passou a alienação dos CTT e da ANA, por exemplo.

Os mais próximos recusam colocar um rótulo no seu pensamento ideológico. É um liberal? “Isso está muito em discussão geograficamente. Um social-democrata do Sul da Europa não é igual a um do Norte”, afirma Carlos Carreiras, que se coloca na “ala esquerda do PSD”. “Se pensarmos que a social-democracia tem que gerar riqueza para distribuir e se sustenta na separação entre Estado e economia, ele é um social-democrata. Se no ADN do PSD está uma componente humanista, reformista e de algum inconformismo, ele é humanista, reformista e inconformado. Está alinhado na lógica social-democrata”, atesta o dirigente.

Eduardo Catroga diz não gostar de atribuir esses rótulos: “Esses carimbos estão cada vez mais fora de moda. É um homem que acredita na economia privada, na função reguladora do Estado e no investimento no sector produtivo”.

Como escolha pessoal de Passos Coelho, Manuel Rodrigues entrou para o Governo numa mini-remodelação que separou as pastas do Tesouro e das Finanças. Assim que assumiu a secretaria de Estado das Finanças, fez questão de deixar a vice-presidência no partido. Para não acumular funções. Uma atitude que, para Miguel Pinto Luz, mostra a seriedade de Manuel Rodrigues.

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