Madeira retém ilegalmente 18 milhões de receitas consignadas ao Estado

Após a regionalização das competências administrativas dos registos e notariado, o executivo comprometeu-se a entregar ao Governo central 30% da receita emolumentar ilíquida cobrada.

Foto
Madeira é acusada de reter ilegalmente receitas do Estado Adriano Miranda

O Governo Regional da Madeira reteve ilegalmente, entre 2004 e 2011, mais de 18 milhões de euros de parte de receitas cobradas pelos cartórios e conservatórias no arquipélago e que eram consignadas ao Estado, apurou o Tribunal de Contas (TC).

No relatório de uma auditoria realizada pela secção regional da Madeira do TC à Direcção Regional da Administração da Justiça (DRAJ), divulgado nesta quarta-feira, o tribunal recomenda que a região "cumpra a obrigação de entrega (de preferência mensalmente), ao Governo Central, de 30% da receita emolumentar ilíquida cobrada" pelos serviços externos. 

Para reter ilegalmente uma parte das receitas consignadas ao Estado, que foram cobradas pelos cartórios e conservatórias dependentes da DRAJ, no montante global de 18,1 milhões, o Governo madeirense justificou que a região "tinha receitas a receber do Estado que ainda não tinham sido transferidas e que aguardavam certificação por parte das autoridades nacionais". Por isso, o TC recomenda também que o Governo Regional diligencie, no âmbito do grupo de trabalho com o Estado, a forma de regularização das importâncias em atraso e que a Secretaria Regional do Plano e Finanças "promova a alteração da forma de contabilização da parcela das receitas pertencentes aos serviços do Estado atendendo à sua natureza e que acautele a forma de integração nas contas regionais das mesmas".

Por força da abertura ilegal de créditos especiais nos orçamentos de 2009, 2010 e 2011, a receita orçamental registada nas contas da região desses anos, na rubrica "Taxas diversas" (nos montantes de 15 milhões de euros, 16,6 milhões e 18,1 milhões, respectivamente), encontra-se sobreavaliada. A autorização ilegal da transformação de receitas extraorçamentais em receitas orçamentais – no montante global de 18,1291 milhões, em que 16,6 milhões assumiram a forma de créditos especiais nos orçamentos regionais de 2009, 2010 e 2011 – configura, segundo o TC, uma infracção financeira punível por lei, mas o seu responsável, o secretário regional das Finanças, ficou ilibado por, alegadamente, ter agido em conformidade com as informações prestadas pelos serviços que tutela.

Pela abertura ilegal de créditos especiais e afectação ilegal à receita orçamental da região de receitas consignadas ao Estado, no montante global de 18 milhões, incorrem eventuais responsabilidades financeiras o director regional de Orçamento e Contabilidade, Ricardo Gouveia Rodrigues; a directora de Serviços do Orçamento e da Conta, Dulce Veloza; o chefe de Divisão da Receita, Carlos Faria; e o director regional do Tesouro, Rui Gonçalves. A mesma sanção poderá vir a ser aplicada ao director regional de Administração de Justiça, Jorge Freitas, e à directora de serviços, Griselda Pinto, pela não entrega das verbas do Cartão do Cidadão às entidades nacionais.

O decreto-lei n.º 247/2003, de 8 de Outubro, consagrou a transferência para a Madeira das atribuições e competências administrativas da Direcção-Geral dos Registos e Notariado, passando os poderes de direcção, orientação e tutela destes serviços externos a estar cometidos ao Governo Regional. Neste âmbito, foi transferida para o executivo madeirense a gestão dos bens existentes na região e foram integrados no património regional os bens propriedade do Estado que se encontravam afectos aos serviços regionalizados. 

Em termos financeiros, o Governo Regional ficou com a responsabilidade de gerir e administrar todas as receitas e despesas provenientes da actividade dos serviços regionais dos registos e notariado, tendo, no entanto, que entregar ao "Governo central 30% da receita emolumentar ilíquida cobrada" por esses serviços, "a título de compensação pelas competências asseguradas pelo Ministério da Justiça, os quais revertem para o Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial da Justiça".

De acordo com o decreto-lei n.º 247/2003, todos os actos praticados nos serviços de registo e notariado estão sujeitos a tributação emolumentar, estando obrigados ao pagamento de emolumentos o Estado, as regiões autónomas, as autarquias locais, os fundos e serviços autónomos, as entidades que integram o sector empresarial do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais e as pessoas singulares ou colectivas de direito privado, independentemente da sua forma jurídica. Da receita ilíquida cobrada, 30% pertencem ao Estado, não podendo, por conseguinte, ser administrados por outras entidades.

Sugerir correcção
Comentar