Guterres admite dificuldades na candidatura a secretário-geral da ONU

Antigo alto-comissário para os Refugiados manifesta tristeza e frustração por uma Europa sem liderança política.

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Cavaco Silva desejou que António Guterres possa ser eleito secretário-geral da ONU Enric Vives-Rubio
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António Guterres admitiu esta terça-feira dificuldades para a sua candidatura a secretário-geral da ONU. O antigo primeiro-ministro e até Dezembro passado alto-comissário para os Refugiados das Nações Unidas falava no Palácio de Belém depois de ter sido condecorado pelo Presidente da República com a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade.

“Estou disponível por fazer algo mais, por isso decidi aceitar o convite do Governo português para a candidatura de secretário-geral da ONU”, disse Guterres. “É difícil”, admitiu, referindo-se às questões geográficas e de género – a preferência por uma candidatura vinda do Leste da Europa que seja protagonizada por uma mulher.

Em liça vão estar as candidaturas das búlgaras Kristalina Georgieva, vice-presidente da Comissão Europeia, e Irina Bokova, directora-geral da UNESCO. E também Vesna Pusié, chefe da diplomacia da Croácia. Como o PÚBLICO revelou em anterior edição, a diplomacia portuguesa já assegurou que a candidatura de Guterres não terá o veto dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança – França, Reino Unido, Rússia, China e Estados Unidos.

Segundo o mecanismo eleitoral, é o Conselho de Segurança que propõe a candidatura à Assembleia Geral da ONU. Pelo que é a montante da assembleia que as candidaturas ganham corpo definitivo para, a 1 de Janeiro do próximo ano, haver um substituto do actual secretário-geral das Nações Unidas, o sul-coreano Ban Ki-moon. Se o calendário é apertado, há a consciência de que a escolha do novo secretário-geral está pendente do clima de relações da Rússia com os seus parceiros ocidentais do Conselho de Segurança, nomeadamente os Estados Unidos e o Reino Unido.

Falta de liderança na UE
Contudo, o que mais preocupa António Guterres não é a sua candidatura, mas a experiência recente de dez anos e meio à frente da ACNUR, a agência das Nações Unidas para os Refugiados. “Há uma grande desilusão, sempre fui um europeísta convicto, a Europa tem de se unir e organizar em relação aos refugiados, [o que se está a passar] é uma fonte de grande tristeza e frustração”, sublinhou.

“Na Europa, e também em Portugal, há generosidade, há exemplos admiráveis de generosidade, a Europa não é egoísta e deu contributos importantes, mas hoje as lideranças políticas não foram capazes de unir a Europa, permitindo um ambiente de caos e contribuindo para as portas fechadas de alguns Estados aos refugiados”, lamentou.

Esta situação fora retratada, momentos antes, no discurso de agradecimento pela Grã-Cruz da Ordem da Liberdade, quando António Guterres se referiu “ao mundo paradoxal em que vivemos”. Coexistem progressos tecnológicos com limitações à liberdade “com consequências trágicas”, destacou.

Referindo-se às realidades que conheceu em países do Médio Oriente e do Norte de África, Guterres assinalou que em alguns Estados não existia sociedade civil. “As lealdades são tribais e religiosas, com consequências trágicas”, relatou na sala dos embaixadores do Palácio de Belém perante o Presidente da República e umas dezenas de convidados. Entre eles estavam familiares, mulher, sogros, enteado e sobrinho, e o primeiro-ministro, António Costa, o chefe da diplomacia, Augusto Santos Silva, o presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, o padre Vítor Melícias, Manuela Ferreira Leite, Guilherme de Oliveira Martins, Artur Santos Silva, da Fundação Gulbenkian, Edite Estrela e Jorge Coelho. O PSD, CDS, PCP e Bloco de Esquerda não se fizeram representar.

“Nestes dez anos, fiz o melhor que pude para ajudar os mais fragilizados”, referiu António Guterres, abordando a sua acção como alto-comissário da ACNUR. “Durante estes dez anos, muitos portugueses tiveram dificuldades, desemprego devido à crise económica, mas o Portugal de hoje é muito diferente do de antes da Revolução”, disse. “Portugal é um espaço de paz e coesão social e sem o 25 de Abril não havia Ordem da Liberdade”, assinalou.

Por seu lado, Cavaco Silva destacou o trabalho de António Guterres na ACNUR “reconhecido como de muita qualidade pela comunidade internacional, demonstrando uma grande capacidade de liderança e competência”.

“Durante o seu mandato as actividades da ACNUR triplicaram, aumentaram as fontes de financiamento e foram feitas reformas importantes, deixando um legado nas Nações Unidas e sendo uma voz respeitada e ouvida em todo o mundo”, destacou o Presidente da República.

Cavaco referiu-se ainda ao novo desafio, a candidatura a secretário-geral da ONU. “Tem o perfil, experiência e conhecimento para desempenhar o mais alto cargo das Nações Unidas. Esperamos e desejamos que seja reconhecido. Tem o apoio generalizado de todos os portugueses”, declarou.

Ainda esta terça-feira, em comunicado, a comissão permanente do PSD manifestou apoio à candidatura de Guterres. Na passada semana, Paulo Portas, líder do CDS, já manifestara o seu apoio a António Guterres.

"O engenheiro António Guterres não apenas foi primeiro-ministro de Portugal como acumulou uma experiência ímpar em termos internacionais na qualidade de Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados. De facto, é reconhecido internacionalmente como tendo sido um dos mais competentes e efetivos líderes do ACNUR, onde desenvolveu um trabalho permanente de apoio humanitário e de antecipação e sensibilização para os fenómenos causadores de migrações em todo o mundo.", salienta o PSD em nota enviada às redacções.

 

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