Governar sem maioria? Em São João da Madeira não resultou

PSD renunciou em bloco ao mandato e eleições intercalares estão marcadas para 24 de Janeiro.

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Adriano Miranda

São João da Madeira voltará às urnas a 24 de Janeiro de 2016. Será que o município mais pequeno do país, em termos de área, está a antecipar o que se passará no país? Há quem diga que sim, há quem diga que não. Nas autárquicas de 2013, o PSD venceu as eleições, mas perdeu a maioria. O PS ganhou terreno e pela primeira vez um movimento independente elegeu um vereador. Dois anos depois, o verniz estalou no executivo com três elementos do PSD, três do PS e um elemento independente. A 26 de Outubro, o presidente da câmara, Ricardo Figueiredo, anunciou a renúncia ao mandato de todos os elementos da lista do PSD, alegando “bloqueios constantes e sucessivos” da oposição – que, contudo, tem rejeitado as críticas e acusado o autarca de fugir às responsabilidades e de não saber governar em minoria.

Ricardo Figueiredo, que voltará a ser cabeça de lista pelo PSD, diz que São João da Madeira está “uns passos à frente do que se está a passar no país”. Recusa que haja aqui qualquer contaminação ou estilhaços provocados pelo actual enquadramento político nacional. Mas encontra semelhanças. “Quem perdeu as eleições não aceita que as perdeu. É o que se passa há dois anos em São João da Madeira”. Há mais pontos de contacto. “Quem perdeu as eleições fez de conta que estava a negociar quando, na verdade, não queria levar um entendimento a bom porto”. Em São João da Madeira, depois das eleições, tentou-se um acordo de governabilidade. Em vão. “O PS queria dois vereadores com pelouros e nas matérias atribuídas queria total autonomia financeira e política para decidir como quisesse, nos restantes queria total liberdade política para votar como entendesse”. “Houve falta de interesse em atingir um entendimento e a negociação passou a ser um mero cumprimento de um procedimento”, comenta Ricardo Figueiredo, acrescentando que a oposição “preferiu estrategicamente ficar na oposição a bloquear a acção da câmara em vez de ter um papel construtivo”. O autarca defende que a situação não podia continuar e a câmara caiu. Em termos nacionais, parece-lhe “uma inevitabilidade” a marcação de eleições. 

“A Constituição permite que a oposição possa ter maioria e aproveita-se esta ‘imperfeição’ da Constituição para bloquear a câmara. A democracia prevê um mecanismo para desbloquear esta situação e entendemos que o mais sensato seria dar novamente a voz aos são-joanenses”. Há mais semelhanças. O presidente da Assembleia da República não é do partido mais votado. Na assembleia municipal são-joanense, o PSD ganhou as eleições com maioria relativa e o presidente eleito era do PS – Josias Gil que ocupou o cargo até falecer em Fevereiro deste ano, tendo sido eleito um novo presidente do PSD. Luís Ferreira, vereador do PS, tem outra visão e não encontra semelhanças. “O PSD e o CDS querem tentar governar em minoria, em São João da Madeira é precisamente o contrário. O PSD não sabe governar em minoria e decide provocar eleições”, afirma, assegurando que o PS está de consciência tranquila por ter “criado todas as condições de governabilidade” – e a autonomia que pediu na atribuição de pelouros era numa perspectiva de “respeito pelo que estava no plano e orçamento”, ou seja, num “quadro de consenso”.

Com eleições intercalares marcadas, o socialista faz várias perguntas. “E se os resultados eleitorais forem semelhantes? O presidente vai-se embora? Abandona a câmara? Há eleições outra vez?”. Para Luís Ferreira, a “tese de bloqueio é um mito, o único problema que havia na cidade era o presidente da câmara”.

Jorge Lima, vereador eleito pelo Movimento Independente São João da Madeira Sempre, novamente cabeça de lista, não esconde a ambição. “Vamos concorrer para ganhar”. Já apresentou oito compromissos datados e admite as vantagens de ser independente. Defender os superiores interesses da população sem amarras a um partido é uma delas. Lima faz comparações entre o nível local e o nacional num ponto “intrigante”. “Vejo um primeiro-ministro preocupado em cumprir as regras da democracia e que quer governar sem ter maioria e vejo um ex-presidente renunciante que alega que para governar tem de ter maioria”. “Não cabe nos livros de política renunciar porque não se tem maioria”, conclui.  

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