Estado "tem que controlar a banca" e "não pode confiar" nos reguladores

Jerónimo de Sousa insistiu, em entrevista à SIC, que quer que o próximo Governo estude e prepare a saída do euro.

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Nuno Ferreira Santos

Jerónimo de Sousa quer o Estado a controlar a banca, seja através de nacionalização ou por uma monitorização mais apertada do que a que fazem os actuais reguladores – até porque, argumenta, “não se pode confiar outra vez nos que foram responsáveis por situações como as do BPN, BPP e Novo Banco”.

Numa curta entrevista de 20 minutos no Jornal da Noite, na SIC, o líder comunista e primeira figura da CDU, a coligação com o Partido Ecologista Os Verdes, admitiu que não confia nem no BCE [Banco Central Europeu] nem no Banco de Portugal porque “a supervisão falhou rotundamente”. Daí essa necessidade de ter a banca sob controlo estatal, como o PCP tem vindo a defender há alguns anos e que faz constar no seu programa eleitoral.

“O dinheiro é um bem público e por tudo o que aconteceu no sector financeiro, exige-se esse controlo. O Estado tem a obrigação de ter esse controlo público tendo em conta os investimentos de milhares de milhões de euros que fez na banca”, defendeu. “Isso pode não significar a nacionalização tout court”, insistiu, mas a solução é dar um “papel determinante” sobre o sector, acrescentou.

Questionado sobre como se financiam as propostas da CDU como o aumento do salário mínimo, a descida de impostos para trabalhadores e pequenas e médias empresas, a redução do IVA, a eliminação da sobretaxa ou o abono de família universal, Jerónimo de Sousa respondeu com a necessidade de ter Portugal a produzir mais. Mas para isso é preciso investir, lembrou a jornalista Clara de Sousa. E para isso é também preciso dinheiro. Que viria da reestruturação da dívida, apontou o líder comunista, que “libertaria milhares de milhões de euros, nove mil milhões só no próximo ano, directamente direccionados para o investimento”.

Seria um processo dirigido pelo Governo, através de uma conferência intergovernamental com países na mesma situação – Irlanda, Espanha, Grécia, Itália. “Há uns anos falar disto era uma blasfémia. Todos consideravam um tabu intocável. Agora já está em cima da mesa”, realçou Jerónimo, garantindo, porém, que não defende uma reestruturação como a da Grécia.

A par deste processo, a CDU quer que o futuro executivo estude e prepare a saída do euro. Esta não pode ser um “acto súbito”, mas o país “corre o risco de ser expulso”. Por isso, há que medir as “consequências para saber se Portugal tem ou não possibilidade de se desenvolver sem estar amarrado à moeda única ou se existe uma alternativa”. Jerónimo admite que “nessa preparação até se pode concluir que não [há alternativa]”, mas não o estudar é uma “irresponsabilidade”. “Não vi, nos países que não aderiram ao euro, nenhuma desgraça”, afiança o líder comunista.

À reestruturação da dívida – um corte no seu valor nominal, nos juros e nos prazos, como descreveu em entrevista ao PÚBLICO -, Jerónimo de Sousa junta uma nova política fiscal, combatendo a fraude e a evasão. “Carregar mais em quem tem mais e aliviar quem tem menos” – é o conceito-chave e o líder do PCP não receia que as grandes fortunas, acossadas por altos impostos, ponham o dinheiro no estrangeiro, como aconteceu em França.

“Alguém acredita que os detentores da EDP, CTT, ANA se iam embora por causa de uma taxa do IRC? Não acredito. Eles estão a ganhar milhões e milhões em dividendos e lucros, aquilo foi servido à mesa”, criticou. “Estamos a falar dos grandes grupos económicos, eles não largam o bife de certeza. E do lombo”, ironizou.

Às propostas da CDU de relançar as grandes obras como o TGV, novo aeroporto de Alcochete, ou a nova ponte sobre o Tejo, Jerónimo admitiu que o país não tem condições para elas neste momento. “Ninguém duvide que num quadro de desenvolvimento económico e de relacionamento com a Europa, se não o fizermos seremos ultrapassados. Mas não significa que sejam prioridades e urgências. Somos um partido responsável”, afirmou.

Jerónimo de Sousa recusou que, ao defender a saída de Portugal da NATO, queira isolar Portugal e justificou com a natureza anti-belicista da Constituição, que diz que Portugal defende a dissolução dos blocos político-militares existentes no mundo.

Questionado sobre se ainda faz sentido ser comunista no século XXI, Jerónimo considerou que faz “mais do que nunca” porque “o mundo não ficou melhor, mas sim mais perigoso e mais desequilibrado” com as derrotas do socialismo. E recusou que o PCP tenha como modelos os partidos comunistas do Vietname, Laos e Coreia do Norte. O PCP português “será em conformidade com a vontade dos portugueses, sem nenhuma referência de modelo, mais acima ou mais ao lado”.

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