Costa enaltece entendimento entre Hollande e Merkel para manter Grécia no euro

Líder do PS saúda acordo e diz ao PÚBLICO que foi afastado o “discurso dos falcões”. Passos Coelho reclama para si ideia que desbloqueou impasse nas negociações.

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António Costa e François Hollande na minicimeira dos Socialistas Europeus DR

António Costa, que esteve presente na reunião dos líderes socialistas realizada antes da cimeira de domingo, salientou ao PÚBLICO a importância do acordo alcançado com a Grécia por ter permitido que se mantivesse o entendimento entre o Presidente Hollande e a chanceler Merkel. Passos Coelho reclamou os louros de ter contribuído para desbloquear o impasse com Atenas.

Tanto o PS como a maioria PSD/CDS saúdam o acordo com o primeiro-ministro grego, Alex Tsipras. Foi um acordo importante, porque, por um lado, “a chanceler [Angela Merkel] não quebrou o seu entendimento com François Hollande para encontrar uma solução”, disse ao PÚBLICO o secretário-geral do PS, que foi convidado a participar na cimeira dos líderes socialistas europeus, em Bruxelas. Neste encontro, que antecedeu a cimeira dos líderes da zona euro, estiveram Martim Schulz, presidente do Parlamento Europeu, e Sigmar Gabriel, vice chanceler alemão, além do próprio Presidente francês François Hollande e o primeiro-ministro italiano Matteo Renzi.

O líder do PS referiu que foi afastado o “discurso dos falcões”, liderado por Wolfgang Schäuble, ministro alemão das Finanças. “Essa era a maior preocupação de Hollande, manter a chanceler com ele”, disse. António Costa demarca-se da estratégia do Governo grego que não se revelou “particularmente positiva, antes pelo contrário”.  

O líder do PS considera que é preciso aceitar que o Tratado Orçamental existe e que a dívida não é para ser reestruturada. “O que é preciso é contornar esses dois pontos de bloqueio para defender uma estratégia que assente na necessidade de promover a convergência económica, através da melhoria da competitividade”, defende António Costa, lembrando que isto não significa “a mesma cartilha para todos”, mas sim um conjunto de programas e de reformas adaptado em cada país e “contratualizadas com Bruxelas”.

Se o PS salienta o contributo dos socialistas europeus para o acordo, o primeiro-ministro português reclama mesmo para si parte do acordo final. “Devo dizer até que, curiosamente, a solução que acabou por desbloquear o último problema que estava em aberto, que era justamente a solução quanto à utilização do fundo [de privatizações], partiu de uma ideia que eu próprio sugeri. Quer dizer que até tivemos, por acaso, uma intervenção que ajudou a desbloquear o problema”, revelou Passos Coelho, numa conferência de imprensa no final da cimeira da zona euro.

Segundo Passos Coelho, foi Portugal que sugeriu que, do valor de 50 mil milhões de euros do fundo, “25 mil milhões pudessem ser utilizados para, de certa maneira, poder privatizar os bancos que estão agora a ser recapitalizados" e que, "acima desse valor, se pudesse então fazer uma utilização quer para abater à divida publica, quer para se poder financiar o crescimento, em partes iguais”.

“Foi justamente uma ideia que eu sugeri e que verifico que acabou por ser utilizada pelos negociadores com o primeiro-ministro grego”, disse.

Sem uma mensagem de triunfalismo, os partidos da maioria PSD e CDS convergem na posição de que o acordo, como princípio, é positivo, independentemente do teor do texto. O discurso da maioria acentua a necessidade de a Grécia cumprir as regras da moeda única para se manter na União Europeia. E de não sobrevalorizar a democracia ateniense em detrimento das outras. “Os gregos cometeram um erro. É que há outros 18 Estados que também têm de prestar contas aos seus parlamentos e aos seus eleitores”, salienta António Rodrigues, deputado social-democrata e coordenador na comissão de Assuntos Europeus. O desfecho da crise, com este acordo, “mostrou a força do projecto europeu” e a “vontade política em continuar o projecto europeu”, já que se conseguiram “respostas suficientes para um Estado-membro em profundíssimas dificuldades”.

O desfecho da crise significa que são inviáveis políticas do centro-esquerda? “Estas questões não podem ser vistas do ponto de vista ideológico”, responde Diogo Feio, vice-presidente do CDS-PP, lembrando que o Governo da Eslováquia, que pertence à família dos socialistas, teve uma posição “radical” contra a Grécia. Mas os que viram a vitória do Syriza como “ventos de mudança” – entre os quais o centrista inclui o PS – percebem que “soluções desse género não têm viabilidade”. Fica mais forte o discurso da austeridade. “Se Portugal não tivesse cumprido, não teria as perspectivas que tem hoje e dificilmente seria confiável para os investidores. Foi necessário fazer o que fizemos para hoje haver esperança. Essa é a grande lição”, observa o ex-líder da bancada do CDS.

A palavra confiança repete-se no discurso da actual maioria. Onde os partidos mais à esquerda vêem uma posição de alinhamento com a Alemanha, os partidos da maioria reclamam uma posição solidária com a Grécia. “Portugal empenhou-se na solução da Grécia e até na solução final”, refere António Rodrigues, sustentando que “não se pode acusar a Europa de falta de solidariedade”. “A Europa fez o possível e o impossível para tentar chegar a um acordo”, defende o deputado social-democrata. Já Diogo Feio não deixa de fazer um reparo à lentidão de todo o processo negocial, defendendo que “os procedimentos têm de ser mais rápidos”. E adverte para o crescimento dos extremismos na Europa que irão desenvolver-se com “processos demorados e extremados como este”.

Europa "de punição" e "divisão"
Noutro tom, a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, também pede uma “reflexão muito séria sobre o projecto europeu”. É que esta Europa é de “punição” de quem “ousa não querer seguir a bitola da Alemanha”. O desfecho do acordo – que o BE considera ser uma “imposição” - acaba por ser um “golpe de Estado” e varre a democracia para dar lugar a “imposições do estilo colonialista”.

Escusando-se a dizer se o primeiro-ministro grego devia ter recusado ou não o texto final, a bloquista criticou a posição do Executivo português “por ser o único de um país do Sul da Europa que não se opôs a uma eventual saída do euro da Grécia, quando todos perceberam que essa chantagem não deveria ser posta em cima da mesa”.

As palavras imposição e chantagem também estão reflectidas na mensagem do PCP, quando questionado sobre se este entendimento significa uma Europa mais coesa. “Quando se espezinham direitos sociais, laborais, democráticos e de soberania não se pode falar de coesão, mas pelo contrário de divisão e de injustiça”, lê-se numa resposta do partido a perguntas enviadas pelo PÚBLICO.

Relativamente às implicações que o acordo terá para Portugal, os comunistas assumem que é preciso “fortalecer a luta contra as medidas que visam intensificar a exploração e o empobrecimento” e as que “atacam cada vez mais a democracia e a soberania”. Com este cenário, o PCP conclui ter “toda a razão” ao defender o estudo e a preparação do país para a saída da zona euro.

A punição dos que não alinham com a Alemanha é também a tónica da reacção da candidatura Livre/Tempo de Avançar. Em comunicado, o movimento sustenta que “o Governo alemão e a liderança da zona euro quiseram enviar uma mensagem a todos os povos da Europa: toda a dissidência será castigada”.

Manifestando solidariedade em relação às escolhas do povo grego, o Livre/Tempo de Avançar alerta para o “risco de desintegração europeia que a brutalidade exercida pode gerar”.

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