Costa, António

É de presumir que António Costa se dê conta que esta disputa se realizou no perímetro da sua base eleitoral, representando o equivalente a uma amostra de conveniência do universo eleitoral do país.

Conhecida a escolha dos militantes e de simpatizantes do Partido Socialista para candidato a primeiro-ministro nas próximas eleições legislativas, é tempo de se regressar à discussão sobre a melhor solução alternativa para derrotar não só este Governo e a fórmula com que a direita se vai apresentar a essas eleições, mas sobretudo as medidas que prioritariamente devem ser tomadas e os actores político-partidários que estão em melhores condições para as aplicar.

Interessa, no entanto, enquadrar o ambiente político-partidário com que António Costa vai ter de lidar para afirmar a sua liderança. O processo de uma eleição com as características que dominaram estas primárias, ao reforçar e fortalecer a legitimidade do resultado obtido pela parte vencedora, não deixou de exigir uma fulanização no confronto com o seu opositor, que, sendo benéfica no plano da exposição mediática, aumentou consideravelmente as expectativas sobre o desempenho político de quem passou a ser o candidato do Partido Socialista a primeiro-ministro. Por isso, para uma disputa eleitoral que tem em vista eleger deputados suficientes para se estar em condições de constituir uma solução governativa, apesar da sua expressiva vitória sobre António José Seguro e do previsível apaziguamento que se seguirá da vida partidária, é de presumir que António Costa se dê conta, e dela retire as devidas lições, que esta disputa se realizou no perímetro da sua base eleitoral, representando o equivalente a uma amostra de conveniência do universo eleitoral do país.

Passada esta espécie de prólogo, o que se segue vai exigir de António Costa a descodificação do que foi possível detectar no subtexto dos seus discursos de campanha. Se se eliminar dos seus objectivos a obtenção de uma maioria absoluta, compreensível enquanto ambição mas muito problemática dados os elevados graus de desconfiança do eleitorado com o desempenho dos partidos políticos que têm governado o país, a sua agenda política fica preenchida com os dois assuntos que mais interessam aos portugueses. O primeiro, que precede qualquer consideração sobre o segundo e o vai condicionar decisivamente, é o programa de Governo. E nele interessa conhecer que medidas conjunturais vão ser tomadas para atalhar os efeitos da austeridade e como vai intervir na estrutura produtiva do país para aumentar a riqueza, diminuir o desemprego e reduzir as desigualdades. Ter um pensamento estratégico para ser desenvolvido em dez anos é louvável, mas existem prioridades que os portugueses vão querer ver satisfeitas no imediato e sem as quais não há longo prazo que resista.

O segundo aspecto está relacionado com o sistema de alianças, o qual não deve ser entendido como um exercício de boas vontades mas de um processo intenso e exigente de negociação de políticas concretas. Tomando como boa a hipótese de trabalho de que a liderança da maioria que actualmente governa evoluirá para uma espécie de continuidade sem Passos Coelho, assumindo-se a sua derrota nas próximas eleições legislativas, e portanto com um programa político adaptado às circunstâncias, mas equivalente ao que vem sendo aplicado há mais de três anos, e considerando que à sua esquerda irá ter, pelo menos, os partidos políticos que disputaram as eleições para o Parlamento Europeu, como pensa António Costa resolver esta equação, ressalvada a retórica da sua capacidade para dialogar com todos? É que se for por esse caminho vai acabar como um certo primeiro-ministro que ficou a falar sozinho, com os resultados conhecidos. E essa experiência é desejável que não se repita.

Dirigente da Renovação Comunista

Sugerir correcção
Comentar