Cortes na TSU propostos pelo PS e Governo não ajudam a economia, avisa Louçã

A cada 1% que se corte na TSU perdem-se 400 milhões de receita e as empresas não vão usar esse dinheiro para criar emprego. Um corte de 4% exigiria uma compensação de 500 mil novos postos de trabalho.

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Miguel Manso

A justificação de que uma redução da TSU para as empresas ajudará a libertar dinheiro para que estas invistam e contratem mais trabalhadores não tem aplicação na prática. Francisco Louçã, antigo líder do Bloco de Esquerda fez as contas às intenções do Governo e do PS de cortar a TSU e chegou à conclusão de que “não serve rigorosamente para nada”.

Por cada ponto cortado na TSU perdem-se 400 milhões de euros de receita. Se a redução for de 4% [como propõe o PS] a perda de receita (e que é usada para pagar as pensões actuais) é de 1600 milhões de euros. “Fazendo as contas, para compensar estes 4%, com as suas contribuições, eram precisos 500 mil novos trabalhadores, ou seja, quase o desaparecimento do desemprego”, descreveu Louçã na conferência "O FMI, a Europa, o(s) Governo(s) e as Pensões", organizada pela APRe! - Associação de Aposentados, Pensionistas e Reformados.

E continuou: “O custo do trabalho é 25% dos custos da empresa, que paga TSU sobre um quarto desses 25%. O efeito real do corte de 4% na TSU nos custos globais é de 1%. O efeito é muito pequeno, não vai criar emprego.” Além disso, o impacto no défice é de cerca de 0,5%, mas na Segurança Social é “gigantesco” e deixa-a “mais debilitada”.

“Para que é que isto serve? Não serve rigorosamente para nada do ponto de vista da economia”, apontou o antigo líder do Bloco, que diz haver uma “agenda escondida” do Governo sobre isto. “Aumentar ou restituir as pensões é muito melhor para o desenvolvimento da economia do que cortar salários ou a TSU”, disse Louçã, para quem “a raiz do problema não é haver mais idosos e menos crianças. Tem efeito, mas o efeito determinante, e grande, é o desemprego.”

Sobre o programa do PS, Louçã critica o facto de não dizer exactamente o que pretende fazer em áreas-chave, como a Segurança Social, falando apenas em “mexer no factor de sustentabilidade", ou seja, "aumentar a idade da reforma”, na redução dos 4% na TSU e na “facilitação do despedimento”.

Já Pacheco Pereira fez uma intervenção pejada de críticas ao Governo, à comunicação social e ao PS – “os media não cumprem a sua função e a oposição fala baixinho” -, e com pinceladas num retrato que faz dos reformados “vítimas de uma forma perversa de neomalthusianismo”, como lhe chamou. E realçou nunca ter “conhecido um momento da história portuguesa em que ser velho ou ter uma certa idade fosse considerado um ónus para a sociedade” nem “nenhuma sociedade tão hostil em relação ao aumento da esperança de vida”.

“Há muito dolo, há muita incompetência e muita navegação de cabotagem” nas propostas do Governo, disse o antigo deputado social-democrata, que acrescentou à lista negra um “Estado impregnado de má-fé, de vontade de enganar”, referindo-se ao modo diferente como trata os contratos com as PPP e os que tem com os reformados, ou a interpretação “austeritária” que fez do memorando da troika.

APRe! fala em conquistas
Maria do Rosário Gama, presidente da APRe!, enlevada pela imagem da sala a abarrotar, puxou a brasa à sardinha do movimento, para dizer que apesar das “grandes malfeitorias” do Governo, as “conquistas do APRe! já foram algumas”, devido aos sucessivos recursos para o Tribunal Constitucional contra decisões do executivo.

Entre elas estão o fim da CES para a maioria dos reformados, e a contribuição de sustentabilidade que a veio substituir, a manutenção das pensões de viuvez, a não convergência da Caixa Geral de Aposentações com a Caixa Nacional de Pensões. “Foram algumas vitórias conseguidas pela nossa organização com todos os outros que intervêm no processo; mas tivemos papel muito importante porque fomos nós que trouxemos o problema das pensões e dos reformados para a comunicação social.”

A professora de Coimbra reformada apelou a duas “formas de luta” (porque não têm a da greve nem conseguem organizar grandes manifestações): participação na manifestação do 25 de Abril em Lisboa e no voto. O APRe! não fará campanha por qualquer partido, mas está a organizar a Volta Pelo Voto, com eventos pelo país para “explicar aos associados as propostas de cada partido para os reformados, mas sem dar qualquer indicação de voto”.

“O voto é uma arma”, lembrou Maria do Rosário Gama. “O importante é mobilizar as pessoas para não ficarem em casa. Não adianta nada não ir; a abstenção não conta para nada. Há sempre um Governo eleito pelos votos expressos.”

O auditório estava a abarrotar na biblioteca municipal Orlando Ribeiro, em Telheiras, cedida pelo socialista Pedro Delgado Alves, presidente da Junta de Freguesia do Lumiar. Cerca de duas centenas de meia de pensionistas e reformados encheram o espaço, sentando-se até no chão, mas várias dezenas nem conseguiram entrar. “Da próxima é no Coliseu”, prometeu Maria do Rosário Gama, que diz ao PÚBLICO que as acções do movimento são sempre assim. Não será de estranhar se se pensar na condição profissional dos simpatizantes. Esta quarta-feira à tarde, em Braga deverá repetir-se o cenário e o programa conta só com a presidente. Em Telheiras, bairro com alto poder de compra, havia folhas pelas paredes e postes a anunciar o encontro.

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