Conselho das Finanças Públicas recusa-se a avaliar programas dos partidos

Aos conselhos de finanças públicas compete “contribuir para melhorar a qualidade da informação à disposição dos eleitores de forma objectiva”, mas “excluindo interpretações de base ideológica”, defende Teodora Cardoso.

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Liderado por Teodora Cardoso, o CFP diz que o PIB real cresceu entre 0,9% e 1% em 2014 Enric vives Rubio

O Conselho das Finanças Públicas (CFP) recusa-se a avaliar programas eleitorais de partidos políticos, alegando não ter ainda condições para tal. O órgão presidido por Teodora Cardoso respondeu assim à polémica e, ao contrário do que o PDS defendia, não vai avaliar as propostas do cenário macroeconómico do documento de 12 economistas pedido pelo PS.

A presidente do CFP explica, num documento divulgado nesta segunda-feira, que esta entidade não tem ainda as “ferramentas”, nem a “experiência” para avaliar programas políticos. Teodora Cardoso faz ainda questão de sublinhar que “convencer os eleitores a optar por uma ou outra plataforma política é prerrogativa dos políticos”.

O assunto já tinha caído por terra, quando a maioria decidiu retirar o requerimento para que a Unidade Técnica de Apoio Orçamental do Parlamento analisasse o cenário macroeconómico do PS. Mas durante vários dias a polémica manteve-se, com o PSD a defender que as medidas deviam ser avaliadas pela UTAO e pelo CFP e o PS a argumentar que a lei deixa de fora essa possibilidade.

Teodora Cardoso não deixa margem para dúvidas: “Para alguma instituição poder desempenhar na sociedade portuguesa um papel que nele se inspire na avaliação dos programas políticos, falta-lhe ainda construir uma panóplia de ferramentas adequadas, que exigem informação sólida e conhecimentos específicos, a nível macro mas também sectorial, além de experiência que só o tempo confere.”

A economista ressalva que o CFP, criado em 2011, “continuará a desenvolver os instrumentos técnicos destinados a contribuir para a avaliação de políticas”, embora a aproximação aos exemplos de outros países – Estados Unidos, Países Baixos e Reino Unido - requeira “a extensão do seu mandato”.

Os argumentos são claros quanto à questão política levantada: “Convencer os eleitores a optar por uma outra plataforma política é prerrogativa dos políticos”. Aos conselhos de finanças públicas compete “contribuir para melhorar a qualidade da informação à disposição dos eleitores de forma objectiva”, mas “excluindo interpretações de base ideológica”.

No documento intitulado Avaliação dos impactos de programas de política económica, Teodora Cardoso insiste que a opção por “um conjunto de hipóteses” ou modelo “torna-se susceptível de interpretação política, um resultado que uma instituição independente tem de evitar”. Trata-se de uma tarefa que “não faz parte dos conselhos de finanças públicas.”

A resposta ressalva, contudo, que esta “ausência de avaliação pelo CFP de programas de política económica para a legislatura não retira” relevância “à opção dos partidos políticos pela apresentação de programas que tenham em conta as condições de governação e de coerência intertemporal que irão determinar a sua exequibilidade”.

EUA, Países Baixos e Reino Unido
O documento detalha o caso de países em que existe uma avaliação e que “condições específicas” o permitem. Pelo contrário, em Portugal “não existe a tradição de avaliação do custo das políticas e só recentemente se consagrou a prática de avaliação independente da política orçamental.”

Estados Unidos, Países Baixos e Reino Unido são exemplos de países que consagram há muito tempo a avaliação por instituições independentes de programas de política económica, “em particular no respeitante ao seu impacto orçamental”, embora só nos Países Baixos e no Reino Unido exista avaliação de plataformas eleitorais.

No caso dos Estados Unidos, “o enquadramento orçamental americano reveste-se de características específicas que o diferencia fortemente das normas mais comuns à generalidade das democracias”. Nos Países Baixos, o Netherlands Bureau for Economic Policy Analysis é responsável por “estimar o andamento da economia nacional e analisar regularmente as finanças públicas holandesas” desde 1946. Desde então, “criou uma bateria de ferramentas de análise e previsão e ganhou junto da opinião do seu país uma reputação provavelmente inigualada, que levou a que, desde 1986, a maioria dos partidos concorrentes” às legislativas “solicitem o seu parecer sobre as consequências orçamentais das suas propostas eleitorais”. Ou seja, o exercício teve início 40 anos depois da criação da entidade, “quando os seus métodos, instrumentos de trabalho e reputação de independência e qualidade técnica estavam já consolidados”.

No Reino Unido, a análise das propostas eleitorais dos principais partidos é da iniciativa do Institute for Fiscal Studies, instituição privada sem fins lucrativos, fundada em 1967, com o objectivo de “informar o debate público sobre economia de modo a promover o desenvolvimento de uma política orçamental eficaz”. Porém, só desde 1997, trinta após a sua fundação, é que esta entidade publica briefings sobre vários temas das campanhas eleitorais.

Apesar de, na conclusão, a presidente do CFP admitir que estes três casos “mostram a relevância da avaliação dos programas económicos por instituições independentes e de qualidade técnica comprovada”, também deixa claro que “condicionantes” existem para que tal se concretize. Entre outras, “a idoneidade prestada à instituição pela sua prática de décadas” e a “experiência adquirida com o estudo e conhecimento em profundidade de áreas e sectores específicos afectados pelas políticas públicas”.

Além disso, Portugal tem um contexto actual particular: “A situação económica do país apresenta também especificidades próprias, que tornam a avaliação de programas de política económica para a legislatura dificilmente redutível à dimensão macro-orçamental de curto e médio prazo.”

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