Comissário europeu para quê?

A Europa só pode ser nossa se for também uma criação nossa, e não uma coisa distante que nos é imposta.

Portugal só pode ter futuro enquanto país se conseguir abrir um caminho para um crescimento mais elevado, verde e inteligente, assente em gente mais qualificada, que já tem e não deve desperdiçar. Mas o seu esforço nesse sentido só pode realmente resultar se o enquadramento europeu, que é hoje tão decisivo, mudar: a integração europeia tem de voltar a ser um projecto de convergência para melhores padrões de desenvolvimento e democracia, um projecto em que todos ganham.

É por isso que a escolha do comissário português, a concluir esta semana, é relevante.

O presidente da próxima Comissão Europeia acabou de ser eleito por uma maioria clara no Parlamento Europeu, depois de ter sido o candidato do PPE, o partido europeu mais votado durante as eleições europeias. Com um mandato com legitimidade democrática bem mais forte do que no passado, Jean-Claude Juncker tem agora o encargo de construir uma Comissão Europeia que represente mais intrinsecamente o interesse comum dos Europeus e que esteja à altura dos enormes desafios com que a Europa estará confrontada.

A União Europeia está hoje em face de tensões de desfecho imprevisível nas suas próprias fronteiras: Ucrânia e Rússia, por um lado, Israel e Palestina, Iraque e Turquia, por outro, e Norte de Africa, por fim. Os riscos de conflito intensificarão também a pulsão emigratória para a Europa, o que exige uma muito maior coordenação para a gerir e para cooperar com os países de origem, visando não só paz, mas desenvolvimento.

Mas, para responder cabalmente aos seus desafios globais e de vizinhança, a Europa não pode ter as suas energias internas consumidas por tensões sociais e políticas. Por todas as razões, a Europa vai ter que lançar com outro vigor a sua estratégia para o crescimento, e um novo tipo de crescimento em que ela pode ser pioneira – a chamada Europa 2020.

Ora, uma boa parte dos Estados-membros da UE – e o nosso é um bom exemplo – deixou de ter condições para implementar essa estratégia e reabsorver o alto desemprego, porque as condições para financiar o investimento necessário, privado e público, são hoje profundamente insuficientes e desiguais. E essas condições de financiamento só podem ser repostas se a crise da zona euro for verdadeiramente ultrapassada com a reforma que ainda falta da União Económica e Monetária, dotando-a de uma união bancária e de uma capacidade orçamental própria.

As prioridades apresentadas por Jean-Claude Juncker ao Parlamento Europeu visam responder a tudo isto e a Comissão Europeia agora em formação deveria ser composta por gente com provas dadas por lutar por elas.

É nessa perspectiva que Portugal deveria apreciar nomes para comissário europeu a propor ao presidente da Comissão Europeia, que apresentará a sua escolha em Julho para audição em Setembro e votação final em Outubro pelo Parlamento Europeu.

O que está em causa não é apenas escolher alguém com a reserva própria da escolha de um ministro ou compensar alguém pelos serviços prestados, mesmo que de grande valor. É sobretudo contribuir da melhor forma para a construção de uma entidade que deverá saber pugnar com a mais elevada competência política e técnica pelo interesse comunitário e, como tal, pelo interesse do nosso país.

É também nessa perspectiva que algum espaço para comparação ponderada de alternativas só poderia ser saudável, ajudando o Governo a fazer as melhores propostas possíveis ao presidente Jean-Claude Juncker, no sentido de conseguir para o país uma pasta relevante no quadro europeu.

O que deve ser um comissário europeu? Alguém capaz de desenhar soluções para a UE e capaz de as implementar, mobilizando todos os actores relevantes, políticos, económicos, sociais, nos vários países, e ao nível europeu e nacional.

Como no meu caso, tenho vindo a fazer isso desde 2000, para o crescimento e o emprego, para responder à crise constitucional e depois à crise da zona euro, achei que considerar o meu nome faz sentido. Mas também acho que considerar outros nomes também faz todo o sentido e só lamento que não haja mais debate sobre isso.

A Europa só pode ser nossa se for também uma criação nossa, e não uma coisa distante que nos é imposta.

Vice-presidente do Grupo S&D no Parlamento Europeu

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