Coligação e PS: duas formas de governar

A Coligação Portugal à Frente e o PS têm duas formas diversas entre si de olhar para o país e de propor soluções. O PÚBLICO comparou os dois programas e selecciona algumas das diferenças.

Foto
Pedro Passos Coelho e Paulo Portas durante a apresentação do programa da coligação Enric Vives-Rubio

Com as legislativas convocadas para 4 de Outubro, quer a coligação Portugal à Frente quer o PS preparam-se para partir para a campanha de posições diferentes. A coligação saída de dentro da maioria que é Governo parte para a batalha eleitoral na posição de quem tem obra feita e um património de governação adquirido que quer continuar. A própria palavra de ordem da campanha que a coligação escolheu é o pressuposto dessa mesma continuidade programática: “Portugal pode mais”.

O PS é o principal partido de oposição, que se assume como alternativa de Governo. Não propõe nunca a ruptura. Nem na organização económica, nem na inserção europeia. Mas claramente defende uma outra concepção sobre a organização e o papel do Estado. E as prioridades dadas por exemplo à coesão social, ao fim da precariedade e ao emprego surgem claramente no programa socialista, enquanto no da coligação a importância da economia é central. Embora a coligação lance a ideia, pouco desenvolvida contudo, de um Programa para o Desenvolvimento Social, com articulação de políticas públicas para combater a pobreza.

A diferença de propostas e de atitudes surge logo na gestão da dívida pública e da inserção de Portugal no euro. O PS assume o seu perfil europeísta e de aposta no desenvolvimento de uma União Europeia que corresponda a uma outra forma de encontrar soluções para a crise do euro. Uma posição em que o Tratado Orçamental não é revogado, mas é reinventado na sua leitura e em que a regra de ouro do défice fica fora da Constituição portuguesa. E em que a discussão da dívida pública sai do palco da mediatização política e passa a ser um problema orçamental para ser negociado com os credores nos bastidores, sem que o seu pagamento seja sequer questionado.

Já a coligação tem a posição diversa. Continua a assumir que não irá defender a renegociação da dívida, mesmo que a procure também obter nos bastidores políticos europeus. Mas em termos de programa aposta na redução da dívida como objectivo central, prometendo que esta descerá dos actuais 130% para 107% do PIB em 2019. E é peremptória na defesa de que a regra de ouro do controlo do défice orçamental em 3% e da dívida pública em 60% do PIB deve ser inscrita na Constituição.

Refira-se, neste plano, que ambas as propostas obedecem às regras impostas a Portugal enquanto país que sofreu um Programa de Assistência Económico-Financeira. Tanto que a coligação parte para as promessas eleitorais do cenário macroeconómico que estabeleceu no Plano de Estabilidade (2015-2019) entregue em Bruxelas em Abril. E o PS tem por base da sua Agenda para a Década as previsões feitas no documento elaborado pela equipa de 12 economistas liderada por Mário Centeno.

Outro domínio em que as propostas da coligação e do PS divergem é o do papel do Estado. E aqui os exemplos são inúmeros e abarcam vários domínios, começando no que é o Governo e a administração: destaca-se a reorganização que o PS propõe para o organigrama de Governo, que contrasta com a manutenção pela coligação da estrutura actual, a qual, há quatro anos, foi uma ruptura com a tradição de múltiplas pastas para um executivo de dez ministérios e 25 secretarias de Estado. Agora o PS propõe uma inovação que é a criação de áreas de governação que serão transversais a todo o Governo.

Também diferente é a visão da coligação em relação ao papel do Estado no apoio e incentivos ao desenvolvimento económico e na criação de emprego. E aqui há logo um sinal quando se olha os programas eleitorais. O PS multiplica-se em medidas dirigidas directamente ao combate ao desemprego e à precariedade, apostando mesmo em medidas de inclusão fiscal dos recibos verdes. Enquanto a coligação assume o discurso da continuidade de políticas, não deixando de apontar novos programas de acção como o “prémio de activação” para os desempregados de longa duração.

A perspectiva que cada uma das duas principais forças políticas tem do papel do Estado face à economia é diversa noutros aspectos. O PS assume claramente um papel mais interventivo nomeadamente no que é a regulação estatal ao nível das Obras Públicas, que prometem dinamizar como motor do desenvolvimento. Mas à qual querem atribuir uma nova cultura com a criação de um Conselho Superior de Obras Públicas e a aprovação de planos de obras para uma legislatura pelo Parlamento. Refira-se ainda que o PS elege a baixa da TSU dos trabalhadores como uma forma de injectar dinheiro na economia pelo lado do aumento do consumo.

Já a coligação não elege sectores que, impulsionados pelo Estado, sejam motores de desenvolvimento, mas apresenta aposta claras no que é o objectivo de tornar Portugal num país mais competitivo e mais atraente para o investimento externo. E aponta como objectivo incluir Portugal no top 20 do Doing Business do Banco Mundial e no top 25 do Global Competitiveness Report do World Economic Forum.

Para isso propõem, por exemplo, que o IRC baixe um ponto percentual por ano ao longo da legislatura, ou seja, dos actuais 21% para 17%, enquanto o PS deixa de fora do programa qualquer referência à baixa do IRC, que chegou a aceitar num acordo feito entre o Governo e o anterior secretário-geral socialista, António José Seguro. Ainda no domínio da competitividade, enquanto o PS assume que está disponível para mexer na legislação laboral, a coligação é mais contida neste domínio.

Diferentes são também as propostas quanto à reforma do sistema político, em particular do sistema eleitoral. Ambos mantêm a defesa do sistema proporcional, tal como a Constituição prevê. Mas o PS mantém a introdução de círculos uninominais de candidatura, defendidos pela primeira vez pelos socialistas há quase 20 anos, quando António Costa era ministro dos Assuntos Parlamentares de António Guterres. Enquanto a coligação defende agora o voto preferencial, que no PS foi defendido no consulado de José Sócrates – por proposta do estudo dirigido por André Freire - e também por António José Seguro. O que é novo na coligação é o facto de, neste programa eleitoral, o PSD ter cedido ao CDS e deixado cair a proposta de redução do número de deputados, que teoricamente iria prejudicar os pequenos partidos.

Sugerir correcção
Ler 31 comentários