Cimeira de Março em Madrid para pôr energia nos projectos de interesse europeu

Passos Coelho, Mariano Rajoy e François Hollande discutem novos avanços nas interligações eléctricas indispensáveis para Portugal e Espanha.

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No intervalo de uma curta estadia em Lisboa, onde reuniu com o seu homólogo Rui Machete, o ministro dos Assuntos Exteriores de Espanha, José Manuel Garcia-Margallo, falou ao PÚBLICO de novos projectos de colaboração para os dois países. A tradicional cimeira está marcada para Junho, em Madrid, mas há temas urgentes para aproveitar os projectos de interesse europeu.

Portugal e Espanha conseguiram o acordo francês para as interligações eléctricas da Península Ibérica com a Europa. Que outros passos se seguem?
O acordo serve para consolidar o mercado hispano-luso de energia. O que favoreceu este avanço foram as mudanças geopolíticas. A União Europeia (UE) dependia enormemente, alguns países integralmente, do mercado russo, e no momento em que as relações com a Rússia ficaram tensas com o conflito da Ucrânia, há que procurar fontes alternativas de energia, reduzir a dependência e aumentar a nossa capacidade de manobra política. O segundo factor que venceu as resistências francesas foi a necessidade de projectos de desenvolvimento económico para evitar o extremismo no Norte de África. Projectos de gás, de petróleo e de energia renovável, nos quais Portugal e Espanha deviam trabalhar juntos, como o projecto solar mediterrâneo.

Portugal e Espanha não estão a trabalhar juntos nesse projecto?
Ainda não. Este plano implica a produção de energia solar que entraria na Península Ibérica e depois na Europa. Um segundo grande projecto são as ligações ferroviárias do corredor mediterrânico para dar saída aos produtos do Norte de África e colocá-los com custos e tempo reduzidos na UE. Há uma ligação ao porto de Sines, depois Espanha pelo mediterrâneo, e até Estocolmo. O terceiro projecto é trabalharmos juntos na conclusão do acordo comercial e de investimento com os Estados Unidos, que permitirá desbloquear as negociações com o Mercosul onde há um país, o Brasil, em que Portugal e Espanha têm interesse.

Em 4 de Março, em Madrid, reúnem-se Mariano Rajoy, Passos Coelho e François Hollande para falar de questões energéticas. São esperadas decisões?
Sim, urge porque estão a ser definidos os projectos de interesse europeu e temos de conseguir que esta ligação energética faça parte.

Os gregos queixaram-se da Espanha. Recordo uma frase de Cristobal Montoro (ministro das Finanças espanhol) quando a troika chegou a Portugal, dizendo que “os homens de negro nunca aterrariam em Madrid”. O que mudou?
Não mudámos. A política do Governo [do Partido Popular] foi sempre a de fazer o possível para evitar o resgate, evitar que os mercados se fechassem. Isso foi conseguido com a consolidação fiscal e a disciplina das nossas finanças públicas para dar confiança aos mercados, o saneamento do sector bancário e a recuperação da competitividade através de reformas estruturais.

Já passaram os tempos da solidariedade com o sul europeu?
A nossa solidariedade com o sul é absoluta. Houve que apertar o cinto, criar mecanismos para garantir que os excessos das épocas de exuberância não voltem, porque põem em risco todos os países que têm a mesma moeda. Há que fazer agora uma frente comum para que a UE ponha na agenda o objectivo do crescimento e do emprego. Na frente do sul, com a Grécia, se queremos influenciar temos de ser credíveis e fiáveis.

Essa mudança não é ditada por motivos políticos internos. O [partido] Podemos tira-lhe o sono?
Podemos preocupa-me muito, porque não é um fenómeno passageiro, mas geral, de movimentos populistas e anti-sistema que não definem alternativa nem explicam para onde levam a mudança. Neste momento, 25% das cadeiras do Parlamento Europeu estão ocupadas por movimentos anti-sistema, de extrema-direita ou de extrema-esquerda, mas que concordam em mudar o quadro de referência. Negam que o modelo europeu se fundamenta na democracia liberal, na economia social de mercado e negam a integração regional como instrumento de defesa na globalização.

A Espanha inicia um ciclo eleitoral, com as eleições andaluzas, locais e autonómicas, catalãs e legislativas. É uma prova de fogo para o Governo?
É uma prova de fogo para o Governo e para o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE). A transição democrática foi um êxito porque houve dois grandes partidos nacionais que ocuparam a centralidade política, que se alternaram no poder com naturalidade. O acordo nos grandes princípios entre os dois partidos é capital. Teremos provavelmente que repensar a organização territorial de Espanha, a refundação da UE …

Fala-se de revisão constitucional…
Neste momento não está em cima da mesa, mas após as eleições deve pensar-se nisso, desde que se saiba o que vamos reformar, ter a certeza de que no outro partido – PSOE - há estabilidade e existe um interlocutor, e que solucionamos problemas e não criamos outros. Há que esperar pelas eleições, pois os momentos de crispação eleitoral não são propícios.

Catalunha será independente?
Uma Catalunha independente fruto de uma declaração unilateral de independência, após uma consulta ilegal contrária à Constituição espanhola, não é aceite pela comunidade internacional nem pela UE. A Catalunha ficaria fora da união económica e monetária, das injecções de liquidez do Banco Central Europeu, não teria acesso ao FMI quando é a comunidade mais endividada de Espanha.

A Espanha sofreu o terrorismo jihadista em 11 de Março de 2004. Qual é o nível de alerta em Espanha?
É um nível médio de alerta. Temos a colaboração dos serviços de informação, incluindo os portugueses, para travar o fluxo dos combatentes, estamos na coligação internacional, temos tropas no Afeganistão, Líbano, Mali, Somália, República Centro-Africana e vamos enviar 300 instrutores militares para o Iraque. O autoproclamado Estado Islâmico tem de ser vencido militarmente, os bombardeamentos aéreos têm de ser acompanhados com tropas no terreno dos países da região. Nós contribuímos com apoio aéreo, logístico e de armas.

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