Bem-vindo, senhor Presidente!

A atitude de abertura de Dijsselbloem incute optimismo em relação ao futuro da União Europeia.

Quando o próprio ministro das Finanças da Holanda e presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, afirma, como fez na última reunião do Ecofin, que é preciso mudar as regras de cumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento e propõe a substituição do saldo estrutural como indicador por um limite ao crescimento na despesa, será isso um sinal de que a aparentemente inamovível rigidez do poder dentro da União Europeu pode aceitar mudanças?

É certo que Dijsselbloem não admitiu mudar o PEC, muito menos mexer uma vírgula no sacrossanto Tratado Orçamental que impõe a cada Governo o cumprimento orçamental com um défice a menos de 3% e a dívida pública abaixo dos 60% do PIB. Por outro lado, as limitações à despesa pública, agora propostas, podem limitar o investimento público, bem como o próprio papel de protecção social do Estado em momentos de crise económica. É, por isso, normal que a mudança seja analisada com cuidado e compreensível a reacção do Governo português. Mas é também verdade que as regras que hoje existem são desrespeitadas e de difícil cumprimento e que a posição do presidente do Eurogrupo apenas tenta trazer um pouco de realidade à ficção sobre o rigor orçamental.

A atitude de abertura de Dijsselbloem incute optimismo em relação ao futuro da União Europeia, quer aos países do sul, que têm sido intervencionados, quer aos que não o foram formalmente mas que vivem crises de dívida pública externa ou interna. Um conjunto de países onde está, é evidente, Portugal, mas também a Grécia, a Espanha e até a Itália, fundadora da União Europeia e uma das suas mais importantes economias. E embora não se anuncie nenhuma revolução nem uma mudança radical na UE, este pode ser mais um sinal de que a ortodoxia está a ser posta em causa devido ao seu irrealismo e inoperacionalidade. Para mais quando a UE tem problemas como o novo patamar dos ataques terroristas ou a crise dos refugiados.

A abertura à mudança sobre o Tratado Orçamental também não surge do nada. Tem havido um trabalho político dentro da UE. São conhecidas as reuniões de coordenação de estratégia comum dos líderes sociais-democratas e socialistas europeus, alguns dos quais estão à frente dos governos dos respectivos países, como é o caso do primeiro-ministro português, António Costa, do primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi e do presidente francês, François Hollande.

E em Março, os ministros das Finanças de Portugal, Espanha, Itália, Letónia, Lituânia, Eslovénia, Eslováquia e a Holanda – através do próprio Dijsselbloem – escreveram à Comissão Europeia pedindo que as previsões orçamentais a que cada Estado-membro está obrigado sejam apenas de dois anos e não de quatro, adoptando assim ao nível nacional o mesmo ciclo bianual que a Comissão Europeia cumpre.

Não é certo que estes sinais de abertura à discussão sobre regras de cumprimento do PEC sejam mais do que fogo-de-vista e que seja consequente a discussão prometida para o Outono. Não há nenhuma garantia nem é possível prever que caminhos vão ser trilhados e o que pode mudar na gestão da UE. Mas é cada vez mais claro que a ortodoxia de Bruxelas é questionada. E que há várias estradas que podem ser percorridas.

Esta admissibilidade de que são possíveis soluções alternativas, de que, em democracia, nada é incontestável e sem escolha, está a fazer a sua escola na Europa. E o trabalho de oposição à ortodoxia de Bruxelas feito pelos líderes socialistas e sociais-democratas é um contributo para fazer crescer correntes a favor do diálogo democrático. Sobretudo, quando esses líderes ocupam o poder governamental e têm um peso real na discussão europeia, tornando evidente a fragilidade das propostas feitas com base na tese de que não há alternativa, nem espaço para o diálogo democrático.

Essa evolução é lenta, mas vai adquirindo novas faces de novos protagonistas. Um dos mais recentes é o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que no seu primeiro discurso do 25 de Abril fez questão de proclamar: “Felizmente, também, há, no nosso país, neste momento, dois caminhos muito bem definidos e diferenciados quanto à governação, ao modo de se atingir as metas nacionais. Diversos quanto ao papel do Estado na economia e na sociedade. Diversos quanto às prioridades para a criação de riqueza. Diversos quanto ao tempo e ao modo da redistribuição da riqueza. Diversos na filosofia e na prática política. Cada um desses caminhos é plural, mas querendo ser alternativo ao outro. Com lideranças e propostas próprias. Clarificação esta muito salutar e fecunda. A Democracia faz-se de pluralismo, de debate, de alternativa.”

É caso para dizer, bem-vindo à defesa da diversidade e da alternativa, senhor Presidente!

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