A solidão de Costa

Não há dúvida de que António Costa vai ser eleito líder do PS. Mas não lhe basta vencer. Precisa de muitos votos.

O PS vai eleger amanhã o seu secretário-geral. Não tem que saber, porque só há um candidato – será António Costa o senhor que se segue à frente dos destinos no Largo do Rato. Venceu as primárias contra António José Seguro, por larga margem e com uma grande mobilização da sociedade civil, resta agora ver como vai ser a afluência dos militantes. Diluídos numa votação que se abriu ao exterior, chegou a hora de se perceber, verdadeiramente, o grau de empenhamento dos socialistas encartados para com a solução protagonizada pelo actual presidente da Câmara de Lisboa.

Não há qualquer dúvida de que a maioria do partido – tanto o PS profundo, mais provinciano e conservador, como a militância urbana, mais cosmopolita e radical, apoia Costa e está expectante quanto ao projecto que irá apresentar enquanto candidato à chefia do governo. Mas os líderes, mesmo (ou sobretudo) os carismáticos, alimentam-se das multidões e das manifestações de apoio, vivem da exposição e do confronto, precisam constantemente de ser postos à prova e de vencer. À primeira vista, a prova a que António Costa se vai submeter, esta sexta-feira e este sábado, parece tão fácil como um passeio na avenida em dia primaveril. Mas não é, porque o seu adversário é esta solidão perante a urna e é a quase unanimidade que o rodeia, embora se saiba que, em política, o silêncio raramente é sinónimo de apoio. Ou seja, para sair verdadeiramente fortalecido desta votação, Costa precisa de mostrar, na mesa de voto, que tem atrás de si um partido mobilizado para além do ritual que só os indefectíveis estão dispostos a cumprir. Para isso não basta ganhar, porque os tempos e as tarefas hercúleas que aí vêm só serão mais fáceis se a legitimação do secretário-geral for consumada através de uma afluência maciça às mesas de voto.

O acto deste fim-de-semana é o ponto final na entronização da liderança de António Costa à frente do PS. Com ele, muitas caras conhecidas voltarão a habitar o velho palacete do Largo do Rato. Umas assustarão muita gente e outras colherão apoio de outros tantos, mas essa mistura quase improvável de soaristas, guterristas, socratistas, costistas e até de figuras incólumes a rótulos na atribulada história do PS dificilmente poderia conviver sob outra liderança. Se há aspecto marcante no percurso do novo líder é a sua capacidade de casar a camaradagem de décadas com a sedimentação de novas amizades forjadas nos últimos anos de actividade política. É isto que espelha a infografia (páginas 4-5), sugestivamente intitulada “A árvore de António Costa”. Dali sairá o núcleo duro da futura direcção política e, se o resultado das próximas legislativas lhe for favorável, é impossível não se perceber que está ali o esqueleto de uma equipa governativa. Mas nada está garantido à partida. Apesar dos reveses brutais dos últimos dias, Passos Coelho não está morto. Desenganem-se os que gostam de fazer dos seus desejos realidades, até porque um ano em política é uma eternidade.

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