“O sacrifício da classe média, numa situação difícil, foi uma política social-democrata”

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Rui Machete Daniel Rocha

Entrevista a Rui Machete.

Porque não vai nas listas eleitorais da coligação Portugal à Frente, onde está o seu PSD?
Nunca pretendi ir.

É membro do conselho nacional do PSD. Vai abandonar a vida política?
Sou membro do conselho nacional do PSD por inerência como antigo presidente do partido.

Em caso de vitória do PSD continuaria no Governo?
Ainda não fiz opções definitivas, que aliás não podem ser exclusivamente minhas. A razão por que participei no Governo é porque queria contribuir para a resolução de uma situação difícil. Essa situação melhorou substancialmente, pelo que a razão desapareceu. Depois, podem haver outras circunstâncias, mas não me parece que venham a acontecer, que me levassem a repensar. Em princípio, o que devia ser feito está feito.

Este PSD é o seu PSD de sempre?
Está mais próximo do que nalgumas épocas que atravessámos.

Mais próximo do PSD original?
Sim, porque fez uma recuperação do país muito importante. Há uma prática política determinada pelo que era possível fazer em situação difícil. Houve uma grande tolerância para com os críticos do Governo [no PSD], há vários casos, parece-me ser um bom exemplo como se deve exercer os cargos políticos num partido democrático.

O PSD afirma-se reformista. Que reformas fez este PSD no Governo?
O que foi feito no combate à crise financeira, uma crise gravíssima, não vale a pena ter receio de o dizer, permitiu alterar muitas coisas que significaram, ao contrário do que se diz, uma reforma do Estado. A reforma do Estado tem sido colocada de uma maneira que considero pouco reveladora de uma análise profunda. Não se reforma o Estado, apenas, fazendo fusões entre instituições…

 … Ou escrevendo 80 páginas?
Reforma-se actuando nos serviços públicos, que funcionam de uma maneira relativamente eficaz e com menos custos.

Privatizando?
A ambição de diminuir o peso do Estado que motivou muita da campanha do dr. Passos Coelho antes de ir para o Governo resultava de uma ideia que apareceu como uma forma liberal, mas baseava-se em muitas ilusões da capacidade de fazer funcionar o Estado. Na prática, a realidade das coisas impôs uma política diferente e mais apropriada em termos de reforma do Estado. Muitas das coisas que foram defendidas nessa altura [antes da chegada ao Governo] não foram possíveis, mas contribuiu-se para ultrapassar uma crise muito difícil. Goste-se ou não, ele fez um trabalho muito difícil e positivo, claro com erros e com coisas que não correram bem, o que era inevitável, mas que não corresponderam ao que ele pensava antes de ir para o Governo. Antes, só poucas pessoas tinham conhecimento da situação.

Eduardo Catroga tinha.
Não sei se tinha.

Acha?
Penso que no que era preciso fazer, e ir tão longe como se teve de ir, não tinha. Julgo que vamos ganhar as eleições e vamos obter um resultado surpreendente, mas aconteça o que acontecer, uma coisa é clara. Basicamente, foi o primeiro-ministro que contribuiu com a sua resiliência para uma política bastante difícil. Com grande incompreensão por parte da opinião pública expressa nos jornais.

E do parceiro de coligação, do CDS?
O parceiro de coligação esforçou-se por cooperar e não notei que houvesse dificuldades inultrapassáveis. Houve uma crise [2013], mas foi ultrapassada.

Entre a proposta inicial do PSD e o que foi feito não caiu a componente social do PSD? 
Numa situação difícil financeiramente, e com alguma inexperiência perante este tipo de situações, foi possível preservar alguns aspectos mais essenciais do Estado Social. Admito que do ponto de vista ideológico ou normativo outros pensem de maneira diferente. Em matéria de pensões, preferiria que uma ou outra coisa tivesse sido feita de forma ligeiramente diferente.

Concretamente…?
As coisas foram feitas porque tinham de ser feitas assim, provavelmente não havia outra solução, mas a explicação às pessoas, apesar de dada, talvez pudesse ter sido com maior intensidade.

Não é uma falsa questão que o problema não foram as medidas mas a sua explicação?
A comunicação é muito importante. Para concluir, as pessoas que tinham pensões mais baixas, e são muitas, não foram prejudicadas.

Seria ficarem a zero…
Mas não ficaram. Essa é a realidade. O sacrifício dos interesses da classe média, numa situação difícil, foi uma política social-democrata, orientada por princípios de justiça social.

Essa classe média não é o eleitorado do PSD?
Por isso foi muito mais difícil.

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