Editorial: Quatro palavras e um triângulo

O acordo sobre o programa nuclear do Irão é uma vitória da diplomacia. Obama abriu a porta, Rohani quis entrar e Khamenei deixou-o. O mundo é hoje um lugar melhor

No primeiro dia da Primavera, o Líder Supremo do regime iraniano, Ali Khamenei, faz o discurso mais aguardado do ano. Há 24 anos que é assim. Ano após ano, o Irão e o mundo esperam pelo Ano Novo para saber como o regime evoluiu politicamente, se há mudanças relevantes ou apenas novas nuances para interpretar.

Este ano, as palavras de Khamenei foram surpreendentes e explícitas, como é aliás o seu estilo. Ao comentar a hipótese de o Irão e os Estados Unidos reiniciarem negociações directas sobre o programa nuclear iraniano – como Washington propusera –, o ayatollah iraniano disse ter dúvidas e não estar optimista sobre a possibilidade de um bom desfecho, mas rematou com quatro palavras decisivas: “Mas não me oponho.”

Sozinhas, não foram estas palavras que mudaram 30 anos de distância e desprezo ou que permitiram o acordo sobre o nuclear anunciado ontem em Genebra. Mas sem elas este desfecho histórico não teria sido possível. A luz verde que Khamenei – confidente e sucessor do ayatollah Khomeini – deu na Primavera faz parte de um novo triângulo que ficou desenhado meses depois: à eleição de Barack Obama em 2008 juntou-se em Junho deste ano a eleição de Hassan Rohani. Os dois novos presidentes dos EUA e do Irão têm, ironicamente, muito em comum: acreditam na força da moderação, querem uma mudança e introduziram um discurso novo.

A estratégia de Obama resultou: mostrou abertura para dialogar com o inimigo, ao mesmo tempo que intensificou as sanções económicas contra o Irão e o cerco internacional contra o regime. A estratégia de Rohani resultou, ao anunciar que o Irão queria um “entendimento construtivo com o mundo”. E a de Khamenei também, ao não travar essa vontade. Os próximos meses serão decisivos. Mas o mundo é um lugar melhor e mais seguro desde ontem. A vitória dá força à diplomacia. E, como sempre quando se chega a um acordo sólido, tudo parece simples e cabe numa folha A4.
 

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