Cartas à Directora

Porque devemos acreditar em contos de crianças

Se Passos Coelho acreditasse em contos de crianças, não podia deixar de saber duas coisas. Por um lado, que os "bons" nunca puxam pela pistola para dar o tiro de misericórdia no "mau" quando o encontram desarmado, ferido e encurralado num beco sem saída. Por outro lado, que o "bom", quando está encurralado num beco sem saída, desarmado e ferido e é apanhado pelos "maus", armados até aos dentes, acaba sempre por ver abrir-se no muro uma porta mágica por onde consegue fugir no último momento.

Quando PSD e CDS decidiram coligar-se, Passos Coelho tinha a perfeita consciência de que era impossível à coligação alcançar a maioria absoluta. Ora, as coligações pré ou pós-eleitorais só são vencedoras se conseguirem alcançar um resultado que lhes permita alcançar o número de deputados suficientes para viabilizarem o Governo. Caso contrário, perdem as eleições.

Por que razão, então, Passos Coelho decidiu concorrer coligado com o CDS, se sabia de antemão que seria praticamente impossível alcançar a maioria absoluta?  

A razão é simples e cínica e o raciocínio foi o seguinte: o PS estava ferido, com o caso Sócrates e as lutas internas, pelo que dificilmente iria conseguir ultrapassar os 35% dos votos. Se PSD e CDS se coligassem, havia muitas hipóteses de ficarem à frente do PS. E se isso acontecesse, o PS era obrigado a ajoelhar-se e a viabilizar o Governo da coligação porque a CDU e o BE constituíam um muro de betão intransponível. 

Com efeito, se o PSD estivesse efectivamente interessado em abrir a porta a uma coligação de governo com o PS, em primeiro lugar, não teria concorrido às eleições coligado com o CDS de forma a poder estar em condições de fazer uma coligação à esquerda ou à direita consoante o resultado das eleições. Em segundo lugar, mesmo concorrendo coligado, a primeira coisa que teria de fazer, ao constatar que não tinha conseguido uma maioria de governo, era descoligar-se mal fossem conhecidos os resultados eleitorais, para permitir construir uma alternativa de governo ao centro.

Só que Passos Coelho entusiasmou-se com a derrota humilhante de António Costa. Caso contrário, teria desfeito, de imediato, a coligação com o CDS, uma vez que não alcançara a maioria absoluta, para poder propor ao PS uma coligação ao centro, tanto mais que PSD e PS constituíam dois grupos parlamentares com praticamente o mesmo número de deputados. Mas Passos Coelho, vendo António Costa ferido, desarmado e encurralado num beco sem saída, em vez de lhe dar a mão, a primeira coisa que fez foi reunir-se com o CDS para fechar um acordo de governo à direita, convencido de que António Costa não tinha outra alternativa a não ser assinar a rendição e humilhar-se publicamente viabilizando o governo da coligação que jurou nunca viabilizar.

Só que, quando parecia que António Costa estava à mercê da coligação para receber o golpe de misericórdia, a CDU abriu uma buraco no muro por onde se escapou António Costa. Tal como acontece nos contos de crianças...

Santana-Maia Leonardo, Ponte de Sor

 

 

 

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