Cartas à Directora

Dois ladrões e um reformado

É comum procuradores, jornalistas e comentadores queixarem-se de que a pequena criminalidade atrasa os grandes processos. Não posso estar mais de acordo. Com efeito, os nossos tribunais não podem andar a perder tempo com processos de assaltos a bancos, em que os ladrões apenas levam uma parte absolutamente insignificante dos depósitos bancários, quando existem reformados que são assaltados várias vezes por ano em que os ladrões lhes levam, sistematicamente, todas as suas economias.

Vou dar um exemplo do meu conhecimento. Um reformado foi assaltado três vezes pelo mesmo indivíduo e sempre da mesma forma. Como a casa é de telha vã, o jovem retirou umas telhas, introduziu-se na sua casa e assaltou-o. As três vezes foi apanhado pela GNR, as três vezes foi presente ao juiz e as três vezes foi posto em liberdade, como manda o código de processo penal.

Chegado o dia do julgamento, o reformado, para cumprir o seu dever cívico de depor, teve de enfrentar a fúria, os insultos e as contínuas ameaças da família e amigos do arguido, todos da mesma laia, sem que houvesse alguém no tribunal que o protegesse. Apesar de bastante intimidado, o reformado lá acabou por depor, na esperança de que o criminoso, pelo menos, fosse obrigado a devolver-lhe o dinheiro que lhe roubou.

O dia da sentença foi uma festa. Para o criminoso, respectiva família e amigos, bem entendido, que nunca acreditaram que ele ficasse em liberdade. Foi condenado com pena suspensa e a pagar ao reformado a quantia que lhe tinha roubado.

O reformado, no início, também ficou contente até lhe explicarem que, apesar de o criminoso ter sido condenado a indemnizá-lo da quantia que lhe roubara (3 x 200€), ele nunca a iria receber, porque o criminoso, um jovem toxicodependente, não tinha quaisquer bens. "Então mas se ele foi condenado, o tribunal não o vai obrigar a pagar-me?".

É absolutamente revoltante a forma como a nossa justiça goza com as vítimas, proferindo sentenças que só servem para enfeitar, para gáudio dos criminosos e derradeira humilhação das vítimas.  Como é que isto se resolve? Com esta gente que nos tem governado e que fala de cátedra na comunicação social, só vejo uma solução para evitar que os reformados continuem a ser sistematicamente assaltados: o Governo ordenar que as pensões de reforma sejam directamente depositadas na conta do ladrão. No fundo, até é uma forma equitativa de dois ladrões partilharem a pequena reforma do desgraçado.

Santana-Maia Leonardo, Abrantes

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