Tags não são graffiti

O artigo assinado por dois membros do Bloco de Esquerda, repudiando as iniciativas em curso do Ministério da Administração Interna para combater o flagelo das pichagens, ilustra os desvarios a que conduz a obsessão politicamente correta. Com o país a ser desfeado e conspurcado diariamente, numa vandalização que destroi o espaço público e horroriza os visitantes, dois sociólogos bem pensantes vêm defender angelicalmente o "direito à expressão" dos pobres marginais armados com sprays de tinta.

Não se confunda tags com graffitis artísticos: estes últimos são raros e não é neles que está o problema. Quem faz graffitis de arte geralmente escolhe os locais próprios e contribui para enriquecer o espaço público. Até "mensagens poéticas" são aceitáveis, quando feitas em edifícios devolutos. Os rabiscadores de tags não respeitam nada disso: eles são os primeiros a vandalizar graffitis artísticos (como os da av. Fontes Pereira de Melo, em Lisboa, ou os painéis do Elevador da Glória). Não contribuem com nada, a não ser os excrementos do seu ego invasor.

Não, infelizmente não são "paredes abandonadas" o alvo preferencial dos "tagueiros": de forma cada vez mais acintosa, preferem as paredes recém-pintadas e a alvenaria acabada de limpar. Qualquer prédio ou monumento lhes serve, de preferência antigo e belo. Deixam a sua assinatura não como "forma de expressão" mas sim como marcação do terreno (equivalente de facto ao chichi dos cães, só que muito pior), numa luta agressiva de gangs, entre si e contra a sociedade. No Bairro Alto, é diário o seu desafio aos serviços da Câmara, que de algum tempo a esta parte se esforçam por manter apresentáveis as ruas do bairro mais turístico da cidade (o esforço é meritório, mas adivinhem quem paga.) Na baixa pombalina, por toda a capital e arredores, o império dos tags alastra com impunidade e regozijo - e com a benção embevecida do Bloco de Esquerda.

Não, os "tagueiros" não são quem passa fome nem quem tem de lutar pela vida, pois esses não têm dinheiro para tintas nem tempo para atividades inúteis. Curiosamente, nem serão muitos os "tagueiros" que tomaram conta de Lisboa: as mesmas assinaturas, pequenas ou enormes, repetem-se pela cidade com uma obstinação imbecil e bastaria apanhar em flagrante o autor duma delas para poder inculpá-lo de centenas de rabiscos iguais. (Veja-se o energúmeno que vandalizou duma ponta à outra a nobre pedraria da Maternidade Alfredo da Costa: o seu nome de guerra já se espalhou por vários outros bairros.)

Com a legislação atual, nem vale a pena fazer queixa à polícia. O Ministério da Administração Interna quer simplesmente fazer aquilo que já se devia ter feito há muito tempo: adequar a lei e criminalizar essa forma de vandalização do espaço público. É razão para aplaudir entusiasticamente. Aqui ficam duas sugestões: que a punição dos culpados inclua obrigatoriamente raspar e pintar aquilo que vandalizaram, pois nada seria mais dissuasor e educativo; e que se crie um imposto extraordinário sobre sprays de tinta, destinado a limpar as pichagens que tantos lucros geram a fabricantes e vendedores e que tantos prejuízos causam a proprietários, instituições e cidadãos em geral. Esta não é uma causa de esquerda ou de direita: é uma causa da civilização contra a barbárie.

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