Onde pára o messias?

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Esta semana, algumas sumidades andaram por aí a discutir a fragmentação da esquerda. Não ocorreu a ninguém que a esquerda (a esquerda "moderna", a partir da revolução francesa, digamos) sempre esteve e estará fragmentada. Ainda hoje se discutem os méritos da cada facção e de cada homem: da Gironda e dos Jacobinos, de Danton ou de Robespierre, dos guilhotinadores do "grande" e do "pequeno" Terror e daqueles que guilhotinaram os guilhotinadores. Basta pensar no que sucedeu durante os dois séculos seguintes para ver que a esquerda infalivelmente dividida se matou com entusiasmo por esse mundo fora. Porquê? Porque a esquerda é por natureza utópica e por natureza não tem o poder de que precisa.

Excepto se ela for, e se a tomarmos, por umas tantas reformas do capitalismo (com que o capitalismo vive bem e não se importa, no fundo, de tolerar), só há esquerda quando há esquerda revolucionária. Ora a velha revolução, a que sob várias formas durou de 1789 a 1989, faliu sem salvação ou remédio. Era o produto de um "equilíbrio" mundial e de uma sociedade, que na substância desapareceram. O que, por exemplo, o PC e o Bloco oferecem aos portugueses, tirando uma retórica sem sentido, não interessa ninguém e não levará ninguém à mais ténue forma de militância. Mas, como as pessoas apesar de tudo querem resistir a uma agressão tão violenta - e tão e aparentemente inexplicável - como a crise, procuram formas de se manifestar, mesmo sem qualquer racionalidade ou futuro.

Para lá do que não passa de circunstância ou de pormenor, a ideia central revolucionária de hoje é a federalização da "Europa". Um programa que a esquerda supõe a sua infalível vocação e de que já encontrou o inimigo por excelência - o neoliberalismo e o desregulamento dos mercados. Infelizmente, e na ausência da guilhotina e do gulag, o voto acabou por se tornar o seu único meio. Um voto que, sem uma teoria, sem uma doutrina e sem uma estratégia, tende a dar a cada fantasista a sua oportunidade. A isto se chama, na gíria, a "fragmentação" da esquerda. A palavra apropriada seria, obviamente, impotência. Mas quem o reconhece, se a eleição de Hollande basta para uns tempos de euforia (quase no fim) e se o Bloco corre para a Grécia atrás da inútil proeza do Syriza? A esquerda é obrigada a discutir (coisa de que, aliás, gosta) e a esperar por um messias na sua encarnação europeia ou "global" e por enquanto sofrer tranquilamente o seu absoluto vácuo.

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