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A "insónia" do desemprego e precariedade

"O desemprego tira-nos o sono e motiva-nos para o trabalho que estamos a desenvolver", diz o ministro dos Assuntos Parlamentares. O desemprego atingiu em Portugal 15,3%, a terceira taxa (oficial) mais alta da União Europeia (UE).

Mas o desemprego esconde em si, ainda, o efeito perverso da desvalorização do trabalho, degradação das condições de trabalho e aumento da precariedade. Mais de 35 por cento (empresas há com 100 por cento) dos trabalhadores estão contratados com contrato de trabalho a termo ou de trabalho temporário. Isto sem contar com a precariedade ilegal, nas variantes de total clandestinização, subdeclaração (inclusive quanto a remunerações e contribuições para a Segurança Social), dissimulação (camuflagem da relação de trabalho sob uma fictícia "prestação de serviços", como é o caso dos falsos "recibos verdes") ou subversão (ocupação de postos de trabalho permanentes por trabalhadores "temporários", "a termo" ou "independentes").

O desemprego, com frágil protecção social, gera precariedade (força as pessoas a "aceitar" vínculos laborais precários) que, por sua vez, é um dos factores do desemprego.

Na situação de emprego precário, em postos de trabalho desqualificados em si e sem qualquer lógica de qualificação na sua sequência errática, pela descaracterização profissional (no emprego precário não é a profissão ou qualificação que interessa mas, apenas, a qualquer tarefa temporária que é preciso "despachar"), associada a más condições de saúde do trabalho, as pessoas perdem condições físicas e profissionais para se (re)empregarem e caem no desemprego crónico.

Há que despertar (e agir), social, institucional e politicamente para as implicações humanas e sociais deste círculo perverso entre desemprego e precariedade.

O problema é que, sem sono por causa do desemprego, é crescente a "motivação" do Governo para, sob o eufemismo gasto da "flexibilidade", aumentar a precariedade.

João Fraga de Oliveira,

Santa Cruz da Trapa

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