A intolerável tolerância aos abusos nos estágios

Os tempos de crise são propensos à proliferação de abusos e de violações da lei que penalizam com particular crueza as pessoas em situações de maior vulnerabilidade

Como é o caso dos jovens quando em causa está a difícil luta por um lugar no mercado de um trabalho. Mas por ser conhecida e repetida, o problema exige de todos particular atenção. Viver num país onde há empresas e empresários que se servem das dificuldades dos seus concidadãos para praticar actos de ilegalidade e abuso, como os que esta semana foram denunciados por jovens que participavam no programa Estágio-Emprego, é politicamente inaceitável e moralmente desprezível. Uma empresa que subscreve um acordo com o Estado para acolher estagiários e se compromete a pagar uma parte da sua remuneração para, posteriormente, abdicar das suas responsabilidades e chegar até a pedir aos jovens que paguem os seus encargos sociais para trabalharem é indigno, revoltante e faz o país recuar para a obscuridade do tempo em que não havia direitos elementares.

A denúncia de casos desta natureza teve o mérito de alertar a comunidade para o que está a acontecer e a vantagem de despertar o Instituto de Emprego e Formação Profissional para abusos que há muito conhecia (mesmo sem contornos definidos) e tinha o dever de combater. Foi a lassidão dos seus serviços, a propensão para tratar tudo o que aparece com a rotina burocrática do costume que fez com que este problema se mantivesse tanto tempo por resolver. Mas temos de reconhecer também que muito poucos jovens tiveram a coragem de vir a público denunciar os casos a que foram sujeitos. Dir-se-á que a precariedade conduz à anomia e à submissão. Mas é bom que se instale a ideia de que é em momentos destes que a comunidade deve ser mais atenta e enérgica contra os abusos.

Destapado o véu que tapava as ilegalidades, resta ainda esperar que o IEFP proceda a um exaustivo levantamento de situações suspeitas no programa. E aproveitar a oportunidade para discutir os seus resultados. A preocupação dos governos em controlar as estatísticas do desemprego é recorrente e poucos duvidarão que, no contexto actual, é melhor financiar a retenção de jovens nas empresas nacionais do que nada fazer para evitar o brain drain dos últimos anos. Mas se um programa que absorve 70 milhões por ano tolerou desmandos como os que foram revelados, há que duvidar do seu acompanhamento e da sua eficácia.  

 

 

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