Clinton já olha para Novembro e Trump experimenta o fato de presidenciável

Os candidatos conquistaram confortavelmente as primárias no estado de Nova Iorque e estão cada vez mais próximos da nomeação. Tanto Hillary Clinton como Donald Trump ultrapassaram as expectativas mais optimistas.

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Donald Trump John Moore/Getty Images/AFP
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Hillary Clinton Justin Sullivan/AFP
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Bernie Sanders Lucas Jackson/Reuters
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Ted Cruz Charles Mostoller/Reuters
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John Kasich Bryan Woolston/Reuters

O penteado é o mesmo, os gestos com as mãos que fazem a delícia dos humoristas não mudaram um milímetro e as propostas continuam a ser tão polémicas como sempre, mas as palavras que saem da boca de Donald Trump são agora mais contidas – como se diz nestas coisas da política, o magnata do imobiliário assumiu um discurso presidenciável depois da vitória esmagadora nas primárias em Nova Iorque, terça-feira.

Do outro lado da corrida, no Partido Democrata, a vitória folgada de Hillary Clinton no mesmo estado veio reforçar uma ideia que tem sido repetida nas últimas semanas: entre os republicanos, a questão ainda é se Trump vai mesmo ser nomeado; entre os democratas, a questão é quando é que Clinton vai ser nomeada.

"Com base naquilo que estou a ver nas televisões, já não há muita competição. O senador Cruz está praticamente eliminado em termos matemáticos", disse Donald Trump no discurso de vitória. Num dos mais evidentes sinais do seu novo modo presidenciável, não se referiu a Ted Cruz como o "mentiroso Ted" (como tem sido hábito), nem ofendeu mais ninguém (como também tem sido hábito) – nem adversários, nem moderadores de debates, nem qualquer grupo demográfico inteiro.

Depois de ter conquistado as primárias em Nova Iorque com o estrondo de um King Kong a trepar pelo Empire State Building acima, o magnata olha agora para o horizonte e só vê três coisas à frente: Novembro. Presidenciais. Clinton.

As sondagens já andavam a gritar ao ouvido dos eleitores que Trump iria vencer facilmente as primárias no estado em que fez fortuna, mas nem o próprio esperava um resultado tão esmagador: 60,5% dos votos e a quase totalidade dos 95 delegados em jogo.

Atrás dele, a quilómetros de distância, ficou o único candidato do Partido Republicano que pode ser definido como "moderado" sem ser preciso torcer os braços dessa palavra com muita força – o governador do Ohio, John Kasich, com 25,1% e três delegados.

Em último, tal como indicavam as sondagens, ficou o principal adversário de Donald Trump nas primárias – o senador do Texas e principal ídolo dos ultraconservadores, Ted Cruz, com 14,5% dos votos e o número de delegados mais redondo possível: 0.

Cruz continua a ser o único candidato que pode roubar a nomeação a Trump, mas muitos dos seus valores são quase tão repugnantes para o eleitorado do estado de Nova Iorque como as propostas de Trump para a maioria dos eleitores hispânicos. A somar a essa aversão, o candidato chegou às primárias em Nova Iorque com um tiro no pé: em Janeiro, queixou-se dos "valores de Nova Iorque", por serem muito liberais para o seu gosto, e os republicanos nova-iorquinos não se esqueceram de lhe mostrar que valor tem o nome Ted Cruz no estado deles.

Cruz sonha com vitória na convenção

Apesar da esmagadora vitória em Nova Iorque, o problema de Donald Trump e do Partido Republicano mantém-se: para ser nomeado na convenção, em Julho, o magnata tem de amealhar 1237 delegados até à última votação. Trump tem agora 844 e Cruz 543, o que significa que o magnata do imobiliário é o único candidato com reais hipóteses de atingir o número mágico dos 1237 antes da convenção, mas significa também que esse cenário está ainda longe de ser uma certeza absoluta.

O facto de Ted Cruz e John Kasich se manterem na corrida leva a uma maior dispersão de votos, o que torna provável um cenário que não acontece há várias décadas em nenhum dos dois maiores partidos norte-americanos: uma convenção aberta, sem um nomeado à partida, e que pode forçar a realização de duas ou mais rondas de votação até que um dos candidatos recolha o apoio de pelo menos 1237 delegados.

É neste jogo que Ted Cruz aposta – como a distribuição do número de delegados e a escolha das pessoas que vão ocupar essas posições na convenção do partido são dois processos distintos, o senador do Texas tem tentado colocar muitos dos seus apoiantes nos lugares de delegados atribuídos a Donald Trump, na expectativa de o magnata não amealhar 1237 até ao final das primárias; chegados a Cleveland, no Ohio, em meados de Julho, esses delegados serão obrigados a votar em Trump na primeira ronda, mas depois muitos deles ficam livres para votarem em quem entenderem numa segunda ronda.

O único problema desta estratégia é que quanto mais perto Donald Trump ficar dos 1237 delegados antes da convenção, mais difícil será negar-lhe a nomeação, mesmo que isso seja permitido pelos regulamentos – Trump já fez saber em várias ocasiões que os seus apoiantes iriam ver essa estratégia como uma golpada do seu tão odiado establishment, e poderiam até ter uma resposta violenta.

Vitória de Sanders é a sua mensagem

No lado do Partido Democrata a questão é outra. Apesar da surpreendente campanha do senador Bernie Sanders, que tem posto os EUA a falar sobre um sistema de saúde semelhante ao europeu, que forçou Hillary Clinton a dizer que defende a subida do salário mínimo para 15 dólares por hora (quando nunca tinha ido além dos 12 dólares), e que tem conseguido fazer com que muitos americanos pronunciem a palavra "socialista" sem ficarem engasgados, a verdade é que a antiga secretária de Estado está muito perto da nomeação.

Nas primárias de Nova Iorque, Clinton confirmou que consegue vencer em grandes estados, com muitos delegados em jogo, e tornou ainda mais visível a fraqueza de Bernie Sanders: o eleitorado negro, que tem votado em massa na candidata e que supera a devoção que os jovens brancos têm demonstrado pelo candidato.

Hillary Clinton venceu com 57,9% dos votos e somou mais 139 delegados, e Bernie Sanders ficou aquém do que as sondagens indicavam, com 42,1% e 106 delegados. No total da corrida, Clinton tem 1446 delegados e Sanders tem 1200, sendo necessários 2383 para garantir a nomeação antes da convenção.

Olhando para o mapa das primárias que faltam, mesmo que a antiga secretária de Estado só consiga conquistar 43% dos delegados (o que é altamente improvável, dada a sua vantagem nas sondagens em estados importantes como a Pensilvânia, Maryland ou Califórnia), deverá garantir a nomeação até Junho.

Esta diferença no estado das corridas é também um reflexo das regras de cada partido – enquanto no Partido Republicano alguns estados atribuem todos os delegados em jogo ao vencedor das suas primárias, no Partido Democrata a distribuição é sempre proporcional, o que significa que o candidato derrotado consegue, ainda assim, somar alguns delegados.

Para além da vantagem nos delegados que vão sendo conquistados durante as primárias (que são obrigados a votar no candidato que vence a eleição em cada estado), Hillary Clinton tem também uma vantagem decisiva entre os superdelegados – mais de 700 homens e mulheres ligados ao aparelho do Partido Democrata (o que também a beneficia) que vão à convenção votar em quem muito bem entenderem. Segundo uma contagem actualizada pela agência Associated Press com base em entrevistas a esses superdelegados, 502 apoiam Clinton e 38 apoiam Sanders.

As primárias regressam na próxima terça-feira, dia 26 de Abril, com votações em cinco estados: Connecticut, Delaware, Maryland, Pensilvânia e Rhode Island. Donald Trump e Hillary Clinton têm liderado a maioria das sondagens em todos os estados, mas as diferenças entre os candidatos do Partido Democrata são menores em alguns desses estados do que entre Donald Trump e os seus dois adversários.

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