Novas taxas são “assalto” a quem tem casa ou empresa junto a estradas nacionais

Autarcas da área Metropolitana do Porto pedem suspensão de portaria, de Outubro, que impõe por exemplo uma taxa anual de 200 euros por acesso a garagem de habitação particular.

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Sérgio Azenha

Os autarcas da Área Metropolitana do Porto querem que o Governo suspenda a portaria 357/2015, de 8 de Outubro, que actualizou o regime de taxas a pagar por serviços, licenças e autorizações emitidas pela Infra-estruturas de Portugal pelos usos privativos - que incluem obras municipais - do domínio público rodoviário. A portaria impõe uma taxa de 500 euros pela instrução de um processo e, num caso de legalização de um acesso de garagem a uma estrada nacional, acresce uma taxa anual de 200 euros. “Um assalto”, acusa o vice-presidente da Câmara da Póvoa de Varzim.

O novo regime de taxas tinha escapado aos autarcas, que foram alertados pelo presidente da Câmara da Póvoa de Varzim, Aires Pereira, na reunião anterior do conselho metropolitano. Naquele concelho, um munícipe que precisou de reabilitar um muro da sua moradia teve de pagar 846,5 euros. Aos 500 euros exigidos pela instrução do processo, e aos 200 euros (prestação anual) exigidos pela legalização de um acesso de garagem à estrada, acrescentam-se, neste caso, 146,50 euros pela autorização da obra em si. A portaria prevê a cobrança de cinco euros por cada metro de extensão da vedação.

Desde o final da década de 40, com a criação da antiga Junta autónoma de Estradas, que está previsto um regime de taxas, abrangendo algumas das situações da portaria publicada em Outubro. Em 1971, e em 1982, pelo menos, os valores foram actualizados, e, no caso da legislação aprovada no ano passado, o âmbito de actuação e os poderes da IP foram alargados, com o novo Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional, tendo-lhe sido concedido poderes de Autoridade Pública. Isto permite-lhe, por exemplo, embargar uma obra nos limites da estrada para a qual não tenha dado autorização (quando esta está prevista), e fiscalizar se os acessos existentes estão ou não regularizados, por exemplo.   

O novo estatuto, publicado em Abril do ano passado, dava à IP um ano para fazer o levantamento dos acessos existentes nas estradas sob sua administração, e promover a respectiva regularização, nas situações de inexistência de título administrativo. E previa que a não regularização dos acessos no prazo de um ano a contar da notificação para o efeito constitui contra-ordenação punível com coima de 500 a 2500 euros, quando praticada por pessoas singulares, e de 1000 a 5000, quando praticadas por pessoas colectivas.

Uma empresa com acesso a uma EN terá de pagar 0,3 euros por cada metro quadrado de área coberta e descoberta do terreno onde esteja instalado. Segundo o presidente do Conselho Metropolitano, Hermínio Loureiro, ao abrigo desta fórmula uma grande empresa na Póvoa de Varzim, está a pagar dez mil euros anuais pelas suas instalações. É um valor “absurdo”, criticou. “Se as Câmaras fizessem isto, não havia autarcas que resistissem”, deplorou o vice-presidente do município da Póvoa, Luís Diamantino, que considera que existem, na portaria, sobreposições com a tutela municipal sobre o espaço público.

A Infra-estruturas de Portugal não comentou as críticas dos autarcas da Área Metropolitana do Porto a esta portaria, que descreve como “um instrumento jurídico sólido, elucidativo e tolerante, que permite maior agilidade e uma resposta mais eficaz às necessidades existentes”. Em resposta a um pedido de esclarecimentos do PÚBLICO, o gabinete de comunicação daquela empresa pública começa logo por notar que “os valores correspondentes foram legalmente definidos, não sendo portanto nem iniciativa nem determinados pela IP”, atirando assim a responsabilidade para as tutelas das Finanças e dos Transportes (Economia), do primeiro Governo liderado por Passos Coelho, que enviaram o texto para publicação dois dias antes das Legislativas de 4 de Outubro.

“O novo diploma vem, por um lado, regular a interacção entre a infra-estrutura rodoviária, a sua gestão, e as pessoas, singulares ou colectivas, públicas ou privadas, que beneficiam e têm interesse na sua utilização. Por outro, potenciar a exploração desta infra-estrutura como um activo, desde que sejam salvaguardadas a defesa da segurança rodoviária, do bom ordenamento do território e da paisagem”, lê-se na resposta da IP, que considera que “o anterior regime, desactualizado e disperso por vários diplomas, era já completamente desadequado às atuais exigências do sector rodoviário e à realidade do País”.

“As taxas reflectem os custos estipulados para a prestação de serviços da administração rodoviária, para a instrução de processos, emissão de pareceres, realização de vistorias extraordinárias e de revalidação de licença ou autorização, serviços não previstos no regime jurídico anterior. Da mesma forma, outras taxas que existiam no regime jurídico anterior simplesmente desapareceram ou assumiram nova descrição”, acrescenta o gabinete de imprensa da IP, que justifica os 500 euros cobrados pela instrução dos processos com a necessidade de “uma exigente e habilitada análise dos pedidos, envolvendo diversas áreas da empresa e o trabalho qualificado de vários técnicos especializados”.  

O PÚBLICO pediu dados sobre os preços em vigor antes deste novo regime de taxas, mas a empresa estatal considera “que o confronto com o existente no passado para aferição da diferença não pode ser feita de uma forma directa por se correr o risco de comparar situações que não são comparáveis”. Mais, insiste, “existem também casos em que os valores baixaram, deixando de ser cobradas como no licenciamento, mais dispendioso, sendo agora de pagamento anual, de custo mais baixo”. Nada que convença os 17 municípios da Área Metropolitana do Porto. “Isto ainda não teve uma repercussão maior porque a publicação, na transição entre governos, apanhou muita gente distraída”, acrescentou Hermínio Loureiro, considerando que o regime em vigor “é inadmissível e incompreensível”.

A própria portaria prevê que num prazo de um ano seja avaliado o impacto global dos seus resultados, com vista a eventual alteração, “devendo para esse efeito ter em consideração os contributos dos diversos beneficiários dos actos e serviços prestados pela administração rodoviária. Mas, se depender dos Autarcas da Área Metropolitano do Porto, o melhor é suspender desde já a sua aplicação. Um pedido ao Governo aprovado por “unanimidade”.

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